30 Novembro 2015
O Papa Francisco disse que um fracasso por parte da comunidade internacional em alcançar um acordo quanto às medidas de combate às mudanças climáticas na Conferência do Clima, em Paris na próxima semana, seria “catastrófico”, apelando também para um novo sistema energético que dependa “o mínimo possível” dos combustíveis fósseis.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 26-11-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Em um discurso nesta quinta-feira (27 de nov.) no escritório da ONU em Nairóbi durante a sua visita a três países africanos que irá até o dia 30 deste mês, o pontífice proferiu algumas de suas observações mais duras em nome da proteção do meio ambiente, mencionando os altos riscos que estão em jogo nas negociações dos líderes mundiais e mesmo propondo uma nova forma de uso da energia baseada em três objetivos.
Ao mencionar as negociações de Paris, a se iniciar no domingo e formalmente conhecido como a 21ª Conferência das Partes (COP21), o papa disse sem rodeios: “Seria triste e – atrevo-me a dizer – até catastrófico se os interesses privados prevalecessem sobre o bem comum”.
“Estamos confrontados com uma escolha que não pode ser ignorada: queremos melhorar ou destruir o meio ambiente”, continuou.
O pontífice declarou que o encontro em Paris “representa um passo importante” no desenvolvimento de um novo sistema energético, o qual, segundo ele, deveria se basear em três pilares: “no uso mínimo possível de combustíveis fósseis”, na eficiência energética e no “uso de fontes energéticas com baixo ou nulo conteúdo de carbono”.
“Estamos diante do grande compromisso político e econômico de reconsiderar e corrigir as falhas e distorções no modelo atual de desenvolvimento”, disse Francisco.
“Espero que a COP21 leve à conclusão de um acordo global e ‘transformador’ baseado nos princípios de solidariedade, justiça, equidade e participação”, continuou o papa. Um acordo que vise três objetivos complexos e interdependentes: “promover a redução do impacto das alterações climáticas, combater pobreza e assegurar o respeito pela dignidade humana”.
Este foi o segundo discurso de Francisco em instalações da ONU num raio de poucos meses, visto que em sua viagem aos EUA ele discursou diante da Assembleia Geral da organização em Nova York, no dia 25 de novembro.
Ainda que o pontífice tenha citado escritos e discursos anteriores feitos por ele sobre o meio ambiente e questões globais – em particular, a sua recente carta encíclica Laudato Si’ –, ele também manifestou uma urgência na ocasião, afirmando que “nós ainda temos tempo” para salvar a Terra.
Ele igualmente apelou por uma nova reeducação global e por programas de formação para ajudar as pessoas a entenderem o impacto de suas escolhas energéticas.
“Nada vai acontecer ao menos que as soluções políticas e técnicas estejam acompanhadas de um processo de educação que proponha novos modos de vida”, disse. “Uma nova cultura”.
“Isto convida a um processo educativo que fomente os meninos e meninas, homens e mulheres, jovens e adultos a adotarem uma cultura do cuidado – o cuidado de si, o cuidado dos outros, o cuidado do meio ambiente – em lugar de uma cultura do desperdício, uma ‘cultura do descartável’, em que as pessoas usam e descartam elas mesmas, os outros e o meio ambiente”, disse ele.
Identificando os efeitos de uma tal cultura com o seu impacto nas pessoas individuais, o papa falou que a sociedade elevou aspectos do sistema de mercado global ao status de ídolos.
“Muitos são os rostos, as histórias, as consequências evidentes em milhares de pessoas que a cultura da degradação e do descarte levou a sacrificar aos ídolos do lucro e do consumo”, disse ele.
“Precisamos estar alertas quanto a um triste sinal da ‘globalização da indiferença’, que nos acostuma lentamente a ver o sofrimento dos outros como algo normal”, continuou.
“Muitas vidas, muitas histórias, muitos sonhos naufragaram nos nossos dias”, completou, acrescentando que “não podemos ficar indiferentes diante disso. Não temos o direito”.
Francisco também criticou o funcionamento da Organização Mundial do Comércio – OMC em seu discurso, dizendo que, embora este órgão regulatório mundial tenha trabalhado para criar um desenvolvimento econômico, “ainda precisamos alcançar um sistema internacional de comércio que seja equitativo e totalmente a serviço da luta contra a pobreza e exclusão”.
O papa mencionou a OMC em referência a sua 10ª conferência ministerial, a acontecer em Nairóbi entre os dias 15 e 18 de dezembro. Ele especialmente pediu por um acesso à assistência à saúde para todos e novos debates sobre os direitos de propriedade intelectual para garantir “um mínimo de atenção sanitária e de acesso aos tratamentos essenciais para todos”.
“Alguns temas médicos, como a eliminação da malária e da tuberculose, a cura das doenças ’órfãs’ e os setores da medicina tropical pedem uma atenção prioritária, acima de qualquer interesse comercial ou político”, disse o pontífice.
Francisco também falou contra o tráfico humano e o comércio ilegal de diamantes e outras pedras preciosas, dizendo: “Também esta situação é um grito dos homens e da terra que deve ser escutado pela comunidade internacional”.
O escritório da ONU em Nairóbi é a sede da organização na África e abriga o Programa para o Meio Ambiente e o Programa para os Assentamentos Humanos.
O papa foi recebido no escritório nesta quinta-feira pelos diretores executivos dos dois programas e pelo diretor geral da sede, Sahle-Work Zewde. Antes da sua alocução, Francisco e Zewde simbolicamente plantaram uma árvore do lado de fora do edifício.
Francisco falou sobre esta plantação no começe de sua fala, dizendo que plantar árvores é “em primeiro lugar, um convite a perseverar na luta contra fenômenos como o desflorestamento e a desertificação”.
“Isso nos lembra da importância de proteger e administrar, com responsabilidade, aqueles ‘pulmões do planeta repletos de biodiversidade’, que incluem, neste continente, ‘as bacias do Congo’, um lugar essencial para ‘o conjunto do planeta e para o futuro da humanidade”, disse o papa citando Laudato Si’.
Plantar uma árvore também é um “incentivo para continuar confiando, esperando e, sobretudo, a nos empenhar concretamente para transformar a degradação e a injustiça”, disse Francisco.
A visita do papa ao Quênia vai até o meio dia de sexta-feira, quando ele parte para Uganda antes de seguir para a República Centro-Africana no domingo. No começo desta quinta-feira, ele se encontrou com sacerdotes, religiosos e seminaristas quenianos e celebrou uma missa ao ar livre com dezenas de milhares de fiéis em meio a uma chuva torrencial na Universidade de Nairóbi.
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Papa convida a eliminar o uso de carbono, e diz que fracasso em Paris seria 'catastrófico' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU