22 Junho 2015
Visto com suspeita pelo Santo Ofício pela sua proximidade aos padres operários, exilado, afastado do ensino universitário e, depois, reabilitado e nomeado perito do Concílio Vaticano II por João XXIII. Mas, acima de tudo, um homem do diálogo e do debate com as outras confissões cristãs e, justamente por isso, nobre pai do ecumenismo e da eclesiologia pós-conciliar.
A reportagem é de Filippo Rizzi, publicada no jornal Avvenire, 20-06-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Essa é a história, mas também a aventura cristã, do dominicano Yves-Marie Congar (1904-1995), o "celta das Ardenas", segundo uma de definição feliz de Jean-Pierre Jossua, que, justamente no dia 22 de junho de 20 anos, falecia depois de uma longa doença no hospital militar dos Invalides, em Paris, poucas semanas depois de receber a merecida honra do cardinalato – por vontade de João Paulo II – por parte do seu amigo, o cardeal Johannes Willebrands.
Uma herança ainda hoje atual por ter sido, junto com o seu coirmão e mestre de teologia em Le Saulchoir, na Bélgica, Marie-Dominique Chenu, e os jesuítas de Fourviére, Henri de Lubac e Jean Daniélou, um dos artífices daquela renovação espiritual na França dos anos 1950, que passaria sob o nome de "Nouvelle théologie".
O dominicano de Sedan é recordado hoje principalmente no campo da teologia contemporânea por causa de alguns ensaios consideradas como marcos, como Por uma teologia do laicato, Creio no Espírito Santo, Verdadeira e falsa reforma da Igreja ou o seu livro programático Chrétiens désunis.
Mas é precisamente no curso das quatro sessões do Vaticano II que se imporia a figura do dominicano francês, especialmente pela sua contribuição na redação de importantes documentos conciliares como as constituições Lumen gentium e Gaudium et Spes ("Devo muito particularmente aos padres Yves Congar e Henri de Lubac", diria naquele momento o jovem arcebispo de Cracóvia, Karol Wojtyla).
"O dominicano francês foi um dos protagonistas daquele evento – explica o teólogo padre Luca Merlo, autor do recente livro pela editora Morcelliana Yves Congar – e colaborou com dedicação na redação de metade dos documentos aprovados. Entre os seus inúmeros méritos, está, sem dúvida, o de ter feito pressentir, ainda antes e especialmente durante o Concílio, que a Igreja é o povo de Deus que se realiza através da comunhão dos batizados, o 'nós' dos cristãos, como ele gostava de repetir. Hoje, não podemos deixar de nos alegrar pelo fato de que essa categoria eclesiológica, depois de uma recepção flutuante, tenha sido relançada com autoridade pelo Papa Francisco na Evangelii gaudium".
Merlo também se detém sobre as grandes intuições congarianas do pós-Concílio, começando pelo tema da ministerialidade eclesial: "O desafio foi aceito por Congar que, justamente à luz da perspectiva de comunhão assumida pelo Vaticano II, abandonou o binômio sacerdócio-laicato, típico da configuração pré-conciliar, para substituí-lo pelo de ministérios-comunidades, mais sensível à dimensão diaconal que é de todo o povo de Deus. Basta pensar que, hoje, é impensável consultar um livro sobre o assunto que não se lembre da sua contribuição".
Quem ainda conserva uma recordação nítida do período conciliar como sendo os últimos anos "vividos com uma simplicidade e dignidade surpreendentes" nos Invalides de Paris é o jesuíta alemão Karl Heinz Neufeld, que foi, dentre outras coisas, um de seus últimos alunos de doutorado no Institut Catholique de 1971 a 1975: "Ele tinha, naquele momento, uma grande sintonia de pontos de vista com De Lubac, mas também com Karl Rahner. Em 1985, ele escreveu uma contribuição de Recordações de Karl Rahner ao Vaticano II, para o volume Bilder eines Lebens. Acho que o jesuíta alemão e o dominicano francês deram, acima de tudo, uma contribuição de tipo técnico ao Vaticano II: o primeiro, mais teológico-sistemático, enquanto o outro, de marca mais histórica. Um dos grandes méritos de Congar foi a sua leitura clarividente do seu conceito de Igreja e de tradição em relação ao defendido por Dom Marcel Lefebvre".
Junto com a sua grande capacidade de "investigação histórica" no campo da eclesiologia, o padre Neufeld evoca a sua ação de promotor ante litteram do lento caminho da unidade dos cristãos. "Ele foi, em certo sentido, o precursor das viagens ecumênicas de Paulo VI. Basta pensar nos seus encontros – destaca – ainda em 1954, com Atenágoras, Patriarca de Constantinopla, em Atenas, e, depois, na Terra Santa, com o Patriarca Ortodoxo de Jerusalém. Um homem que, justamente por ter nascido em um lugar de fronteira como Sedan, entendeu antes que outros a importância do diálogo entre os irmãos separados".
Um legado no campo ecumênico que foi a bússola, em certo sentido, para o presidente emérito do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, o cardeal Walter Kasper: "A minha ação teve como modelo e referência a eclesiologia de Congar. Encontrando-me diante das tantas diversidades do mundo cristão, dos ortodoxos aos protestantes, muitas vezes me encontrei nesta frase do teólogo dominicano: 'Tudo, ou quase tudo, é igual, mas diferente'".
O purpurado alemão relembra os muitos encontros ocorridos em Estrasburgo, no convento de Saint Jacques ou nos Invalides com Congar e as "diferenças hermenêutica e de linguagem que surgiram durante as longas reuniões de redação da revista Concilium, entre o dominicano e o teólogo suíço Hans Küng".
"Eu era apenas um jovem teólogo – confidencia o cardeal –, mas, graças a Congar, aqueles encontros me permitiram ir às origens de uma questão como a eclesiologia. Impressionou-me a sua 'cella' repleta de livros até o teto, e a ordem meticulosa com que ele fichava as suas anotações, como verdadeiro estudioso e arquivista de raça. Estava um pouco amargurado pelo fato de que, depois do Concílio, especialmente com a crise de 1968, ele ainda era um dos poucos entre os seus coirmãos do convento parisiense de Saint Jacques que estudava teologia. 'Veja, muitos preferem a sociologia...', ele me disse, com um toque de melancolia, no refeitório. A sua amargura aflorava também nos últimos anos da sua vida, por causa dos ventos de tradicionalismo em relação à herança do Concílio."
Um pensador, aos olhos de Kasper, sempre orientado ao futuro da Igreja. "Para mim, junto com De Lubac – confidencia –, ele foi o maior eclesiólogo do século XX, o que mais incidiu sobre a Igreja. Eu acho que ele queria escrever de modo unitário um tratado de eclesiologia, especialmente depois do Vaticano II, mas talvez, pela multidisciplinaridade e pela natureza fragmentária dos seus saberes, ele não se sentia disposto a empreender um trabalho como esse."
É dos últimos encontros nos Invalides que Kasper ainda conserva as imagens mais vívidas: "Ele era um homem apaixonado pela Igreja: sofria porque os frutos do Concílio demoravam para amadurecer, mas principalmente vivia com grande preocupação o desvio sociológico que tinha dado a Igreja do pós-Concílio naqueles anos, especialmente na França e na Europa. Ele esperava, como bom dominicano, um retorno à centralidade da teologia como coração do catolicismo".
Último pensamento? O ecumenismo
"Cortado da vida ativa, permaneço unido ao corpo místico do Senhor Jesus, do qual falei tantas vezes. Eu o sou dia e noite com a oração, assumindo nele, também, a minha parte de sofrimento."
São as palavras de saber quase testamentário que servem de apêndice para as famosas Conversas de outono (1987-1988), nas quais o teólogo dominicano, no crepúsculo da sua vida, internado nos Invalides de Paris, faz um balanço da sua atividade de estudioso e de sacerdote.
Nesses escritos, emerge o sofrimento, mas também a lúcida consciência dos seus limites, por causa de uma paraplegia que o imobilizava completamente.
"Falta-me aquela troca de ideias que me permitiria – seria a sua confidência comovente – completar e corrigir aquilo que talvez continua discutível nas minhas posições. E, certamente, a dois anos de distância do início destas conversas, algo se poderia dizer melhor; a cada dia, aprende-se algo mais. Desde então, saíram muitas publicações, houve o encontro entre as religiões em Assis no dia 27 de outubro. Quase não sou mais capaz de escrever. No entanto, como em tudo aquilo que eu escrevi e publiquei, dou também aqui uma parte de mim mesmo."
O último pensamento vai ao ecumenismo: "No Espírito Santo, estou perto de todos os membros, a mim conhecidos e desconhecidos. O ecumenismo, em tudo isso, certamente tem uma parte própria. E isso significa: intercessão, consolação, gratidão, até quando o Senhor quiser".
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Congar, paladino do Concílio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU