25 Novembro 2017
"Não basta ouvir a palavra de algumas mulheres porque a reforma possa acontecer: é necessário ativar processos sinodais, em todos os níveis (das dioceses às Igrejas nacionais), que permitam a todas as mulheres que o desejem expressar intuições e sonhos de uma reforma eclesial, sinalizar problemas pendentes, denunciar fatores de discriminação ou de subestimação, sugerir percursos de transformação", escreve Serena Noceti, teóloga, em artigo publicado por Regno delle donne, 20-11-2017. A tradução é de Luisa Rabolini.
A contribuição das mulheres para a reforma da Igreja foi o tema escolhido para a décima quinta edição da Associação das teólogas espanholas (Madrid 11-12 novembro de 2017) e, previamente, objeto do intenso Colóquio "Mulheres e reforma da Igreja", organizado pelo Instituto Costanza Scelfo, cujos Atos foram apresentados na Faculdade Teológica Marianum de Roma, na quinta - feira, 16 de novembro.
Em ambos os casos a reflexão teve um duplo referencial de motivação e de horizonte interpretativo: os quinhentos anos da Reforma Protestante e o apelo que vem do papa Francisco para retomar com decisão a instância de reforma que o Concílio Vaticano II entregou, na consciência de que a Igreja é "semper reformanda".
Também foi comum a escolha dos percursos, que unem a pesquisa no plano histórico, a identificação de diretrizes ideais para orientar a ação, a análise da contribuição específica que as mulheres fizeram e podem oferecer para uma reforma do corpo eclesial, a identificação de critérios e modalidades para uma prática transformadora efetiva. A partir desse contexto, fora da crônica, mas no coração das questões, nascem as análises e o "sonho" de Serena Noceti e Cettina Militello que aqui publicamos.
As reflexões sobre o binômio "mulheres e reforma da Igreja" trazem no contexto das muitas contribuições dedicadas ao tema da reforma eclesial, três elementos-chave.
1) Em primeiro lugar, estamos diante de uma fase histórica e eclesial inédita. As mulheres são hoje portadoras na sociedade, e até mesmo na Igreja, de uma palavra conceituada, competente e pública.
Elas são marcadas por formas de subjetividade e possibilidade de ação desconhecidas para as mulheres das gerações dos séculos passados.
O estudo da história das Igrejas cristãs permite recuperar a memória de algumas mulheres envolvidas em processos de "reforma na igreja" (vida monástica, participação das mulheres na Reforma Protestante, fundação de institutos religiosos de vida ativa, associações laicais, etc.), mas ao mesmo tempo destaca a ausência de mulheres dos processos de "reforma da igreja" quando a mudança é intencional e abrangente, apesar das intuições de reforma e reformas possíveis e desejadas que não poucas entregam na forma da visão ou da linguagem da profecia.
Hoje, as mulheres - que constituem a “imensa maioria” do corpo eclesial, dos praticantes habituais, dos operadores pastorais - desejam participar e oferecer sua contribuição específica para a reforma geral do corpo eclesial, das suas dinâmicas, formas relacionais, práticas. "As reivindicações dos direitos das mulheres [...] colocam à Igreja questões profundas que a desafiam e não podem iludir superficialmente" (Francisco, Evangelii gaudium 104), mostram a distância no corpo eclesial entre afirmações teóricas de subjetividade sobre o fundamento batismal, apelos à co-responsabilidade e efetivo reconhecimento no plano operacional: não raramente mulheres e leigos são relegados ao papel de "colaboradores" da hierarquia ou "coadjuvantes" e "operários" chamados a aplicar orientações definidas apenas pela hierarquia.
Não basta ouvir a palavra de algumas mulheres porque a reforma possa acontecer: é necessário ativar processos sinodais, em todos os níveis (das dioceses às Igrejas nacionais), que permitam a todas as mulheres que o desejem expressar intuições e sonhos de uma reforma eclesial, sinalizar problemas pendentes, denunciar fatores de discriminação ou de subestimação, sugerir percursos de transformação. Agora é a hora de celebrar "Sínodos das mulheres sobre a igreja".
2. Em estreita relação com esse primeiro ponto, uma segunda questão: a reflexão teológica que as mulheres têm desenvolvido nos últimos cinquenta anos é rica e variada, por sensibilidade e abordagens, mas permanece pouco conhecida, raramente mencionada, muitas vezes indicada na forma de uma "notável exceção" frente a uma teologia que permanece em grande parte androcêntrica, por linguagem, categorias e perspectivas. A reforma eclesial exige ser pensada em conjunto, como "Igreja de homens e mulheres", na consciência de que a Igreja está orientada, estruturada e organizada a partir de modalidades de interpretação da diferença sexual, e que no projetar uma visão ideal da Igreja rumo à qual caminhar, precisamos manter conscientemente presente a questão de gênero. Uma reflexão sistemática sobre a masculinidade, sobre a relação entre masculinidade e poder na Igreja católica - temática hoje quase ausente - tornou-se urgente.
3) Finalmente, agora se tornou claro que não se trata de substituir estruturas obsoletas com outras estruturas, mas de re/ativar e re/definir os processos globais. Toda reforma eclesial toca simultaneamente e correspondentemente, três planos: a autoconsciência coletiva (amadurecer uma nova visão da Igreja), a forma da vida eclesial (as dinâmicas participativas e comunicativas, o modo de viver a comunhão, o estilo eclesial), as estruturas e as instituições através das quais o corpo eclesial age e se conserva ao longo do tempo.
Nos dois primeiros planos as mulheres podem hoje, especialmente com a sua palavra e ação pastoral, operar diretamente na mudança desejada; para uma transformação das estruturas do "nós" eclesial abrangente, ao contrário, o agir das mulheres não pode ser que indireto e parcial. Uma reflexão, realizada em uma perspectiva de gênero, sobre o poder e os poderes da Igreja parece então imprescindível; sem reduzir facilmente tal pedido a "reivindicação feminista", ajudaria toda a Igreja a enfrentar com maior liberdade um tema básico, mas raramente mencionado ou que costuma ser "banalmente" sublimado no recurso genérico à terminologia do "serviço".
Não pode ocorrer uma reforma da Igreja que prescinda, hoje, de uma reconsideração das formas de ministerialidade das mulheres: trata-se de promover em diferentes contextos e em diferentes níveis da vida eclesial "percursos de pesquisa" teológico-sistemática e pastoral sobre os multíplices ministérios realmente exercidos por mulheres, sobre ministérios instituídos a serem promovidos, sobre a possibilidade de uma ordenação diaconal. A Igreja vive – hoje mais do que nunca - da profecia e da diaconia das mulheres: as estruturas, os papéis, as funções que conformam a Igreja devem ser assim remodelados.
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A palavra das mulheres para transformar o "nós" eclesial - Instituto Humanitas Unisinos - IHU