23 Outubro 2012
Em 1974, o compositor John Landau alcançou a imortalidade depois de participar de uma apresentação no Harvard Square Theatre de um então obscuro artista de Nova Jersey e declarar: "Eu vi o futuro do rock and roll, e o seu nome é Bruce Springsteen". Em uma linha semelhante, deixe-me dizer aqui e agora: "Eu vi o futuro da Nova Evangelização, e o seu nome é a Universidade Católica Ucraniana". Se esse lugar, no fim, ficar conhecido como "o Chefe" da evangelização católica, lembre-se que você leu aqui primeiro.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada no sítio do jornal National Catholic Reporter, 22-10-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Localizada em Lviv, na Ucrânia ocidental, a universidade faz parte do renascimento da Igreja greco-católica depois da queda do império soviético, quando ela era o maior órgão religioso ilegal do mundo. Sendo a maior das 22 Igrejas orientais em comunhão com Roma, ela tem mais de 3 milhões de seguidores na Ucrânia e cerca de 5,5 milhões em todo o mundo.
Restabelecida em 1994, com um corpo discente hoje de cerca de 1.600 estudantes, essa é a única universidade católica na antiga esfera soviética. Como eles gostam de dizer, é a única universidade católica "entre a Polônia e o Japão".
Seu ousado objetivo é nada menos do que "repensar" o que uma universidade católica pode ser no século XXI.
Eu estive na universidade no último fim de semana para uma rodada de palestras, e no sábado eu me sentei com o bispo Borys Gudziak, reitor e força motriz da universidade (Gudziak, 51 anos, foi recentemente nomeado Exarca Apostólico da França, mas continuará desempenhando o seu papel aqui). Ele explicou que, durante um processo de reflexão no início dos anos 1990, os planejadores identificaram dois desafios centrais:
• Construir a partir do legado dos mártires ucranianos durante o período de opressão soviética, quando a Igreja greco-católica era a mais importante fonte de oposição social. Nenhum país produziu mais mártires no século XX, e o objetivo da universidade, disse Gudziak, é ser pioneira de "uma nova síntese social, intelectual e teológica" dessa experiência – uma teologia, por assim dizer, nascida das catacumbas.
• Reparar um déficit de confiança social, comentou Gudziak, porque "a alma e a psique ucranianas ficaram profundamente marcadas" pelo período soviético, em que "o sistema matou sistematicamente". Nesse ambiente, disse, os ucranianos eram ensinados desde pequenos a "pensar uma coisa, dizer outra e fazer uma terceira", e assim eles aprenderam a usar máscaras, a se esconder e a nunca mais confiar em ninguém.
A resposta tem sido tão aguda quanto o diagnóstico.
No que diz respeito aos mártires, Gudziak acredita que uma síntese teológica do seu sofrimento tem menos a ver com a teoria doutrinal do que com um "estilo eclesiástico", que ele descreveu em termos de "humildade" e de "estar perto das pessoas".
"Quando os tempos são difíceis, você está nu e é forçado a olhar para o essencial", disse. "Você se volta às experiências cristãs básicas de estar juntos, de apoiar uns aos outros, de rezar juntos e de ser comunidade, superando a negação do evangelho sem qualquer pretensão ou imposição".
Gudziak acredita que esse estilo é uma "presença tangível" no catolicismo grego, e não só por causa dos mártires e dos gulags.
"A nossa relação entre o clero e os leigos também está condicionada pelo fato de que os nossos padres são casados com leigas, e eles têm filhos leigos em casa", afirmou.
Essa combinação de fatores, sugeriu Gudziak, permite que a universidade seja um lugar onde uma Igreja que valoriza a humildade e a proximidade com o povo, e que leva a sério o papel dos leigos se torne autorreflexiva.
Quanto ao déficit de confiança, a resposta tem sido ainda mais inovadora. Para ajudar as pessoas a aprender a tirar as suas máscaras, a universidade se voltou para as intuições de Henri Nouwen, Jean Vanier e do movimento L'Arche, convidando as pessoas com deficiência mental a se tornarem parte da sua comunidade (Gudziak estudou com Nouwen em Harvard).
Na Universidade Católica Ucraniana, as pessoas com deficiência mental realmente atuam como "professores de relações humanas".
"Isso não é um tipo de propaganda", insiste Gudziak. "Nós precisamos dos dons que eles têm. Eles não se importam se você é reitor, médico ou o quão rico você é. O que eles nos forçam a enfrentar é a questão pedagógica mais importante de todas: você pode me amar?"
As novas residências incluem apartamentos para esses "professores de relações humanas" para que vivam entre os estudantes da universidade, tornando-se parte do tecido diário das suas vidas.
Eu perguntei a Gudziak se essa experiência realmente ajudou a tornar a universidade um lugar mais amoroso.
"É como quando você coloca uma dose de rum em alguns biscoitos de chocolate", disse. "Tem um sabor diferente, e se você conhece o rum você vai reconhecê-lo". Da mesma forma, afirmou, se você conhece o amor, você vai senti-lo nas relações que essas pessoas ajudaram a forjar.
Tudo isso seria notável em qualquer circunstância, e a visão exerce uma poderosa atração gravitacional. Coordenadores com doutorados em lugares como Oxford e Harvard ganham um salário que gira em torno de 9.000 dólares por ano, o que evidentemente vale muito mais em Lviv do que em Nova York ou Roma – mas, sejamos francos, nem tanto.
No contexto da Ucrânia atual, no entanto, esse lugar é nada menos do que um milagre.
A liderança política do país está à deriva em direção ao antigo autoritarismo. Embora existam cerca de 170 universidades na Ucrânia, a maioria delas são fortemente dependentes do financiamento estatal, e isso tende a sufocar a dissidência. Observadores dizem que apenas um punhado delas fomentam um clima em que a sociedade civil possa encontrar a sua voz sobre questões como a corrupção e o Estado de direito, e a Universidade Católica talvez seja o exemplo mais visível.
Eles pagaram um preço por isso. Alguns anos atrás, Gudziak recebeu uma estremecedora visita dos agentes de segurança ucranianos, afirmando que os seus alunos não deveriam protestar contra uma visita a Lviv do presidente Viktor Yanukovych, uma figura pró-Rússia que muitos ucranianos veem como alguém comprometido com Moscou e com os oligarcas do seu país. Em vez de acatar, Gudziak publicou um memorando descrevendo o encontro e delineando uma campanha mais ampla de assédio (incluindo "grampear" seus telefones), o que despertou o apoio à universidade de diplomatas, ONGs e de uma ampla gama dos intelectuais e ativistas ucranianos.
Agora, a universidade está enfrentando uma nova rodada de pressão, com questionamentos dos funcionários do governo sobre o seu credenciamento. Mais uma vez, todos os sinais são de que a universidade não tem nenhuma intenção de se deixar ser amordaçada, acreditando que o caminho para a democracia e para uma sociedade aberta não vai nessa direção.
Eu vim para a Ucrânia neste fim de semana pensando que eu estava dando um tempo ao Sínodo dos Bispos sobre a Nova Evangelização, onde o foco está na revitalização das energias missionárias da Igreja no século XXI. Voltei a Roma acreditando, ao contrário, que eu tinha visto a Nova Evangelização em ação – um lugar profunda e palpavelmente católico, onde as raízes espirituais são profundas, voando sobre as asas dos mártires e das pessoas com deficiência mental, e que se engaja corajosamente nas questões do dia, até mesmo quando isso requer muita coragem.
A universidade atualmente tem um ambicioso plano de expansão, com as construções já em andamento. Ironicamente, as novas instalações estão localizadas em uma faixa de terra onde antes se encontrava um imenso centro cultural comunista, o que significa que uma visão da sociedade humana está literalmente sendo suplantada por outra, esta enraizada no pensamento e na vida católicos.
As pessoas que quiserem mais informações sobre a universidade podem encontrá-las aqui.
"Em uma era de globalização, estamos vendo os estragos do particularismo ideológico, nacional, étnico e confessional", disse Gudziak. "Alegramo-nos com a solidariedade que temos com Roma e com a Igreja em geral, essa comunidade global de seres humanos que lutam para viver plenamente a sua dignidade humana dada por Deus".
Francamente, todos nós da comunidade global temos sólidas razões para nos alegrarmos com o que está acontecendo em Lviv.
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O futuro da Nova Evangelização? O caso da Ucrânia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU