Por: André | 29 Junho 2012
Aumenta a tensão no Paraguai. Após a destituição do ex-presidente Fernando Lugo pelo Senado na sexta-feira passada, o temido banho de sangue que muitos pressentiam em Assunção não se produziu. Os escassos 5.000 manifestantes que se haviam reunido sob a vigilância de franco-atiradores na Praça do Congresso, voltaram para suas casas. Mas seus seguidores voltaram às ruas e se organizaram sob uma Frente Nacional para a Defesa da Democracia. O ex-bispo Fernando Lugo convocou 10 de seus ex-ministros para ativar uma espécie de Governo paralelo e no dia seguinte anunciou que irá percorrer o país para explicar como foi destituído.
A reportagem é de Francisco Peregil e está publicada no jornal espanhol El País, 27-06-2012. A tradução é do Cepat.
Enquanto isso, em Washington reuniu-se de forma extraordinária e durante quatro horas o Conselho Permanente da Organização de Estados Americanos (OEA) para estudar a possível adoção de medidas. Finalmente, o secretário-geral do organismo, José Miguel Insulza, anunciou que enviará uma missão especial ao Paraguai e outros países da região para avaliar a crise política e informar depois o Conselho Permanente do organismo para que tome medidas. O envio da missão foi proposto pelo representante de Honduras e presidente do Conselho Permanente, Leónidas Rosa Bautista, e obteve o apoio de 25 delegações, entre elas as dos Estados Unidos, Colômbia, México e Chile, mas não conseguiu o apoio da Nicarágua, Bolívia, Equador e Venezuela, que pediam a convocação imediata de uma Assembleia Geral extraordinária.
“Vou me preparar para informar a este Conselho Permanente sobre a situação no Paraguai, e vou também a outros países”, disse Insulza, mas não precisou se viajará pessoalmente ou enviará “uma delegação”, em uma visita que se dará “provavelmente no final desta semana”. O secretário geral expressou sua vontade e se reunir com o presidente destituído, Fernando Lugo, e com parlamentares do país para “tratar de ter uma avaliação do que aconteceu”. Insulza recordou que a convocação de uma Assembleia Geral, que poderia decidir inclusive a suspensão do Paraguai da OEA, como aconteceu com Honduras em 2009 após o golpe de Estado contra o presidente Manuel Zelaya, não pode ser feita sem uma missão ao país e um informe ao Conselho Permanente.
Durante a reunião, o representante permanente do Paraguai na OEA, Bernardino Hugo Saguier, defendeu Federico Franco como “legítimo presidente” do país e pediu aos Estados membros do organismo que evitem a “ingerência” nos assuntos internos desse país. O representante da Venezuela não OEA, Roy Chaderton, por sua vez, perguntou durante a sua intervenção à secretaria geral do organismo se a presença de Saguier na sessão “constitui um reconhecimento implícito da legalidade e legitimidade da representação” do Governo de Franco. “Nesse caso, estaríamos diante de um grave fato cuja natureza afetaria as próprias bases éticas normativas, políticas e jurídicas da OEA”, indicou.
O fantasma da guerra civil
A resistência dos partidários de Lugo começou na própria sexta-feira em frente à sede da Televisão Pública, na rua Alberdi, depois que um representante do novo Governo se apresentara ali para interromper a emissão. Os responsáveis pelo canal se negaram e o novo Governo cortou a energia elétrica. Logo mais, os trabalhadores da emissora conseguiram restabelecer a energia. Centenas de seguidores de Lugo foram chegando à sede do canal para expressar seu apoio e com um microfone tinham a oportunidade de se dirigirem a todo o país. Agora, cada manhã fica um pequeno núcleo em guarda e pela noite voltam a se reunir cada vez mais pessoas. Na segunda-feira, chegaram a ser 5.000. O novo Governo pretende administrar a situação com mais tato do que demonstrou na sexta-feira para evitar maiores conflitos.
Às organizações estudantis que iniciaram os protestos se juntaram camponeses procedentes de outras regiões. Cada noite tomam a palavra ex-ministros, professores, camponeses, crianças ou donas de casa. Enquanto as principais empresas de comunicação se mostraram favoráveis ao julgamento político que destituiu Lugo em 24 horas, o canal público converteu-se no único meio massivo pelo qual os partidários de Lugo podem se expressar. Além disso, criaram uma página na internet (http://paraguayresiste.com/) para divulgar o calendário de mobilizações.
“A resistência pacífica vai crescendo dia após dia”, vaticinou a este jornal Ricardo Canese, secretário geral da Frente Guazú, a organização pela qual Fernando Lugo concorreu às eleições. “Se uniram à Frente pela Defesa da Democracia 15 das 16 organizações camponesas do país. Faremos cortes intermitentes de rodovias, manifestações em praças públicas... E muito particularmente em frente à sede da Televisão Pública, onde houve já várias tentativas de censura. A resistência será permanente até que se restabeleça o Estado de direito”, acrescentou.
Os partidários de Federico Franco em Assunção, por sua vez, também começaram a se concentrar na praça do Congresso e convocaram para esta quarta-feira uma manifestação de apoio ao novo presidente. Franco declarou que sua prioridade neste momento é evitar a guerra civil.
A Associação Nacional de Carperos [como os sem-terra são chamados], que ocupou a fazenda Curuguaty onde ocorreu, no dia 15 de junho, a morte de seis policiais e 11 camponeses, começou nesta terça-feira a cortar várias rodovias. “Vamos bloquear os acessos à capital”, indicou seu dirigente maior, José Rodríguez, em conversa por telefone. “Os grandes meios de comunicação, que estão nas mãos da oligarquia, não ecoaram as manifestações no interior do país. Mas isto vai crescer. Caso não houver resposta, provavelmente vai se desencadear algo muito forte”, acrescentou Rodríguez. “A prioridade de Federico Franco não é evitar a guerra civil, mas manter-se no poder. Este homem sempre teve uma obsessão doentia, até psicótica, para ser presidente. Não lhe importa que haja violência, nem as repressões massivas que podem ocorrer”.
Embora os sem terra não integrem nenhuma das duas maiores organizações camponesas do país, nos últimos anos adquiriram muita relevância na mídia mediante as ocupações de fazendas. A oposição culpou Fernando Lugo de tolerá-los e apoiá-los até o momento em que aconteceu a morte de 15 de junho. Contudo, Rodríguez não acredita que os camponeses nem sua organização tenham sido especialmente bem tratados pelo Governo de Lugo. E acredita que essa é a razão pela qual no dia da destituição milhares de camponeses optaram por ficar em suas casas e não ir para Assunção para expressar seus protestos. “Os setores sociais mais carentes não receberam a atenção que esperavam por parte de Lugo. E há descontentamento em relação a ele. Muitas pessoas estão confusas, não querem sair de casa para colocar a sua vida em perigo por um Governo que não os defendeu. As pessoas medem qualquer decisão do Governo através do estômago e este Governo não se preocupou muito com o estômago das pessoas. Mas nós não defendemos Lugo, mas o processo democrático que se iniciou em 2008. À medida que as pessoas vão entendendo isso vão se somando aos protestos”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Milhares de pessoas apoiam a “resistência pacífica” de Fernando Lugo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU