06 Julho 2015
Quando o Papa Francisco chegar aqui no Equador domingo para uma estada de dois dias, muitos equatorianos irão esperar que ele aborde algumas questões políticas – especialmente os planos polêmicos de extração dos recursos naturais em uma das áreas mais ricas em termos biológicos do mundo.
Mas algumas figuras com ampla experiência junto à Igreja Católica local também estão esperando que o pontífice critique, com veemência, os bispos do país, encorajando-os a abandonar certa mentalidade hierárquica e a adotar um modelo mais circular de comando.
Um casal ainda disse esperar que esta visita traga uma mudança para a Igreja do país, parecida com a rejeição de Jesus ao modelo piramidal de comando dos líderes judaicos de sua época.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 05-07-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Uma “sacudida” na Igreja local
“A minha esperança é que esta visita do papa dê uma ‘sacudida’ na Igreja do Equador”, disse Maribel León, coordenadora de formação das Pontifícias Obras Missionárias da Arquidiocese de Quito.
“Precisamos romper com estas estruturas e irmos ao encontro das as pessoas”, disse ela. “O convite do papa vai no sentido de nos tornarmos uma Igreja que sai mundo afora, uma Igreja com as portas abertas – não para receber as pessoas, mas para sair ao encontro delas”.
Marco Laguatasi, marido de Maribel León e secretário-executivo das Pontifícias Obras Missionárias da arquidiocese, disse que a Igreja local deve trabalhar para entender melhor impulso missionário de Francisco.
“Temos de refletir, temos de estudar mais a fundo este impulso missionário, temos de vivê-lo”, disse Laguatasi. “Quando Jesus veio, viu uma estrutura piramidal na Igreja e disse que não deveria ser assim. Ele rompeu a estrutura e fortaleceu a Igreja circular”.
“Jesus fez uma opção preferencial pelos pobres, pelos necessitados”, disse o equatoriano. “É isso o que precisamos para romper com estas estruturas”.
Como parte de trabalho deles na arquidiocese, Laguatasi e León estão ajudando na logística da visita do papa ao seu país, que vai de domingo até quarta-feira.
Sendo a primeira parada de uma viagem que terá o papa indo também à Bolívia e ao Paraguai, Francisco chega em Quito no domingo de tarde. Na segunda-feira (6) ele visitará a cidade portuária equatoriana de Guayaquil antes de regressar à capital, Quito.
Na terça-feira, o papa se reunirá com os bispos equatorianos e com membros da sociedade civil. Também celebrará uma missa ao ar livre que deve atrair milhões de fiéis. Na quarta-feira pela manhã, ele se reunirá com o clero e os religiosos antes de se embarcar para a Bolívia.
Os preparativos para a visita do papa ao Equador têm sido intensos, com quase todos os grandes jornais cobrindo esta viagem papal em suas primeiras páginas nos dias que antecederam a sua chegada. Muitos edifícios do centro da cidade foram decorados com faixas de boas-vindas ao papa e com citações de seus escritos e discursos.
Laguatasi e León começaram a trabalhar para a Igreja Católica em Quito depois de servir por 3 anos e meio como missionários na Guatemala.
Maribel León disse desejar que esta visita de Francisco ao seu país sirva para refletir uma Igreja que ela, o marido e os quatro filhos viram na Guatemala, onde, segundo contou, os bispos estão mais próximos das pessoas e mais conscientes de suas necessidades.
“Aqui, a experiência com os bispos é algo distante das pessoas”, disse León. “Não é uma experiência que aproxima o clero do seu povo”
“O papa deve saber que está em suas mãos chegar ao coração das autoridades da Igreja local”, disse ela. “Eu gostaria que ele soubesse que está ao seu alcance dar esta ‘sacudida’ que a nossa Igreja local precisa”.
Uma outra equatoriana que coordena uma comissão ecumênica para os direitos humanos no país também disse esperar que o papa envie uma mensagem especial aos bispos do país.
A irmã maryknoll Elsie Monge considera que o papa pode reservar um momento durante o seu encontro com o clero para salientar a importância de um aggiornamento na Igreja local, empregando o termo italiano frequentemente mencionado durante o Concílio Vaticano II para se referir à atualização da Igreja.
A membro das Irmãs Missionárias de Maryknoll disse que o papa poderia pedir aos bispos que escutem o seu povo e “caminhem com ele” de forma que fiquem “mais próximos das pessoas (...) para tentar compreender as suas necessidades”.
Questões ambientais na agenda
Porém a Irmã Elsie Monge, Maribel León e Marco Laguatasi também disseram que Francisco deveria aproveitar a oportunidade, durante a visita que fará ao presidente equatoriano Rafael Correa na segunda à tarde, para discutir a abertura deste presidente para com a extração dos recursos naturais no Parque Nacional de Yasuni.
Uma grande reserva natural de 2,5 milhões de hectares, perto da fronteira leste do Equador com o Peru, o Parque Nacional de Yasuni tem sido considerado um dos lugares mais diversos em termos biológicos do mundo, sendo também o lar de várias tribos indígenas que vivem em isolamento.
A Irmã Elsie Monge é diretora executiva da Comissão Ecumênica Equatoriana dos Direitos Humanos, organização composta por sindicatos, agricultores e grupos de profissionais iniciado em 1978.
Ela disse que grande parte do trabalho que a sua organização vem desenvolvendo nos últimos anos tem se centrado na ajuda a grupos locais que protestam contra a exploração dos recursos naturais, pois inúmeras empresas multinacionais estão chegando ao país para a extração, principalmente, de ouro, prata e cobre.
A religiosa falou que seu grupo escreveu uma carta a Francisco antes da visita, dizendo-lhe quão devastador está sendo este trabalho de exploração das riquezas naturais na região, especialmente para os grupos nativos que vivem isolados. Ela disse que pediu ao pontífice para que ele esteja ciente do problema e, “se possível”, abordá-lo em sua conversa com Correa.
“Acho que a sua presença é uma ocasião para as pessoas refletirem mais a fundo nesse sentido, chegando às causas da pobreza, da violação dos direitos da natureza”, disse ela.
A irmã também chamou o governo de Rafael Correa de “autoritário” e disse que o papa poderia ressaltar ao presidente, “de maneira muito suave”, que é importante ouvir as perspectivas dos povos nativos.
“Resolver conflitos usando a escuta (…) não faz parte do nosso cenário”, disse ela. “Talvez com o exemplo de Francisco, as coisas mudem nesse sentido”.
Por sua vez, Maribel León mencionou a questão ambiental, dizendo que, quando Rafael Correa concorreu à presidência em 2007, prometeu que não permitiria a prática de mineração no Parque Yasuni. Maribel León disse esperar que Francisco recorra à sua nova encíclica Laudato Si’ “para fazer o nosso governo entender que o que Rafael Correa está fazendo para o nosso meio ambiente não é positivo”.
O presidente Rafael Correa, disse Maribel León, “está tomando as nossas riquezas naturais, trocando-as por uma riqueza financeira e eliminando os povos que vivem aí”.
Acima de tudo, no entanto, Maribel León e Marco Laguatasi centraram-se nas mudanças à Igreja equatoriana que esperam que Francisco possa trazer.
“Despertar” ao chamado do papa
Marco Laguatasi acha que a sua Igreja precisa “despertar” para o chamado do papa no sentido de ela se tornar mais circular em seu funcionamento. Disse que a sua experiência de trabalho na arquidiocese mostrou que a Igreja local é bastante clerical.
“Nós leigos somos apenas ajudantes dos sacerdotes, somos atores secundários”, disse ele. “Mas o Papa fala de uma Igreja circular, onde todos somos iguais, tendo diferentes funções. As funções se complementam, e ele enfatiza o papel dos leigos em todos os ambientes”.
“Penso que a nossa Igreja local precisa se mover no sentido de se tornar uma Igreja circular, ela precisa despertar”, disse Laguatasi.
Maribel León lembrou o documento que o então Cardeal Bergoglio ajudou a escrever no final da quinta Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, em Aparecida-SP, no ano de 2007.
Ela citou um parágrafo deste documento que convidava a Igreja a mudar suas estruturas para criar uma “atitude de abertura, de diálogo e de disponibilidade para promover a corresponsabilidade e participação efetiva de todos os fiéis na vida das comunidades cristãs”.
“Minha esperança vai no sentido do que o Documento de Aparecida afirmou: que devemos mudar as estruturas”, disse ela. “Isto é, devemos partir de uma mudança pessoal em direção a uma mudança comunitária. O documento nos convida a mudar: os bispos, os sacerdotes, os religiosos, os leigos, todo mundo”.
Perguntado sobre o que esperam que Francisco aprenda com esta visita ao Equador, Laguatasi disse que a “grande herança” de seu país é o seu povo.
“Somos muito gentis, muito abertos, temos muito calor humano”, disse ele. “Abrimos as portas de nossos corações e dos nossos lares. Acho que o papa ficará sabendo disso. Creio que esta é a maior riqueza que temos”.
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Equatorianos esperam que Papa Francisco critique o governo Correa por não escutar os povos indígenas e dê uma “sacudida” na Igreja com sua visita - Instituto Humanitas Unisinos - IHU