17 Agosto 2017
“Cambiemos” de Macri obteve 1,7 milhão de votos a mais do que nas eleições gerais de 2015, ou seja, 7% a mais, o que significa um aumento do apoio eleitoral. Ganhou em todos os distritos que governava, embora em Buenos Aires ainda esteja por se saber, podendo ganhar ou perder por 1 ponto. Ganhou em 6 províncias: Córdoba, La Pampa, Entre Ríos, San Luis, Santa Cruz (província dos Kirchner) e Neuquén.
O comentário é de Carlos Gadea, professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Unisinos.
Se nas eleições de outubro se mantiverem ou aumentarem os votos, algo bastante provável, terá somado 15 deputados e 9 senadores a mais.
Em Buenos Aires, as chapas da atual governadora, Maria Eugenia Vidal (de Cambiemos), ganharam em 101 distritos, de um total de 135, apesar de ter só 69 intendentes (governo distrital). Em Buenos Aires, o Cambiemos também se impôs em territórios dos dirigentes kirchneristas mais dogmáticos.
Por exemplo, personagens políticos emblemáticos que aderiram a Cristina Kirchner para o senado fizeram verdadeiros papelões, como o líder Luis D’Elia, deixando claro sua falta de representatividade e recusa popular. Luis D’Elia, aquele que uma vez teria falado que se devia fuzilar dissidentes na Venezuela, obteve apenas 15 mil votos. O mesmo destino teve o obscuro direitista pró-nazi Alejandro Biondini, os dois felizmente expulsos das eleições de outubro pelo voto popular.
Na realidade, estas eleições evidenciaram não só um apoio a Macri e ao processo político que está conduzindo, numa Argentina difícil de ser governada se não se é peronista. Evidenciou que a rotina de conflitos e mobilizações constantes nas ruas, certamente de grupos visivelmente minoritários e radicais, não é um bom caminho para ganhar as simpatias da gente em democracia. Até a Central de Trabalhadores já entrou em crise para uma paralisação que prometiam para daqui uma semana, considerando o voto popular do domingo. Seria um tiro no pé fazer uma greve contra um governo que saiu fortalecido, e a apenas dois meses de uma eleição chave.
“Cambiemos” teve uma ampla adesão entre o padrão eleitoral jovem. Ganhou, também, em muitos lugares onde mora gente humilde. Em Villa Lugano, por exemplo, se impôs por 10 pontos de diferença aos “revolucionários” de Daniel Filmus. Também ganhou em Tres de Febrero, onde também a diferença foi de 10 pontos em relação à chapa de Cristina, vencendo um líder e “capanga” eterno do distrito, aderente do kirchnerismo. Sabe-se que em Lugano e Tres de Febrero não abundam os milionários. São cidadãos que, certamente, têm a esperança de terminar com as máfias da corrupção política, policial e do narco. São cidadãos que estão cansados não tanto do peronismo, mas sim da oligarquia do peronismo, verdadeiros magnatas e, além disso, “encrenqueiros”. “Cambiemos” ficou em 1° ou 2° em 23 províncias.
Talvez muitos se tenham que convencer (a contragosto) de que o espinhoso tema econômico da Argentina também foi a favor de Macri. Pelo menos para explicar, em parte, o apoio recebido no domingo nas eleições parlamentares. O governo de Macri não pode, por enquanto, apresentar dados econômicos espetaculares, isso é claro. Que a recuperação do país ainda é uma assinatura pendente, qualquer um já o sabe. No entanto, pareceria que a gente sabe, intui, suspeita, sente, que as coisas podem melhorar ou já estão melhorando, e fundamentalmente para os mais necessitados. O dólar se ajeitou, caiu o risco país (um fantasma para o ciclo kirchnerista), as ações e “bônus” subiram, o trabalho está aumentando assim como o consumo, e a inflação baixou pela metade. Algumas dúvidas sobre a governabilidade ficaram para trás. Esta realidade não se compadece com o invento de um pais à beira do caos e a quebra que vem fomentando os rapazes de La Campora, os “boys” da economia do fatídico governo de Cristina Kirchner.
Algumas coisas ficaram mais claras. O clima de “piquetes”, amplamente divulgados pela “mídia amiga” e a militância saudosa das “bolsas sociais” (e que só entendem a política como relação clientelista), de cortes de estradas e ruas, com paralisações e mobilizações de “sindicatos amigos”, com declarações catastróficas, não ecoaram na população. Ao contrário. Que existem problemas de desocupação e pobreza, ninguém duvida. Para um país que, recentemente, já teve índices de pobreza como os de um país da África, não é surpresa. Mas, obviamente, não se está perante uma crise como a de 2001, apesar do esmero para fazer crer nisso, principalmente aos que vivem fora da Argentina. Por mais que tenham construído uma narrativa que queria assemelhar o cenário político recente com o de 2001, a maioria os ignorou. Não os alcançou o incêndio social que fomentaram; a maioria votou em candidatos do governo de Macri.
Macri lidera uma coalizão política. De gente de esquerda, de centro e de direita. De católicos e de ateus. Tem o apoio de políticas como Elisa Carrió, de grande parte dos dirigentes da União Cívica Radical, de intelectuais universitários, de artistas, como do mais importante diretor de cinema atual da Argentina, Juan José Campanella (conhecido no Brasil pelo filme “O segredo dos seus olhos”).
O governo de Macri se apresenta como de transição do populismo autoritário para a república. Até o momento, uma espécie de pesadelo para o retorno kirchnerista e o estilo peronista de governar. Trata-se de um sinal importante, inclusive, para os tempos recentes na Venezuela. Um vento sul que pode ajudar o país caribenho a se inspirar no melhor estilo da vida democrática e eleitoral.
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Breves e rápidos comentários sobre as eleições primárias parlamentares na Argentina - Instituto Humanitas Unisinos - IHU