01 Julho 2016
Em menos de dois meses o Governo Michel Temer (PMDB) terá de superar o seu principal desafio: o de de deixar de ser interino com a votação final do impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT) pelo Senado Federal. Para ganhar o apoio necessário, o peemedebista tem se desdobrado. Por um lado, patrocina bondades que vão consumir 125 bilhões de reais do caixa do Governo com aumento a servidores públicos, beneficiários do Bolsa Família e renegociação de dívidas dos governadores. Por outro, faz concessões políticas, garantindo cargos a aliados de senadores que ainda estavam indecisos sobre o posicionamento com relação ao impedimento de Rousseff. Tudo isso em meio a uma das maiores crises econômicas vividas pelo país e diante de uma promessa, até agora não cumprida, de ajuste fiscal. A única medida efetivada nesse sentido foi o corte, com economia real tímida, de 4.300 cargos e funções comissionados.
A reportagem é de Afonso Benites, publicada por El País, 30-06-2016.
Todas as benesses econômicas, segundo o Governo interino, estavam previstas no deficitário orçamento brasileiro. Seja como for, o Planalto ganhou ainda mais margem de manobra ao pedir que o Congresso aprovasse um rombo de 170 bilhões de reais para este ano, quase o dobro do tamanho do déficit previsto inicialmente pelo Governo de Rousseff (97 bilhões de reais). A sinalização da equipe econômica era que o tombo projetado pelo equipe anterior era irreal e subestimado e, por isso, precisava ser reajustado para cima. “Agora, começamos a nos perguntar se esse novo déficit já não inclui uma espécie de ‘licença para gastar’ com a conta do impeachment”, disse ao El País no começo do mês o economista André Nassif, da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade Federal Fluminense.
Fontes do Palácio do Planalto dizem que, neste momento, não haverá cortes drásticos e imediatos no gasto público. Isso só ocorrerá caso o impeachment seja aprovado pelos senadores. O principal foco na área econômica é garantir a aprovação do projeto de lei que cria um teto de gastos públicos da União e dos Estados e outro que trata da governança nas empresas estatais.
A generosidade mais recente de Temer é direcionada aos usuários da Bolsa Família. Na quarta-feira, fez dois anúncios. No primeiro, avisou que ao invés de reajustar o benefício que se tornou símbolo dos governos petistas em 9%, conforme previsto pela sua antecessora, o aumento será de 12,5%. O impacto dessa medida sozinha será de 1 bilhão de reais só neste ano e de 2,1 bilhões até 2018. O segundo anúncio foi o de liberar 740 milhões de reais para municípios investirem em reformas de escolas e creches que estavam com obras paralisadas mais 450 milhões para o programa de financiamento estudantil.
As benesses de Temer
• 68 bilhões de reais em reajuste para servidores, impacto ocorrerá até 2018
• 50 bilhões de reais em renegociação das dívidas com os Estados, impacto ocorrerá até 2018
• 2,9 bilhões de reais em créditos para o Rio de Janeiro por causa das Olimpíadas e do estado de calamidade pública
• 2,1 bilhões de reais de reajuste para o Bolsa Família
• 1,7 bilhão de reais de renúncia fiscal por meio do Supersimples
• 1,2 bilhão de reais para programas da Educação
“No caso do Bolsa Família, decidimos por não atingir a inflação, que foi de 19% desde o último reajuste em maio de 2014, já prevendo um corte no orçamento. Mas também não podíamos deixar essa população mais frágil ver suas finanças ainda mais corroídas”, explicou o ministro do Planejamento em exercício, Dyogo Oliveira. “Quando se anuncia o reajuste, fica claro que o governo Temer não considera a questão social como causadora do déficit. Não podemos, em nome do ajuste, não dar reajuste para um programa que trabalha com pessoas extremamente pobres”, completou o ministro do Desenvolvimento Social e Agrário, Osmar Terra. Em entrevista ao jornal do SBT, a presidenta afastada classificou, o aumento do Bolsa Família como uma irresponsabilidade fiscal.
Outra proposta que já havia sido encampada pelo presidente interino era a de aumento salarial para os servidores públicos que tramitava no Legislativo com o custo de 68 bilhões de reais ao Tesouro. Ontem, o Senado aprovou um desses reajustes, o dos servidores do Judiciário e do Ministério Público – sem incluir os ministros do Supremo Tribunal Federal. Nesse caso específico, a gestão Temer disse que só manteve um acordo que fora firmado pelo Governo Rousseff. “Essa era uma negociação que foi feita pelo governo anterior. Havia sido represado o reajuste por vários anos, o governo conseguiu uma boa negociação, e o que fizemos foi honrar a negociação que havia sido feita que é vantajosa. Aquilo que foi ajustado antes e que economicamente é bom negócio para o governo”, explicou o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, após um encontro com os senadores na quarta-feira.
Na semana passada, Temer havia anunciado uma espécie de moratória aos Estados devedores da União pelo período de seis meses e a renegociação das dívidas. A medida, que foi usada como moeda de troca com os governadores por apoio no Congresso Nacional, resultará em um impacto de 50 bilhões de reais ao Tesouro até 2018. Além disso, liberou 1,4 bilhão de reais em emendas parlamentares que estavam contingenciadas e 2,9 bilhões de reais em créditos para o Governo do Rio de Janeiro investir, principalmente, em segurança pública. O Estado, que sediará os Jogos Olímpicos, decretou calamidade pública.
Concessões políticas e pesquisa
Na arena política, Temer mirou em um grupo de senadores indecisos sobre a votação do impedimento da presidenta. No alvo do peemedebista estavam Jader Barbalho (PMDB-PA), Eduardo Braga (PMDB-AM), Romário (PSB-RJ) e Zezé Perrella (PTB-MG). Os filhos de Barbalho e Perrella foram agraciados com cargos na gestão interina. Helder Barbalho é o ministro da Integração Nacional e Gustavo Perrella, secretário no Ministério dos Esportes. No caso de Braga e de Romário, aliados deles têm sido indicados para funções de segundo e terceiro escalões na gestão.
O balcão de negócios ainda está longe de terminar. Os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Geddel Vieira Lima (Governo) conversam semanalmente com os senadores para negociar essa votação. O cálculo deles é que entre 58 e 60 parlamentares votem a favor do impeachment. Para se garantir no cargo de presidente, Temer precisa dos votos de ao menos 54 dos 81 senadores. A previsão é que a votação ocorra na segunda quinzena de agosto. Só depois da batalha de Brasília, e se vitorioso, que Temer poderá se focar em outro problema: aprovação popular. Pesquisa da consultoria Ipsos de junho, publicada pela BBC, mostrou que o contingente que desaprova Temer oscilou de 67% para 70%. Nesta sexta, o Ibope pesquisa novo levantamento sobre a popularidade do Governo federal.
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O ‘generoso’ Temer pré-impeachment concede bondades em meio ao ajuste fiscal - Instituto Humanitas Unisinos - IHU