Por: MpvM | 17 Julho 2020
"Neste domingo meditamos mais três parábolas: o joio, o grão de mostarda, e o fermento. Jesus está num ambiente da natureza, sentado à beira do Mar da Galileia, utilizando elementos da Terra Mãe, relatos que brotavam de fatos rurais, para semear a Boa Notícia nos corações. A dinâmica desse modo de ensino é libertadora, realizadora do humano, porque interpela o ouvinte a tomar uma decisão, se posicionar e dar uma resposta que se comprometa com a busca do que verdadeiramente dignifica a existência humana e que nos faz avançar a um novo patamar de humanização."
A reflexão é de Aparecida Maria de Vasconcelos, teóloga leiga. Ela possui doutorado em teologia sistemática (2015), mestrado em teologia sistemática (2009) e graduação em teologia (2006) pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia - FAJE, Belo Horizonte/MG. É professora na FAJE e Editora Adjunta do periódico Perspectiva Teológica (publicação do Programa de Pós-Graduação em Teologia - FAJE). É pesquisadora do Grupo de Estudos em Cristologia e do Grupo Filosofia, Mística e Estética - FAJE.
Leituras do dia
1ª leitura - Sb 12,13.16-19
Sl 85, 5-6.9-10.15-16ª
2ª leitura: Rm 8,26-27
Mt 13, 24-43
Amigos, irmãos em Cristo, que a paz esteja em vossos corações!
As leituras deste 16°domingo do tempo comum mostram que a lógica de Deus não é a nossa. Elas destacam contrastes, desproporções, cenas que se movem em torno de algo escandaloso, efeitos de choque, mas na verdade querem mostrar uma nova imagem de Deus: paciente, rico em graça e fidelidade (1ª leitura - Sb 12,13.16-19; Sl 85, 5-6.9-10.15-16ª), que tem uma atitude construtiva de tolerância, respeito pelos tempos, pelas etapas de crescimento, amadurecimento de seus filhos, que, por sua vez, são chamados a viver a vida de um modo diferente do usual; aguçando o espírito crítico das suas condutas, que devem conduzir a uma renovação da própria vida e da sociedade (mensagem do Evangelho).
No capítulo 13 de São Mateus encontramos 7 parábolas. Este conjunto está centrado em torno do conhecimento do Reino dos céus, tema fundamental da pregação de Jesus, e nos ajuda a interpretar as suas ações e como que este reino acontece. Esta expressão, um tanto quanto distante e estranha para nós, fala da casa de Deus que é o Universo, pois seu reino extrapola as fronteiras físicas e geográficas, fala da proximidade solidária de Deus para com os seres humanos, mas também como instância crítica frente a eles, à cultura e à sociedade. A vida de Jesus, suas palavras e gestos poderosos, falam do reino. Como dizia um notável teólogo: Jesus é “parábola viva de Deus” (Edward Schillebeeckx).
No evangelho do domingo passado meditamos a parábola do semeador. O Papa Francisco disse “que esta parábola é a mãe de todas porque fala de ouvir a palavra. Lembra-nos que a palavra de Deus é semente que em si mesma é fecunda e eficaz. Deus a espalha por toda a parte com generosidade independentemente do desperdício” (Oração do Angelus – 12.07.2020). Independente de diversas circunstâncias que podem prejudicar o crescimento da semente, a ação do “Agricultor divino” faz as coisas acontecerem, muitas vezes de um modo que não esperávamos.
Neste domingo meditamos mais três parábolas: o joio, o grão de mostarda, e o fermento. Jesus sentado à beira do Mar da Galileia, utilizando elementos da Terra Mãe, relatos que brotavam de fatos rurais, para semear a Boa Notícia nos corações. A dinâmica desse ensino é libertadora, realizadora do humano, porque interpela o ouvinte a tomar uma decisão, se posicionar e dar uma resposta que se comprometa com a busca do que verdadeiramente dignifica a existência humana e que nos faz avançar a um novo patamar de humanização.
O joio é uma planta cuja espécie é conhecida pelos frutos infestados por fungos, que evidentemente prejudicam as plantações. Ao refletir, orar e contemplar a parábola do “joio e do trigo”, inicialmente, nos deparamos com a atitude contraditória do proprietário do terreno. Ele não deixou os seus servos limparem a plantação arrancando o joio, e ainda acrescenta que o joio e o trigo “devem crescer juntos até a colheita”. (Mt 13,30). Se a planta é nociva por que não arrancá-la? Os exegetas dizem que essas palavras de Jesus, que parecem ir contra o senso comum, se referem, primeiramente, a sua práxis de vida que acolhia os diferentes; também, à própria comunidade de Mateus que tinha a tendência de separar os bons discípulos dos que não eram.
A partir dessa constatação podemos perceber a importância da convivência com o “diferente”, tanto com aquela pessoa que nos incomoda profundamente e que temos vontade de distanciarmos de imediato, quanto com aquelas questões internas que temos que são tão difíceis de serem encaradas e aceitas. Com certeza, essa capacidade de acolhermos o diferente tanto em nós quanto no outro, só nos fará avançar no nosso processo de humanização. O curioso é que o esforço para vivenciar o desafio da convivência com o diferente vai desencadear o potencial criativo que carregamos em nosso interior. Assim, vamos nos deparando com uma nova práxis que somos capazes de gestar e praticar. Quão gratificante é a convivência com aquilo que, a priori, nos causa um sentimento de repugnância, de aversão!
As parábolas seguintes, do grão de mostarda e do fermento (Mt 13, 31-33) têm a mesma dinâmica, a desproporção: a semente insignificante que quando cresce torna-se uma árvore frondosa; o fermento que faz crescer a massa. Às vezes, de onde não se espera, dos “pequenos “e “insignificantes” aos olhos do mundo pode sair algo transformador.
Trazendo essa reflexão para a atual situação que o mundo vive e que está afetando a todos, a pandemia do coronavirus. Faz-se notório constatar que, junto ao “caos covídico”, o amor e a solidariedade deixam seus rastros indeléveis. Por um lado, a constatação que somos seres finitos, frágeis, impotentes e necessitados da transcendência.
Por outro, as ações solidárias carregam a energia da esperança de uma humanidade que se vê lançada a um novo patamar de sua evolução e a conduz a repensar os seus valores, o seu verdadeiro bem-estar. O ser humano que, com seu extraordinário potencial criativo, tem a chance de poder re-escrever a história de maneira diferente; o testemunho de diferentes profissionais que trabalham genuinamente para a sobrevivência de outros. Essas ações de fraternidade também carregam um grito de denúncia contra um sistema político e econômico que busca os privilégios de poucos.
Tenhamos a convicção que em meio a tanta dor e incertezas, como diz a segunda leitura da Carta aos Romanos, (8,26-27), o Espírito Santo vem em socorro a nossa fraqueza, e nos faz conhecer que “Deus é novo a cada momento”, é “uma surpresa constante”, “totalmente Outro” e “totalmente próximo”, um Deus humanissimus”, “Fonte constante de novas possibilidades”.
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16° domingo do tempo comum - Ano A - Deus é rico em graça e fidelidade - Instituto Humanitas Unisinos - IHU