10 Setembro 2006
Por quanto tempo mais a Volks conseguirá manter uma estrutura obsoleta como a fábrica de São Bernardo do Campo, concebida em outra era da indústria automobilística mundial? A pergunta é da revista Exame, nas bancas nessa semana. Segundo a revista, dirigida ao segmento empresarial, a polêmica entre o governo e a Volkswagen sobre as demissões é inócua. Para a revista, a dura realidade é que não é mais possível manter fábricas pouco competitivas.
A revista afirma que com quase meio século de existência, a fábrica da Volkswagen no ABC paulista produz bem menos que as unidades mais modernas do país.
Para esclarecer a sua afirmação destaca que a VW de São Bernardo do Campo (SP), fundada em 1957, tem uma produção anual 32 carros por funcionário, enquanto as sua congêneres como VW de São José dos Pinhais (PR), fundada em 1999, produz 54 carros por funcionário. Um caso ainda maior de produtividade é a Ford de Camaçari (BA), fundada em 2001, que produz 84 por empregado, ou ainda GM de Gravataí (RS), fundada em 2000, que produz 81 automóveis por funcionário.
Na análise da revista, a indústria automobilística está diante da ditadura da produtividade. Segundo a revista, é o que vem ocorrendo mundialmente no setor. As montadoras deslocam cada vez mais a produção para regiões em que o custo de produção é menor e a produtividade maior, como o Leste da Europa e a China. Pior para cidades como Detroit, nos Estados Unidos, ou Turim, na Itália, que deixaram para trás os dias de glória como centros de produção automobilística e hoje precisam se reinventar.
Também no Brasil - afirma a revista - ocorre um processo semelhante. Diante de custos elevados de produção no ABC, as empresas investiram em novas unidades no interior de São Paulo ou em outros estados - a Honda e a Toyota estão próximas de Campinas, a GM foi para Gravataí, no Rio Grande do Sul, e a própria VW tem uma fábrica em São José dos Pinhais, no Paraná. São unidades muito mais modernas que a fábrica da Volkswagen no ABC - e mais enxutas.
A Volks emprega mais de 12 000 pessoas em São Bernardo do Campo, diz a revista. A nova unidade da Ford, erguida em Camaçari, na Bahia, conta com apenas 3 500 funcionários. Foi graças à nova concepção de produção de sua unidade baiana que a Ford conseguiu pôr fim a uma seqüência de prejuízos no Brasil. Camaçari trabalha hoje em três turnos e já foi citada por Bill Ford, o presidente do conselho de administração da montadora americana, como uma referência mundial de produtividade no grupo.
Há anos, continua a revsita, a Volks tem evitado o enorme custo político e social de reduzir sua unidade do ABC a níveis compatíveis com o mercado. Ainda que tenham ocorrido reestruturações, a estrutura da fábrica é pesadíssima. Cerca de um terço dos funcionários da unidade trabalha em áreas administrativas. O complexo abriga o que existe de mais atrasado e de mais moderno na empresa. Num extremo, a montagem da eterna Kombi é artesanal. No outro, a linha de produção do sedã Polo e do Fox Europa é atualíssima, com 400 robôs instalados ao custo de 2 bilhões de reais. Esse lado moderno, porém, não consegue se impor. Por ser uma senhora cinqüentenária, a fábrica, que fica à margem da rodovia Anchieta, exibe marcas do tempo das quais não consegue se livrar.
Os prédios são enormes e a produção é espalhada. Peças têm de ser transportadas por tratores de um lado para o outro - o que resulta em desperdício de tempo, equipamento e pessoal. Numa fábrica moderna, os espaços são compactos e tudo está próximo do processo final. A esse quadro se soma outra marca do tempo: o custo da mão-de-obra elevado ao longo de décadas de ação sindical. A média salarial em São Bernardo, de 3 200 reais por mês, é 128% superior à das fábricas das montadoras em outros estados.
A participação da Volks no mercado brasileiro está em torno da metade do que já foi nos tempos áureos. A linha de produtos está entre as menos rentáveis - seu carro-chefe, o Gol, ainda é o mais vendido do país, mas ele não rende mais de 500 reais de lucro por unidade, segundo especialistas. A faixa mais atraente do mercado, os carros médios, cujos lucros chegam a 15 000 reais por unidade, é dominada pelas japonesas Honda e Toyota.
Recentemente, a Volks tomou algum fôlego com o aumento de suas exportações - tornou-se a maior exportadora de carros do país em 2005. Mas, desde o ano passado, a valorização do real comprometeu a rentabilidade nas vendas ao exterior. Os cortes anunciados agora se concentram exatamente nas linhas de produção destinadas ao mercado internacional - a idéia é, já em 2007, diminuir em 100 000 unidades o volume exportado em comparação com 2005. Diante dessa perspectiva, fazer o que precisa ser feito em São Bernardo do Campo deve ser apenas uma questão de tempo - e não há nada que governos, mesmo os mais bem - intencionados, possam fazer a respeito, conclui a revista Exame.
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Caso Volks expõe a ditadura da produtividade - Instituto Humanitas Unisinos - IHU