17 Agosto 2018
"Fracasso da liderança episcopal causou uma catástrofe moral", afirmou o líder dos bispos americanos.
A reportagem é de Brian Roewe, publicada por National Catholic Reporter, 16-08-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
O chefe dos bispos dos Estados Unidos afirmou que irá convidar o Vaticano a conduzir uma visita apostólica no país para liderar uma "investigação completa" sobre questões que ainda cercam as revelações de abuso sexual do ex-cardeal arcebispo Theodore McCarrick.
Além disso, o cardeal Daniel DiNardo disse que os bispos irão tomar medidas para criar canais, com facilidade para relatos de abuso e má conduta por parte dos bispos, além de reivindicar por melhores procedimentos sob a lei canônica para resolver as queixas feitas contra os bispos.
A declaração de DiNardo, presidente da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, ocorreu em 16 de agosto quando o escândalo de abuso sexual clerical da Igreja ressurgiu fortemente.
Dois dias antes, o procurador-geral da Pensilvânia divulgou um relatório de 1.300 páginas documentando relatos históricos de abuso sexual de padres em seis dioceses do mesmo estado em que documentaram o abuso de mais de mil crianças por mais de 300 padres. Esse é considerado o caso com maior número de vítimas.
Tal relatório seguiu as revelações de junho de supostos abusos sexuais de seminaristas e jovens adultos por McCarrick - antes visto como um líder influente dentro da Igreja e na política - tendo atuado como arcebispo de Washington DC. As acusações, negadas por McCarrick, levaram o bispo aposentado de 88 anos a renunciar ao seu lugar no Colégio Cardinalício no final de Julho.
À luz desses acontecimentos, DiNardo disse que o comitê executivo da Conferência dos Bispos se reuniu várias vezes recentemente, inclusive no início desta semana, para abordar o que chamou de "uma catástrofe moral".
"Estamos diante de uma crise espiritual que requer não apenas conversão espiritual, mas mudanças práticas para evitar a repetição dos pecados e fracassos do passado, tão evidentes no recente relatório", escreveu o cardeal de Galveston-Houston.
DiNardo delineou três objetivos - guiados pelos princípios de independência adequada, autoridade suficiente e liderança substancial dos leigos - estabelecidos pelo comitê executivo, e disse que viajaria a Roma para apresentá-los ao Vaticano, "visando solicitar medidas mais concretas". A declaração não indicou quando a viagem ocorreria.
"O objetivo primordial de tudo isso é uma proteção mais forte contra esses predadores na Igreja e a qualquer um que os esconderia. Proteções que irão expor os bispos aos mais altos padrões de transparência e responsabilidade", disse Dinardo.
A conferência dos bispos disse que um "plano mais desenvolvido" será apresentado aos bispos durante sua reunião anual em Baltimore, no mês de novembro.
As metas delineadas pela liderança dos bispos começam com uma investigação completa das questões que ainda cercam McCarrick.
"Essas respostas são necessárias para evitar uma recorrência e, assim, ajudar a proteger menores, seminaristas e outros que estão em posições vulneráveis no futuro", disse o presidente da USCCB (sigla em inglês para Conferência dos Bispos dos EUA).
Os bispos propuseram que a possível visita apostólica do Vaticano funcionaria "em sintonia" com um grupo de pessoas predominantemente leigas identificadas pelo National Review Board dos bispos, que aconselha os bispos a prevenir o abuso sexual de crianças e que deveriam ter "poderes para agir".
"Quaisquer que sejam os detalhes a respeito do arcebispo McCarrick ou dos muitos abusos na Pensilvânia (ou em qualquer outro lugar), já sabemos que uma das principais causas é o fracasso da liderança episcopal. O resultado afirma que muitos amados filhos de Deus foram abandonados para enfrentar um abuso de poder sozinhos. Esta é uma catástrofe moral", disse DiNardo.
A vista apostólica é uma investigação do Vaticano sobre vários aspectos da Igreja, incluindo dioceses, ordens religiosas e universidades. Acredita-se que a última visita aos EUA em relação ao abuso sexual do clero ocorreu em 2014, quando um arcebispo canadense visitou uma Diocese no Kansas City-St. Joseph, em Missouri, para investigar a liderança de seu agora ex-bispo Robert Finn.
No início deste ano, Francisco enviou o arcebispo de Malta Charles Scicluna ao Chile para investigar a crise dos abusos clericais, embora não fosse visto como uma visita apostólica oficial. Após essa investigação, quase todos os 34 bispos do Chile ofereceram ao Papa suas renúncias depois das reuniões em maio, no Vaticano. Até agora Francisco aceitou cinco delas.
Além de uma visita, DiNardo disse que os bispos atualizariam sua "Declaração de Compromisso Episcopal" em 2002, num esforço de providenciar vias disponíveis para as vítimas denunciarem abuso ou má conduta sexual por parte dos bispos, além de desenvolver "mecanismos confiáveis de denúncia de terceiros". Segundo ele, tais mecanismos "devem ser livres de preconceito ou influência indevida de um bispo", bem como os esforços deles para impedir queixas, interferir em uma investigação ou distorcer resoluções.
A Declaração de Compromisso Episcopal é anexada à Carta dos Bispos para a Proteção das Crianças e dos Jovens. Antes, era utilizada como uma maneira de designar os bispos para serem responsáveis, pois a carta era restrita ao clero sob a autoridade de um bispo.
Em sua assembleia na primavera, em junho, 185 bispos votaram a favor da aprovação de pequenas mudanças na Carta, contra apenas 5 votos negativos, optando naquele momento por não tratar de novas revisões a respeito da responsabilidade de um bispo.
DiNardo deixou claro em sua declaração que o Papa tem - sozinho - a autoridade para disciplinar os bispos ou removê-los do Ministério. Segundo ele, os bispos norte americanos iriam estudar os procedimentos canônicos para registrar uma queixa contra um bispo "visando propostas concretas para torná-las mais precisas, justas, transparentes e especificar quais restrições podem ser impostas aos bispos em cada etapa desse processo".
Embora a declaração não tenha abordado os possíveis passos em direção à disciplina para os bispos envolvidos no encobrimento dos abusos sexuais por parte dos padres, DiNardo disse que os passos descritos são "apenas o começo".
"Não tenho dúvidas de que a confiança dos bispos foi prejudicada por esses pecados e fracassos do passado. Será necessário reconstruir essa confiança", disse o cardeal.
"Devemos manter todas essas resoluções. Deixe-me pedir a você que ore por nós, que aproveitemos para refletir, arrepender-nos e nos comprometermos com a santidade da vida. Devemos aceitar nossas vidas, acreditando em Cristo, o Bom Pastor", completou Dinardo.
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EUA. Bispos pedem visita apostólica para caso de abuso de McCarrick - Instituto Humanitas Unisinos - IHU