25 Abril 2017
No início do ano letivo de 2016, os alunos da Escola de Ensino Médio Cheverus, em Portland, Maine, saíram da sala de aula para aprender sobre as árvores. A professora de teologia Mary King já havia questionado os alunos sobre logotipos de empresas - eles conheciam centenas -, mas descobriu que eles não lembravam a flora local na mesma medida.
A reportagem é de Brian Roewe, publicada por National Catholic Reporter, 21-04-2017. A tradução de Luísa Flores Somavilla.
- Não sabemos diferenciar um olmo de um carvalho, disse ela.
No exercício ao ar livre, os alunos tinham que identificar as árvores ao redor do campus: em Maine, há muitos pinheiros, embora os alunos tenham visto um bordo e uma faia americana também. De volta à sala de aula, eles compartilharam snaps das folhagens do campus nas redes sociais, também para ver o que tinha perto das escolas católicas em outros lugares do país. Havia um pé de algodão americano em St. Louis, um sicômoro e um álamo-tremedor em Omaha, Nebraska, e sequoias em Santa Cruz, Califórnia.
A atividade de compartilhamento de fotos, através da hashtag #iggycarbon, foi parte do Ignatian Carbon Challenge, um programa criado pelos professores Mary King, Cicy Po e Helene Adams, da Cheverus, mas adotado por escolas católicas em todo o país através da Ignatian Solidarity Network.
"Foi muito legal quanto vimos que o projeto estava se espalhando para vários lugares", disse Karen Nielsen, aluna da Cheverus, uma escola jesuíta mista.
Desde a sua estreia em setembro, o Ignatian Carbon Challenge apresentou mensalmente oito possíveis ações a milhares de estudantes participantes: algumas simples, outras mais intensivas, mas todas com o objetivo de dar vida à Laudato Si' dentro das escolas católicas e, por fim, no dia a dia dos alunos. Cada desafio baseia-se em um conceito da encíclica do Papa Francisco sobre o ambiente e a ecologia humana, "Laudato Si', sobre Cuidados para a nossa casa comum", que os professores queriam usar como embasamento católico de suas atividades.
De diferentes maneiras, os desafios tentam estimular os alunos a pensarem sobre sustentabilidade e as mudanças climáticas, o impacto de hábitos aparentemente inofensivos e sua relação com o mundo à sua volta. Um caminho institucional separado leva o desafio para a escola mais ampla, para pensar em maneiras de implementar a sustentabilidade em três dimensões - instalações, pensamento estratégico, formação de comunidades - na cultura do campus.
O desafio "identifique uma árvore" começou em setembro, quando o foco dos desafios era confrontar hábitos. Alguns desafios de novembro encorajaram os alunos a aprender sobre o Fundo Verde do Clima e contatar autoridades eleitas para encorajar o apoio. Em um desafio de janeiro, os alunos contaram quantos dias eles conseguiam ficar sem comprar itens de plástico de uso único e, em outro, pedia que eles encontrassem empresários em sua comunidade que estivessem transformando lixo em algum negócio bem-sucedido.
Um dos desafios mais populares veio em fevereiro, quando as turmas realizaram um teste de sabor comparando o chocolate de comércio equitativo com uma barra de Hershey's.
"Dar chocolate às crianças é garantia de ser um bom dia para elas", disse Bill Anderson, professor de ciências da Escola de Ensino Médio da Universidade de St. Louis, que também está participando do desafio.
Em seu primeiro ano, 26 escolas e 5 mil pessoas assumiram o desafio do carbono, que iniciou dentro da rede jesuíta, mas se expandiu a todas as escolas católicas de Ensino Médio. Kim Miller, diretora do programa da Ignatian Solidarity Network, disse que a participação superou as expectativas.
"Mas eu acho que o maior objetivo para nós era criar um programa que funcionasse e permitisse o engajamento com o Laudato Si', tanto em nível individual como institucional. E acredito que já atingimos isso este ano", disse ela ao NCR.
Outra aluna da Cheverus, Eva Griffith, acrescentou que o desafio "realmente chamou a atenção de muitos estudantes e fez com que nós parássemos e pensássemos sobre as escolhas que fazemos todos os dias e como isso vai afetar o mundo no futuro".
O Ignatian Carbon Challenge foi criado quando os professores de ciência e teologia da Cheverus participaram do Fórum de Ensino da Igreja Inaciana de 2014, um encontro anual da Ignatian Solidarity Network. Depois da publicação de Laudato Si' em junho de 2015, a escola fez a leitura do romance distópico Parched, de 2014, de Georgia Clark e o corpo docente realizou um dia de discussões sobre justiça ambiental, mudanças climáticas e sobre como os departamentos poderiam incorporar estes temas aos cursos no ano seguinte. A partir dessas discussões, nasceu o Carbon Challenge.
"Queríamos criar um desafio para compartilhar com toda a rede de escolas jesuítas... com base no movimento de nossa experiência em nossa escola e do documento, Laudato Si'", disse Mary King.
Na encíclica, Francisco fala sobre a importância da educação ecológica, particularmente na infância, para que esse plantio "continue gerando frutos ao longo da vida". Ele disse que a "cidadania ecológica" tem que ir além de fornecer informações e encorajar bons hábitos.
"Somente cultivando virtudes saudáveis as pessoas serão capazes de comprometer-se altruisticamente com a ecologia", escreveu o Papa. "Alguém que possa gastar e consumir mais, mas decide usar menos aquecimento e roupas mais quentes, demonstra o tipo de convicção e atitude que ajudam a proteger o meio ambiente. Há uma nobreza no dever de cuidar da criação através de pequenas ações diárias, e é maravilhoso como a educação pode trazer mudanças reais no estilo de vida".
Na verdade, a leitura de Laudato Si' tem sido uma peça-chave do desafio. Em algumas escolas, isso significou reler a passagem relativa a cada desafio. Em outras, ajudou a enraizar a encíclica em tarefas de leitura nos cursos de teologia e justiça social. Nielsen disse que, em uma noite, ao fazer as tarefas com um amigo não católico de outra escola, ele leu partes de Laudato Si' e comentou: "O Papa disse isso mesmo? Sério?"
Nielsen disse que a maioria de seus colegas conhecia conceitos básicos como "reduzir, reutilizar, reciclar", mas que o desafio e a encíclica os ajudaram a desenvolver uma compreensão maior do motivo pelo qual os católicos e todas as pessoas são chamadas a pensar em questões ambientais como a mudança climática.
Os diretores da Cheverus ficaram preocupados com possíveis rejeições das linhas climáticas de cada extremo, mas até agora nada disso aconteceu. Mary King disse que a justiça social fornece um ponto de entrada para muitos adolescentes católicos - "os adolescentes têm um senso de justiça bem desenvolvido" - em tais discussões e em sua fé.
Da mesma forma, os estudantes com fortes visões pró-vida apresentam uma base para falar sobre as comunidades humanas afetadas pela degradação ambiental.
Em um desafio, os estudantes de teologia de Mary assistiram ao documentário "The True Cost" sobre a indústria têxtil e o comércio justo. Apesar de o prazo da tarefa ser depois das férias, muitos alunos assistiram ao filme, o que estimulou conversas que continuam surgindo em questões de redação e outras discussões em sala de aula.
Quatro anos atrás, Cicy Po percebeu um posicionamento acomodado de seus alunos de ciências em relação a grandes questões ambientais, mas devido ao desafio ou outras questões, esse sentimento diminuiu. O objetivo do desafio, acrescentou Mary, foi mostrar aos alunos que a mudança não deve ser relegada a empresários, presidentes ou até mesmo aos pais, mas que eles também podem fazer a diferença através de seus hábitos do dia a dia.
Na encíclica, o Papa Francisco exortou as pessoas a não pensarem que esforços como reciclar, reduzir do consumo de água, apagar as luzes e a carona solidária "não vão mudar o mundo. Eles beneficiam a sociedade, por mais que não percebamos, porque convocam uma bondade que, embora invisível, tende inevitavelmente a se espalhar."
Os professores da Cheverus destacaram que o desafio não tem o intuito de ditar o que as escolas devem fazer, mas sim inspirá-las e inspirar seus alunos a adotar quaisquer ações em um leque de opções. O principal objetivo é levar a sustentabilidade para além de uma mentalidade complementar, mas como parte essencial de sua missão como instituições católicas.
"Queremos que seja parte da constituição de nossas escolas", disse Mary.
Cicy gostaria que o desafio proporcionasse a colaboração entre as escolas católicas dos EUA para desenvolver agentes de mudança social. Em sua escola, ela já notou como o desafio e "o vento do Laudato Si' " afetaram as normas culturais e estimularam ações como a implementação de um programa de gestão de resíduos, a criação de uma política "contra carros ociosos" ou em prol das energias renováveis: "Assim, deu peso a vozes que antes eram dissonantes. E vem unificando muitas dessas vozes, tanto que coisas reais estão acontecendo."
Algumas das maiores atividades do Ignatian Solidarity Challenge ocorreram na Escola de Ensino Médio Jesuíta Walsh, em Cuyahoga Falls, Ohio. Depois de ficar sabendo do programa no Fórum de 2016, Roman Gioglio pediu aos diretores de sua escola para participar do desafio institucional. Eles concordaram, e Gioglio começou a trabalhar.
O desafio "promoveu muita discussão sobre esses problemas, e esse é o primeiro passo para resolver o problema", disse Gioglio, cuja paixão pelo meio ambiente deve-se em partes ao fato de ele morar perto do Parque Nacional do Vale de Cuyahoga.
Um dos projetos mais recentes da Walsh foi uma bagunça - propositalmente. No final de um dia letivo de fevereiro, os membros da equipe de ecologia pegaram todo o lixo acumulado naquele dia, despejaram em lonas dentro da escola e começaram a separá-lo em plástico, lixo e alimentos não consumidos. A cena chamou a atenção dos colegas que passavam, assim como o fedor.
"Muitas pessoas se aproximaram e disseram: 'O que aconteceu, o que vocês estão fazendo?' O cheiro também era muito ruim”, disse Gioglio.
O controle de lixo estava entre os desafios referentes às instalações, e Gioglio espera que eles possam usar os dados do exercício para educar a escola sobre uma melhor utilização das latas de lixo disponíveis para reciclagem, compostagem e lixo.
"Conseguir usar essas três latas corretamente é um dos problemas que enfrentamos", disse Gioglio.
Considerando todo o sucesso em seu lançamento, o Ignatian Carbon Challenge também teve seus próprios desafios.
Um deles é conectar melhor os desafios ao Laudato Si' e outros documentos da Igreja, tornando-os o mais transversal possível. Depois, há a questão de sincronizar os desafios com planos de aula melhor elaborados para enfrentá-los.
"Penso que tentar criar algo que se encaixe nos currículos de todos exatamente ao mesmo tempo seria um milagre", disse Anderson, professor da Escola da Universidade de St. Louis, que faz parte do comitê de preparação da próxima edição do Inatian Carbon Challenge.
A versão 2.0 foi lançada em abril e terá os recursos prontos até o verão. Ela planeja reduzir os desafios de oito para quatro por mês, cada um oferecendo um nível simples e mais difícil para permitir maior flexibilidade aos alunos e professores. Também haverá foco na flexibilidade em relação ao prazo de conclusão - por exemplo, um desafio planejado para setembro pode acontecer em março, se fizer mais sentido no currículo.
Quanto a enraizar o desafio na escola, os professores organizadores entendem os que o vêem como mais uma tarefa em um currículo já bastante corrido. Eles também sentem o mesmo.
"Eu me sinto assim muitas vezes, também", disse Anderson. "Mas acho que isso é tão importante que precisamos nos certificar de que podemos encontrar maneiras de fazer acontecer."
Cicy Po, uma das diretoras da Cheverus, disse que às vezes foi difícil integrar o programa em seu método pré-estabelecido de ensinar biologia avançada. Ela disse que o comitê 2.0 está constantemente procurando maneiras que permitam que os professores usem o desafio "de uma forma que se encaixe com o currículo". A expansão do programa para fora das salas de aula de ciências e teologia, segundo os professores, amplia a importância da justiça ambiental e outras questões de justiça social, assim como etapas paralelas no nível administrativo.
A ideia de que os professores tentem partir do currículo estabelecido para introduzir questões sobre sustentabilidade não se perde nos alunos, disse Nielsen.
"É preciso aceitar a ideia de que a educação não é algo que se depreende de um livro didático e de que é preciso aprender algumas coisas que estão no ambiente imediato e tentar relacioná-las ao que se lê nos livros", disse ela.
Juntamente com o Ignatian Solidarity Network, Miller espera que mais escolas aceitem o desafio no ano letivo de 2017 e os organizadores estão explorando incentivos de retorno dos programas anteriores para angariar uma participação ainda maior. Eles estão tomando cuidado para encontrar o equilíbrio justo da concorrência - não deram prêmios para não criar mais desperdício - e para reconhecer que as escolas estão começando em diferentes pontos. Criar relatórios mais amplamente divulgados de escolas com alta participação é uma ideia, mas eles estão decididos a manter o foco no crescimento pessoal e nas mudanças positivas no estilo de vida.
"A questão não é quem é a pessoa mais ecologicamente correta na escola ou no país, considerando o desafio em âmbito nacional", disse Griffith, estudante da Cheverus. "Mas apenas olhar para as metas de cada mês e pensar: 'O que posso fazer para me desafiar?' "
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EUA. Desafio 'Ignatian Carbon Challenge' dá vida a 'Laudato Si' nas escolas católicas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU