11 Agosto 2011
Que "A Árvore da Vida" é um filme magistral parece não haver dúvida.
Mais: é a obra-prima que Terrence Malick sempre prometeu e, por algum motivo, sempre lhe escapou.
Ou por outra: talvez lhe tenha escapado porque a seus filmes anteriores, ainda que admiráveis, faltava, no fundo, a grandeza e a ambição deste. Ambição quase desmedida: captar a dor humana a partir de sua nascente.
E qual é essa nascente? A primeira explosão, de que surgem os elementos? A saída dos seres da água para a terra? O amor a Deus e todos os rigores que ele impõe, tal como dá a conhecer o "Livro de Jó"? Ser filho? Ser pai?
O comentário é de Inácio Araujo, crítico de cinema, e publicado pelo jornal Folha de S. Paulo, 12-08-2011.
Tudo isso, talvez, e mais aquilo que de certa forma reproduz tudo isso: a família. A família O`Brien, no caso. Com seu pai (Brad Pitt), o severo engenheiro militar que um dia quis ser músico e trata seus filhos com rigor militar.
Existe, é claro, a mãe bondosa (Jessica Chastain). Mas o que pode uma mãe frente a um pai inflexível?
A dor está estampada no rosto de seus filhos. Do mais velho, em especial. Mas o que pode pretender um pai a não ser criar os filhos dentro daquilo que acredita justo? Será o destino do pai o mesmo de Deus, que precisa infligir a Jó castigos amargos?
Ou será, afinal, que o filho sente de forma exagerada qualquer palavra paterna - essa palavra que é lei, que ordena o mundo? E o que pode o filho, em face de uma força tão desmedida, senão desejar com todas as forças a morte do pai?
MORTE
Essas questões passam pela cabeça de todo espectador deste filme, até porque nos são, de fato, endereçadas.
E parece que também pela cabeça do filho (Sean Penn), agora adulto e melancólico: por que devemos ferir aos que mais amamos? É certo que, em meio a tudo isso, existe ainda a morte de um dos filhos. A maior de todas as dores, que o pai só consegue expressar, lembrando, perplexo, que, bom fiel, toda semana doou seu dízimo à paróquia.
Ou, pior, lamentando ter censurado a maneira como o menino virava as páginas da pauta musical...
A dor das dores se expressa com mais força ali onde a importância parece tão ínfima. Porque a pauta é o irreparável, o tempo que não pode voltar, o gesto incorrigível: a dureza paterna que se manifestou onde devia exigir apenas ternura.
Essas questões, e outras, que "A Árvore da Vida" nos traz não existiriam sem a ambição e a ousadia formal de Terrence Malick. Não se trata de uma saga familiar. Trata-se da família. Do laço mais profundo, aquele que nos constitui.
Malick não conta uma história tradicional, linear. São instante. Fragmentos. Ou antes, estilhaços de vida que se projetam no tempo, que podem atravessar gerações.
É a delicada trama através da qual nos tocamos, nos ferimos e nos amamos.
Filme que se esquiva diante da cronologia, "A Árvore da Vida" pode estar em 1950 ou em 2000 ou no dia da criação: o tempo da origem, como o da fé e o dos afetos, a rigor não existe.
Esse filme suave como a imagem materna dispensa maior erudição ou esforço intelectual para ser compreendido: ter uma alma já basta.
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Malick capta a dor humana em novo filme - Instituto Humanitas Unisinos - IHU