14 Junho 2016
Os estudantes que há pouco mais de um mês ocupam cerca de 120 escolas em todo o Rio Grande do Sul deram um novo passo nesta segunda-feira (13), quando ocuparam também o saguão da Assembleia Legislativa. A medida foi tomada porque dentre as principais reivindicações dos jovens estão a retirada de dois projetos de lei: o PL 44/16, enviado pelo próprio governo do Estado, que transferiria parte da administração das escolas para organizações sociais, e o PL 190/15, do deputado Marcel Van Hattem (PP), que instituiria o programa “Escola Sem Partido”.
A reportagem é de Débora Fogliatto, publicada por Sul21, 13-06-2016.
Desde as 14h, estudantes se concentravam na esquina entre o Palácio Piratini e a Assembleia Legislativa, cantando e falando de suas pautas. O protesto contava com secundaristas de organizações como o coletivo Juntos, a União da Juventude Socialista (UJS), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), além de integrantes do grupo de escolas independentes. Havia representantes de pelo menos dez escolas no ato, incluindo uma de Novo Hamburgo e outra de Canoas. “Ô ô Sartori, fala a verdade, educação nunca foi prioridade”, entoavam.
Pouco antes das 15h, eles começaram a trancar a rua Duque de Caxias e, após alguns minutos, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) chegou para fazer o bloqueio da via e o desvio pela General Auto. Conforme mais estudantes iam chegando, a animação aumentava. “Não tem arrego, privatiza minha escola e eu tiro seu sossego”, “venho de escola ocupada, de Médio e Fundamental. Secundas, é puro o sentimento, Sartori, tu vai se dar mal” eram algumas das músicas entoadas.
Na última sexta-feira (10), o governo ingressou com uma ação na Justiça pedindo a desocupação das escolas em 48 horas para a retomada das aulas nesta segunda-feira. Eles decidiram não desocupar e fazer este ato de resistência. A semana passada foi marcada por tentativas de negociações e envios de propostas, mas não houve consenso.
Por volta das 16h, bastou que uma menina falasse ao microfone “agora vamos entrar na Assembleia, com a banda e tudo”, para que dezenas de estudantes fossem correndo para o prédio, passando pelas portas de vidro sem dar chances para os seguranças tentarem impedi-los. Chegando ao saguão, voltaram a cantar, criticando o governador José Ivo Sartori (PMDB) e o deputado Van Hattem.
“Educação privatizada, nossa resposta é Assembleia ocupada”, anunciavam eles, que disseram que só pretendem sair quando tiverem a garantia de que o PL 44/16 não será votado.
“A gente está aqui pra dizer que a gente vai resistir até que a gente consiga a garantia de uma escola pública e de qualidade. A gente só vai sair daqui quando a gente barrar o PL 44/16, porque escola pública é um direito nosso”, afirmou Ana Paula Santos, da escola Protásio Alves. Os secundaristas pedem também para serem recebidos pela presidente do Legislativo, a deputada Silvana Covatti (PP).
Empolgados, os estudantes começaram também a adaptar músicas usadas em outros protestos, como “pisa ligeiro, pisa ligeiro, quem não pode com a formiga não atiça o formigueiro”, cantada por movimentos de moradia e de trabalhadores, que foi substituída para “quem não pode com secunda” e “quem não pode com as gurias”. Da mesma forma, a música criada em protestos contra o governo interino de Michel Temer “nem recatada e nem do lar, a mulherada tá na rua pra lutar” foi adaptada para “as estudantes tão na escola pra ocupar”.
Estudantes prometem passar a noite na AL e devem se reunir com presidente pela manhã
Os estudantes secundaristas que entraram na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul na tarde desta segunda-feira (13) prometem permanecer ocupando o local pelo menos durante a noite. Uma comissão de seis representantes se reuniu com os deputados Jeferson Fernandes (PT) e Pedro Ruas (PSOL) e o superintendente Luiz Fernando Rodriguez Júnior, que articularam para que eles se encontrem com a presidente Silvana Covatti (PP) na manhã de terça-feira (14). Os alunos já montaram algumas barracas e colchões no saguão e se articulam em comissões.
A principal pauta da ocupação é a retirada do projeto de lei (PL) 44/2015, que possibilitaria a criação de organizações sociais, as quais poderiam administrar parte das escolas. O governo do Estado havia prometido ao movimento de professores e estudantes que a proposta teria seu regime de urgência retirado e a tramitação congelada por 90 dias. A proposta, porém, está atualmente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Ruas afirmou que a deputada Manuela D’Ávila (PCdoB), que atualmente é relatora do projeto, irá ler o relatório em que determina que não será votado nesta terça-feira (14), durante a reunião da comissão. “O relatório de que não será votado vai ser lido amanhã pela Manuela. Então, ao não votar amanhã, se ganha tempo, isso já é acertado pelos deputados”, garantiu. Para os estudantes, porém, a simples não-votação não é o suficiente para desocuparem a Assembleia: eles querem a retirada do projeto por parte do governo estadual, que foi quem o enviou ao Legislativo.
Os secundaristas também são contrários ao projeto 190/2015, de autoria do deputado Marcel Van Hattem (PP), que criaria o programa Escola Sem Partido, visando acabar com discussões ideológicas e políticas nas escolas estaduais. Segundo os deputados, a proposta não está prevista para ser apreciada na CCJ.
Na reunião com os deputados, estudantes destacaram a importância do diálogo com o governador José Ivo Sartori (PMDB). “Queremos dar um recado para o Sartori de que não vamos desocupar como ele quer, vemos que propostas enviadas por ele são para nos enrolar.
Queremos dizer que não estão negociando com crianças, mas com secundaristas que estão fazendo história do Estado”, destacou Isabela Luzardo, da escola Carlos Chagas, de Canoas, e vice-presidente da União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes) na região sul.
Os estudantes devem realizar ainda na noite desta segunda-feira uma assembleia interna para discutir o tempo que a ocupação irá durar e articular como será feito o recebimento de alimentos e suprimentos em geral. Eles já fazem o controle da porta principal da Assembleia, seguindo o modelo estabelecido nas escolas ocupadas que exige a apresentação de documentos por parte de quem quer entrar.
A segurança da Casa, que não se mostrou satisfeita com a situação, montou um gradil após o saguão, dividindo a ocupação da parte interna da AL e impedindo os secundaristas de acessarem o resto do prédio, incluindo o restaurante. Até por volta das 19h30, quem não estava ligado aos estudantes está entrando pela garagem e apoiadores eram bem-vindos mediante identificação.
A partir desse horário, porém, por ordens da presidência da Casa, a entrada foi bloqueada pela Polícia Militar. Cinco a seis policiais se posicionavam em frente à porta principal, enquanto apoiadores e familiares que não sabiam que seriam barrados chegavam e se deparavam com o impedimento. Após negociações, a Brigada e a segurança da Assembleia permitiram que alimentos e bebidas fossem entregues aos estudantes pela saída da garagem. Por volta das 21h30, apoiadores começaram a montar um acampamento “paralelo” do lado de fora, enquanto os estudantes relatavam que o ar condicionado dentro do saguão estava marcando 14 graus, deixando-os com frio.
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RS. Estudantes ocupam Assembleia Legislativa pedindo retirada de projetos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU