Por: André | 17 Abril 2014
Em seu último livro, Decrescimento ou decadência, o jornalista Vincent Cheynet (foto) questiona a vontade de liberdade ilimitada que encontramos em nossas sociedades. La Vie, que não tem medo de nada, encontrou-o em Lyon, onde dirige o periódico mensal La Décroissance.
Fonte: http://bit.ly/1nqWY2l |
Vincent Cheynet, após ter trabalhado na publicidade, conheceu uma mudança radical de vida e fundou, em 1999, a associação e o jornal Casseurs de Pub. Este, em 2003, deu lugar ao La Décroissance, periódico independente por onde passa a maior parte dos objetores do crescimento.
A entrevista é de Mahaut Herrmann e publicada no sítio da revista francesa La Vie, 15-04-2014. A tradução é de André Langer.
Eis a entrevista.
De modo geral, o decrescimento é abordado do ponto de vista econômico. Em seu livro, você o trata do ponto de vista antropológico. Por quê?
Porque o decrescimento levanta, em primeiro lugar, um desafio antropológico... Os termos crescimento, desenvolvimento – embora “sustentável”... – liberalismo, liberal-libertário, progresso ou produtivismo, participam da mesma ideologia: a do ilimitado. O filósofo e psicanalista Cornelius Castoriadis (1922-1997) observava: “Nós entramos numa época sem limites em todos os campos (...), a sociedade capitalista hoje é uma sociedade que, na minha opinião, corre para o abismo de todos os pontos de vista, porque é uma sociedade que não sabe se autolimitar”.
Portanto, não afeta apenas o campo da economia, mas também o da cultura e dos costumes. O crescimento é um “fato total” que engloba todas as dimensões da nossa existência e da nossa sociedade. Nós nos encontramos em sociedades cujo fundamento é a repressão, a transgressão e a destruição de qualquer limite. Como recorda o filósofo Jean-Claude Michéa, o liberalismo econômico “de direita” e o liberalismo cultural “de esquerda” não se opõem, mas fazem parte do mesmo sistema. Eles são a mesma face de uma fita de Möbius (criada pelo matemático alemão Möbius em 1839, essa fita fechada não possui lados, ndlr). É em nome desses mesmos argumentos que são, por exemplo, reivindicados o trabalho no domingo e a liberalização do consumo de drogas. Ora, a condição humana, e da liberdade, é a integração do limite. A destruição da natureza é a consequência desta incapacidade de fixar limites. Junto com o desamparo social, que é sua consequência, abre caminho para fanáticos e integristas de todos os matizes.
Esta análise é compartilhada por todos os meios do decrescimento?
Não necessariamente. O decrescimento é um movimento muito diverso, para dizer pouco... Há também algumas pessoas que reivindicam o decrescimento que permanecem numa aproximação com a ecologia científica pura. Na minha opinião, elas não vão ao centro da questão. O decrescimento afirma que qualquer solução deve passar antes pela liberalização de uma leitura compatível com a condição humana. Mas “quando se tem um martelo sobre a cabeça, vê-se todos os problemas sob a forma de prego”, como gosta de dizer o economista e objetor do crescimento Serge Latouche. Todos os grandes precursores do decrescimento – Jacques Ellul, Ivan Illich, Bernard-Charbonneau – recordam esta condição primeira.
Você faz parte do pequeno grupo de ecologistas que expressaram seu ceticismo em relação ao debate sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo. É também por razões antropológicas?
Esse debate, complexo, ficou logo refém da lógica binária da época, amplamente divulgada pela mídia. Na época, ou se era gay friendly ou homofóbico. Isso é uma estupidez. Nós podemos facilmente retomar esta retórica afirmando que é esse projeto que é, estritamente falando, homofóbico, porque nos faz passar de um indispensável direito à diferença a um mortal “direito de negar a diferença”. Como se fosse uma prática ou um estado de fato entre estar oficialmente na regra para ser aceito... Mas, sobretudo, passamos da lógica do dom àquela de um “direito a uma criança”. Trata-se de dobrar a natureza aos desejos e fantasmas dos adultos. Entendemos por isso a nossa incapacidade de aceitar os limites que a natureza nos impõe. A lei do casamento para todos contribui para abrir a caixa de Pandora de todas as reivindicações que nos conduzem direto ao melhor dos mundos descrito por Aldous Huxley, onde a produção de crianças tornou-se um processo puramente técnico que responde às necessidades do momento. A lei do casamento para todos constitui uma chave simbólica para este mundo desumanizado. Ela é um produto puro da ideologia utilitarista e capitalista que coisifica a pessoa e nega suas identidades, a começar pela primeira delas, a identidade sexual. Esta caça das identidades coloca a pessoa na posição de presa ideal para o mercado.
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“Promover o decrescimento é integrar os limites”. Entrevista com Vincent Cheynet - Instituto Humanitas Unisinos - IHU