01 Março 2019
"Jesus pede uma atitude criativa, que nos torna capazes de ir ao encontro do outro sem julgar, sem preconceitos e sem justificativas, aceitar o outro/a como irmão/ã. E só a partir de uma atitude criativa de respeito, de confiança, podemos colaborar e aprender. Seguir a Jesus em comunidade, na família, no trabalho é um desafio que exige humildade e não uma imposição de uma única verdade."
A reflexão é de Ana Maria Formoso, mcr, religiosa da Comunidade Missionária de Cristo Ressuscitado - MCR. Ela possui graduação em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1999), mestrado em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS (2005) e doutorado em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos (2013). Atualmente é professora na Faculdade de Teologia da Pontificia Universidad de Valparaíso/Chile.
Referências bíblicas
1ª Leitura: Eclo 27,5-8
Salmo: Sl 91(92)
2ª Leitura: 1Cor 15,54-58
Evangelho: Lc 6,39-45
O Evangelho de hoje nos apresenta trechos do que Jesus falou na planície após um tempo intenso de oração (Lc 6:12). Lucas, imitando Mateus, reúne este Evangelho no espaço que se chama Sermão da Planície.
Hoje a Palavra de Deus nos apresenta algumas dimensões do seguimento de Jesus. Na realidade, neste tempo litúrgico chamado "tempo Comum", domingo a domingo nos preparamos para seguir a Jesus no cotidiano da vida. Agradeçamos que na Palavra encontramos diferentes aspectos que nos ajudam a crescer na vida cristã.
Iniciamos com a primeira leitura (Eclo 27,5-8), na qual vamos recolher da tradição do Eclesiástico alguns tópicos da sabedoria do povo, onde vamos ficar com um aspecto da leitura. Literalmente a Palavra de Deus diz: O fruto revela como foi cultivada a árvore, assim como a palavra mostra o coração do homem.
Podemos dizer que a primeira leitura nos centra em cuidar, o que se cultiva dentro, o que se vai preparando, cultivando e depois se expressa. Sem cair em um intimismo, podemos dizer que a primeira leitura nos faz um chamado de atenção para cuidar o que se passa dentro de nós, pois somos uma unidade. Também a expressão da palavra expressa uma vida, uma atitude, uma postura diante da vida e da realidade.
Assim como a leitura faz uma comparação do processo de cultivar uma árvore com a palavra, nós fazemos hoje uma comparação que nos interpela: sabemos que o que aconteceu em Brumadinho não foi acidente, foi preparado, pensado, aqui está a questão. A preparação pode ser geradora de vida ou pode ser geradora de morte, por isso o chamado ao discernimento de cuidar as atitudes, a postura de vida em sentido amplo. Não existe uma vida cristã que não integre a dimensão do cuidado interior que é onde se gesta a vida e não tem nada a ver com o intimismo. A sabedoria é trazida pela sabedoria do povo do Eclesiástico e, hoje, pela sabedoria do povo de Brumadinho, que continua ecoando, profetizando no meio da morte.
O salmo (Sl 91) nos convida a agradecer, por isso, em comunidade, fazendo parte de uma Igreja que escuta a palavra, ecoamos nosso agradecimento junto com o salmista: Como é bom agradecermos ao Senhor e assim continuamos escutando sua Palavra no Evangelho.
No Evangelho de Lucas (Lc 6,39-45) temos uma parábola conhecida também na tradição do povo e hoje a escutamos como uma dimensão do seguimento de Jesus. Em Lucas 6,39, no contexto do evangelho de Lucas, esta parábola é orientada aos animadores das comunidades que foram considerados proprietários da verdade, superiores aos outros. Portanto, eles são guias cegos.
A parábola é do cego guiando os outros cegos. Jesus conta uma parábola aos seus discípulos: "Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois num buraco?"
Essa parábola tem muita semelhança com o que nos coloca o Evangelho de Mateus, são dirigidas aos fariseus: "Ai de você cego" (Mt 23,16.17.19.24.26). Vejam que os dois Evangelistas estão chamando a atenção para o abuso do poder, a imposição de uma única verdade. Podemos dizer que, para a correção, é necessário realizar processos e, sobretudo, o que o Evangelho hoje nos chama a atenção é para capacidade de se cultivar, de fazer uma autocrítica. Também faz perceber que a correção deve ser feita com cuidado, favorecendo para que a pessoa possa questionar-se a partir do exemplo, da sabedoria. Quantas vezes nos espaços da Igreja a correção ofende as pessoas, afastando-as da Igreja. Hoje o Evangelho coloca outra atitude, que é parte da dinâmica do seguimento e de formação de grupos cristãos. Muitas vezes se necessita da correção, mas o Evangelho fala de um estilo de vida, de um processo, de uma atitude educativa e não de uma imposição.
O caminho do discipulado necessita da identificação com um estilo de vida, requer uma identificação com um estilo de vida. Um professor ou professora deixa marca na vida das pessoas, mas Jesus, como bom Mestre, dá liberdade para que o discípulo ou a discípula possa fazer sua autocrítica, seu processo e fazer caminhos de identificação com um estilo de vida crítico, agudo mas cuidadoso, no sentido de não ferir a vida.
Vamos ficando com a ideia principal da parábola do Cego guiando a outro cego. Aqui Jesus pede uma atitude criativa, que nos torna capazes de ir ao encontro do outro sem julgar, sem preconceitos e sem justificativas, aceitar o outro/a como irmão/ã. E só a partir de uma atitude criativa de respeito, de confiança, podemos colaborar e aprender. Seguir a Jesus em comunidade, na família, no trabalho é um desafio que exige humildade e não uma imposição de uma única verdade. Misteriosamente, o cisco no olho do próximo, a sua imperfeição pode nos incomodar, a tal ponto que nos sentimos impelidos a chamar-lhe a atenção. Sejamos cuidadosos/as na correção fraterna.
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8º domingo do Tempo Comum - Ano C - Correção fraterna e confiança mútua - Instituto Humanitas Unisinos - IHU