03 Outubro 2017
O Papa Francisco aproveitou bem este último domingo quando viajou para as cidades italianas de Cesena e Bolonha, passando longos períodos entre imigrantes e refugiados recém-chegados ao país, encontrando-se com trabalhadores e pessoas empobrecidas, cuidando de doentes e deficientes, além de repetidamente exortar os jovens e idosos a conversarem entre si.
A reportagem é de Inés San Martín, publicada por Crux, 02-10-2017. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Nuvens ameaçadoras sobre Roma no domingo representaram um dia sombrio para muitos dos moradores da cidade. No entanto, o Papa Francisco, em visita a duas cidades italianas, pareceu ter tido um domingo perfeito, ao almoçar com os pobres e passar a grande parte do tempo cumprimentando migrantes, idosos, pessoas com deficiência e bebês.
“Não existe uma vida cristã decidida em uma conversa ao redor de uma mesa, cientificamente construída, onde basta cumprir alguns ditames para aquietar a consciência. A vida cristã é um caminho humilde de uma consciência nunca rígida e sempre em relação com Deus, que sabe arrepender-se e entregar-se a Ele nas suas pobrezas, sem nunca presumir bastar-se a si mesma”, disse Francisco na missa celebrada no estádio Renato Dall’Ara, de Bolonha.
Esta celebração encerrou uma visita de 10 horas feita no domingo, dia 1º, a Cesena e Bolonha.
Francisco refletiu sobre o Evangelho de domingo, que fala de Jesus a discursar a chefes religiosos de seu tempo, em que conta a parábola dos dois filhos: aquele que, quando seu pai lhe pediu para ir trabalhar nos campos, se recusa, mas depois vai, e o outro que diz “sim”, mas não segue até o fim.
No coração do primeiro filho, disse o papa, ainda ressoava o convite do pai, enquanto que no coração do segundo, apesar do sim inicial, “a voz do pai ficou sepultada”. A recordação do pai, continuou o papa, “despertou o primeiro filho da preguiça, enquanto o segundo, mesmo conhecendo o bem, negou o dizer com o fazer. De fato, tornou-se impermeável à voz de Deus e da consciência e assim tinha abraçado sem problemas a duplicidade de vida”.
Com essa parábola, disse ele, Jesus coloca dois caminhos diante de nós, porém “podemos escolher ser pecadores em caminho, que permanecem na escuta do Senhor e quando caem se arrependem e se reerguem, como o primeiro filho; ou pecadores sentados, prontos a justificar-se sempre e somente mediante as palavras, segundo o que convém”.
Os chefes religiosos daquele tempo a quem Jesus falava, explicou o papa, se assemelham ao filho que levava uma vida dupla, enquanto as pessoas comuns se comportavam frequentemente como o primeiro filho.
“Estes chefes sabiam e explicavam tudo de modo formalmente irrepreensível, como verdadeiros intelectuais da religião”, falou o papa. “Mas não tinham a humildade de escutar, a coragem de interrogar-se, a força de arrepender-se. E Jesus os repreende de forma severa, dizendo que até mesmo os publicanos (…) os precederiam no reino de Deus”.
Eles não estavam “enganados sobre uma coisa em particular”, mas o jeito deles de viver e pensar diante de Deus, como um todo, é que era equivocado, disse o papa sobre alguns dos chefes religiosos da época. Eles eram “inflexíveis custódios das tradições humanas, incapazes de compreender que a vida segundo Deus é ‘em caminho’, que pede a humildade de abrir-se, arrepender-se e recomeçar”.
Ser humilde e reconhecer a necessidade de Deus, disse Francisco, é o caminho para se superar a “a hipocrisia, a duplicidade de vida, o clericalismo que acompanha o legalismo”, mal denunciado por Jesus na parábola.
A palavra-chave, insistiu o papa, é arrepender-se. É o arrependimento, segundo ele, “que permite não enrijecer-se, de transformar os ‘nãos’ a Deus em ‘sim’, e os ‘sim’ ao pecado, em ‘não’, por amor ao Senhor. A vontade do Pai, que a cada dia delicadamente fala à nossa consciência, se realiza somente na forma de arrependimento e da conversão contínua”, disse Francisco, acrescentando que, definitivamente, no caminho de cada um existem duas estradas: ser pecadores arrependidos ou pecadores hipócritas.
O que importa, de acordo com Francisco, não são os raciocínios que justificam e tentam salvar as aparências, “mas um coração que avança com o Senhor, luta a cada dia, se arrepende e retorna para Ele”.
O Palavra pontífice encerrou a sua homilia no estádio deixando os fiéis ali presentes com três pontos de referência a ser observados. Chamou-os de “os três P”: Palavra, Pão, os pobres.
Por “Palavra”, Francisco queria dizer os Evangelhos: “é a bússola para caminhar com humildade, para não perder a estrada de Deus e cair na mundanidade”.
O “Pão”, continuou, é o Pão Eucarístico, porque “tudo começa a partir da Eucaristia. É na Eucaristia que se encontra a Igreja: não nas conversas e nas crônicas, mas aqui, no Corpo de Cristo partilhado por pessoas pecadoras e necessitadas”.
O último “p”, disse ele, são os pobres. “Ainda hoje, infelizmente, para tantas pessoas falta o necessário. Mas existem também tantos pobres de afeto, pessoas sozinhas, os pobres de Deus. Em todos eles encontramos Jesus”.
No total, o pontífice proferiu seis discursos no domingo, muitos deles recheados com ideias já conhecidas de seu estilo de pregar, tais como o apelo aos pais para que “gastem tempo” brincando com os filhos, dito num encontro com o clero, religiosos consagrados e leigos de conselhos pastorais, membros da Cúria e representantes das paróquias na igreja de Caserta.
Aqui também, mais uma vez o papa insistiu na importância do diálogo intergeracional: “Em seus grupos, em suas paróquias, comunidades, procurem este diálogo” – entre os jovens e os mais velhos.
“Um jovem que não aprendeu a acariciar uma pessoa idosa está perdendo algo, um idoso que não tem a paciência com os jovens está perdendo algo. Ambos precisam um do outro”, acrescentou o papa, falando de improviso, algo que fez ao longo do dia em vários momentos.
Mais no fim da jornada, Francisco visitou um centro de refugiados na região de Bolonha conhecido como “o Hub”. É o lar para cerca de 1.000 pessoas que buscam asilo no país, com a maioria tendo chegado à Europa a partir da África e do Oriente Médio via Mar Mediterrâneo, o qual Francisco apelidou de “mare mortum”.
Após falar aos presentes no encontro, onde pediu por corredores humanitários para refugiados a fim de evitar “esperas intoleráveis” e apoiar programas de acolhimento privados e comunitários, o papa passou quase uma hora cumprimentando muitos deles pessoalmente.
Imagens mostram que o pontífice ganhou uma pulseira, como as usadas pelos que buscam asilo no Hub. A pulseira – que ele usou no pulso direito – veio com o seu nome e o número 3900003 inscritos.
Como muitas vezes faz durante as viagens de um dia, o papa almoçou com os pobres. Neste caso, eram quase 1.000 pessoas, junto com os que os auxiliavam. O evento aconteceu na Basílica de São Petrônio.
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A versão de um domingo perfeito para Francisco é com os pobres, imigrantes e doentes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU