Por: André | 06 Julho 2016
“A Scholas Occurrentes tem muito a aprender com seus erros”. Falhas de comunicação. Com o Papa, com os integrantes da fundação e com o público em geral. Palavras de José María Del Corral, presidente da organização pontifícia que neste momento encontra-se no olho do furacão na Argentina. Uma reportagem de televisão acusou-a de tráfico de influências e suspeitas de corrupção. Em entrevista ao Vatican Insider, o presidente deu sua versão. Negou malversação de dinheiro e tomou distância de quem – disse – pretender lucrar com saudações de Francisco.
A reportagem é de Andrés Beltramo Álvarez e publicada por Vatican Insider, 05-07-2016. A tradução é de André Langer.
“Evidentemente, reconhecemos falhas, caso contrário seria impossível fazer disto uma aprendizagem. Isto não é uma companhia de sucessos nem uma companhia esportiva”, aceitou Del Corral com voz rouca, fruto de uma bronquite que se arrasta por 10 dias. Poucas horas se passaram desde o demolidor o relatório do Periodismo Para Todos (PPT), o programa investigativo argentino que foi visto por 1,6 milhão de pessoas na noite do domingo passado, 03 de julho.
“Em nome do pai” era o título da reportagem, do programa apresentado por Jorge Lanata, que pareceu ter como alvo o Papa. Para além dos erros reconhecidos, o presidente da Scholas advertiu a existência de um especial ensinamento com a fundação que ele preside com o que descreveu como uma tentativa, de certos grupos políticos e jornalísticos argentinos, de solapar a autoridade de Francisco. “Há muitos colegas e outras pessoas, como os padres villeros, que dizem que existe uma campanha contra ele”, ilustrou.
À pergunta, a estas horas óbvia, sobre a eventualidade de uma renúncia dele e do outro presidente mundial da fundação, Enrique Palmeyro, afirmou: “Nós sempre estivemos dispostos a fazer o que o Papa nos pedisse, há mais de 15 anos, e vamos continuar a fazê-lo. Não somos funcionários políticos”.
“Estamos falando com o Papa, sempre dialogamos e quando ele quiser, quando podemos será fisicamente. Nós estaremos na direção da Scholas enquanto for útil para esta missão. A nossa esperança, inclusive, é que esta obra de bem tem que superar o próprio Papa Francisco e seus diretores”, apontou.
Em Roma, Francisco soube com antecedência sobre a reportagem do PPT. Ainda no sábado mostrou-se chateado com a questão. Na verdade, está há várias semanas preocupado, porque a Scholas é uma obra que ele valoriza muito. Mas as polêmicas não tiram dele a habitual serenidade.
Enquanto isso, na Argentina, a fundação sofreu um forte abalo interno que produziu algumas renúncias e uma avalanche de questionamentos. A história das revelações começou no mês passado quando o Vatican Insider antecipou a chateação do Papa com a doação de 16 milhões de pesos que esse organismo iria receber do governo do presidente Mauricio Macri. Poucos dias depois, foi confirmada a decisão de rejeitar essa contribuição, a pedido direto de Francisco. Uma solicitação que constava em uma carta com uma frase iniludível: “tenho medo de que vocês comecem a escorregar no caminho da corrupção”.
Del Corral não soube responder com exatidão por que Francisco chegou a escrever essas frases e afirmou: “É sua preocupação permanente, é o que sempre disse e nós temos consciência”. Reconheceu que parte do problema surgiu porque nem ele nem Palmeyro lhe explicaram claramente os detalhes da doação. “Um erro de comunicação. Mas ele mesmo – em sua carta – nos esclareceu que o considera como um erro involuntário e reafirmou a sua confiança em nós”, precisou.
Além disso, o presidente da Scholas atribuiu muitos dos seus males à “deficiente comunicação”. Por exemplo, atribuiu à “falta de experiência ou de conhecimento” o fato de nunca ter feito um relatório de atividades, lista de doadores ou um balanço orçamentário. “Nós não informamos às pessoas sobre os nossos projetos, nem tampouco prestamos contas administrativas publicamente. Esse foi outro erro nosso. Vamos fazer isso a partir de agora. Mesmo que a lei não nos obrigue, queremos fazer relatórios semestrais e publicá-los, para evitar desconfianças”, explicou.
E em seguida deu longas explicações sobre cada uma das acusações feitas pela imprensa. Precisou que no dia 01 de dezembro de 2014, a fundação assinou um convênio com o Ministério do Planejamento como parte do Projeto Enamorar. Na época, era presidente Cristina Fernández de Kirchner. Informou que, por esse acordo, o governo comprometeu-se a construir uma sede para a Scholas no município de Ezeiza, mas que o projeto nunca foi terminado: “Nós não recebemos um peso. O apoio era o prédio, mas nunca nos entregaram a documentação referente ao terreno”.
“Por que não impugnaram esse acordo por falta de cumprimento?”, foi perguntado a ele. Del Corral respondeu: “Reclamamos isso ao governo argentino anterior e estamos reclamando ao atual a sede prometida. E agora nos responderam que vão resolver rapidamente esse problema. Neste mês deveria ficar solucionada a questão da nova sede da Scholas. Alguns, do governo anterior, quiseram fazer uso político dessa obra (de Ezeiza) e por isso colocaram placas com o nosso nome e que não podemos tirar, porque não podemos entrar em um terreno público”.
Além disso, desvinculou-se da publicidade do Jogo da Paz, previsto para o dia 10 de julho no Estádio Único de La Plata, na qual se concedia como benefício para os patrocinadores uma saudação ao Papa em Roma. Essa apresentação foi realizada pela empresa Visión Deportiva, de Lisandro Borges. Mas, para Del Corral essa empresa “adiantou-se”, já que ainda não foi assinado o contrato com o responsável pelo jogo, Roberto Sarti. Minimizou inclusive o fato de que Borges tenha viajado a Roma para o encerramento do congresso da Scholas onde foi anunciado o jogo, agora “adiado”.
Ele garantiu que esse jogo na Argentina irá acontecer no segundo semestre, assim como também outro em Roma, no dia 12 de outubro. “Sim, sim, isso está confirmado”, insistiu. E explicou que a missão mundial da Scholas necessita de muitos recursos, razão pela qual existe o interesse em organizar eventos esportivos.
Sobre a presença de Marcelo Mallo – um “barrabrava” argentino agora fugitivo da justiça por estar envolvido em um duplo assassinato – em um dos congressos da fundação em Roma esclareceu que ele participou pela fundação “Rescátame Argentina”. “Nós tínhamos um acordo com essa fundação porque conhecemos sua presidente da comissão de pais da Arquidiocese de Buenos Aires. Quando fizemos o convite a eles, mandaram dois representantes e um deles era Mallo, mas não sabíamos de seus antecedentes judiciais”, observou.
Finalmente, aceitou que existe um mal-estar com a Scholas entre muitos ex-colaboradores e pessoas vinculadas à Igreja na Argentina. E apontou: “É verdade, muita gente de boa vontade que nos acompanhou em um princípio foi se afastando por culpa nossa, porque não soubemos comunicar-nos com eles e houve mal-entendidos. Esse foi outro erro. Nos encontramos com alguns agora, no meio da crise, e isso é muito bom. Porque quando tudo está bem, todos te chamam, mas quando as coisas vão mal, a maioria desaparece”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Scholas responde; os erros e a sombra da corrupção - Instituto Humanitas Unisinos - IHU