Por: Jonas | 10 Março 2016
Jorge Mario Bergoglio (foto) foi um homem de poder durante a maior parte de sua vida. Desde quando era professor, antes de ser ordenado sacerdote, até os dias de hoje na Cátedra de Pedro. Como se sabe, ocupou altos cargos acadêmicos, foi pároco, Provincial dos jesuítas, bispo auxiliar, arcebispo e cardeal primaz. Em outras oportunidades, exerceu poderes relevantes, ainda que de maneira transitória: Presidente do Episcopado argentino e figura central e estratégica na Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, reunida em Aparecida (Brasil). Em certos momentos, como ele mesmo reconhece, exerceu o poder de forma autoritária, ainda que depois tenha feito um exame de consciência, uma autocrítica, e mudou de atitude. Não só isso. Pelas próprias responsabilidades que assume, teve e tem relação com um grande número de pessoas de poder, dentro e fora da Igreja, e pelo serviço e o ministério que desempenha, funciona como uma espécie de “ímã” para outros poderes e poderosos do mundo, que sentem a necessidade de se encontrar com ele no Vaticano ou durante suas viagens.
Fonte: http://goo.gl/j3sK0r |
A reportagem é de Luis Badilla, publicada por Tierras de América, 04-03-2016. A tradução é do Cepat.
Vale dizer que J. M. Bergoglio sabe perfeitamente o que é o poder, e provavelmente disto nasce sua atitude crítica e prudente frente a qualquer forma de poder. Conhece muito bem o valor que tem quando é exercido como serviço e doação, mas conhece também todos os vícios insidiosos para os quais esse poder, na maioria dos casos, arrasta aqueles que possuem títulos, legitimidade e funções de governo sobre outras pessoas. Na tentativa de decifrar ao menos em parte o “código Bergoglio”, é preciso considerar detalhadamente esse aspecto de sua personalidade, e por isso solicitamos a ajuda de um jesuíta argentino, professor universitário. “Ele não só conhece o poder. Como o exerceu também em circunstâncias difíceis e dramáticas. É muito consciente da natureza, função e utilidade do poder. Sabe perfeitamente que as sociedades, os povos e as nações não podem prescindir do poder que em si é legítimo, é necessário como instrumento de governo a serviço do bem comum. Sabe, além disso, que o poder se legitima tanto em sua origem como em seu exercício; mais ainda, sobretudo em seu exercício. Ele sempre refletiu muito sobre os poderes que na história do homem nasceram sendo legítimos e, depois, perderam sua legitimidade no exercício”. “Uma visão como esta – esclarece outro interpelado – tem sentido e resulta compreensível somente se na base há uma concepção segundo a qual o poder é percebido, sentido e assumido como serviço”.
“A luta pelo poder dentro da Igreja – enfatizou o Papa Francisco comentando o Evangelho de São Marcos (9, 30-37) – não é questão dos dias atuais, né? Começou ali, com Jesus”. Enquanto o Senhor falava da Paixão, os discípulos estavam discutindo qual deles era mais importante e se merecia “a porção maior”, que o Papa comparou com uma torta para repartir. Porém, na Igreja não deve ser assim. O Santo Padre confirmou isto citando outra passagem do Evangelho de Mateus (20, 25-26), na qual Jesus explica a seus discípulos qual é o verdadeiro sentido de poder: “Vocês sabem que os chefes dos povos os tiranizam e que os poderosos os oprimem. Entre vocês não deve ser assim”. “Esta é a chave, entre nós não deve ser assim”, afirmou o Bispo de Roma. Portanto, na ótica do Evangelho, “a luta pelo poder dentro da Igreja não deve existir. Ou, caso queiramos, pode haver uma luta pelo verdadeiro poder, o que Ele, com seu exemplo, nos ensinou: o poder do serviço. O verdadeiro poder é o serviço. Assim como Ele fez. Não veio para ser servido, mas sim para servir. E seu serviço foi exatamente o serviço da cruz: rebaixou-se até a morte, e morte de cruz, por nós, para nos servir, para nos salvar” (Observatorio Romano, Santa Marta, homilia de 21 de maio de 2013).
Um amigo do Papa Francisco nos comenta: “Olhem, nessas palavras que acabam de recordar está contido, não diria o Papa Bergoglio, não, está contida a concepção cristã do poder. E isso é o importante. Contudo, recordem que Francisco destaca algo a mais, que tem uma grande relevância, ainda que seja difícil de entender. Disse: ‘Para o cristão ir adiante, progredir, significa se rebaixar. Se não aprendemos esta regra cristã, nunca poderemos entender a verdadeira mensagem cristã sobre o poder’ (...). Santo Inácio nos Exercícios Espirituais ‘nos faz pedir ao Senhor crucificado a graça da humilhação: Senhor quero ser humilhado para me parecer mais com você. Isso é o amor , é o poder do serviço na Igreja, e se serve melhor aos demais pelo caminho de Jesus’”. Para J. M. Bergoglio qualquer poder, pequeno ou grande, sempre está cercado e ameaçado por uma insídia destrutiva: a corrupção, que procura se infiltrar em todas as partes, incluindo a Igreja.
Tempos atrás, em janeiro de 2015, quando o Papa Francisco estava retornando de Manila, contou que sendo arcebispo de Buenos Aires em certa oportunidade tentaram corrompê-lo. Não é por acaso que em seu discurso no V Congresso Nacional da Igreja Italiana Francisco tenha dito: “A humildade, a abnegação, a felicidade: estes são os três traços que hoje quero apresentar para meditar sobre o humanismo cristão que nasce da humanidade do Filho de Deus. E esses traços também dizem algo à Igreja italiana que hoje se reúne para caminhar juntos em um exemplo de colegialidade. Esses traços nos dizem que não devemos nos obcecar com o ‘poder’, inclusive quando assume a aparência de um poder útil e funcional para a imagem social da Igreja. Se a Igreja não assume os sentimentos de Jesus, fica desorientada, perde o seu sentido. Ao contrário, se os assume, sabe estar à altura de sua missão. Os sentimentos de Jesus nos dizem que uma Igreja que só pensasse em si mesma e em seus interesses, seria triste. As Bem-Aventuranças, por último, são o espelho onde temos que nos olhar, que nos permite saber se estamos no caminho correto: é um espelho que não mente. Uma Igreja que tem estas três características – a humildade, a abnegação, a felicidade – é uma Igreja que reconhece a ação do Senhor no mundo, na cultura, na vida cotidiana das pessoas. Já disse mais de uma vez e repito hoje: Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e suja por ter ido à rua, que uma Igreja enferma por estar fechada e pela comodidade de se apegar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada em ser o centro e que acaba presa a um emaranhado de obsessões e procedimentos” (Evangelii Gaudium, 49).
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O poder segundo Bergoglio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU