12 Junho 2015
Na famosa entrevista com Eugenio Scalfari, Berlinguer diz: "A questão moral é uma coisa só com a ocupação do Estado por parte dos partidos governativos e das correntes, com a guerra por grupos, é uma coisa só com a concepção da política e com os métodos de governo destes, que devem ser simplesmente abandonados e superados". Era 1981, pouco mudou. Ao contrário, muito piorou, já que nos encontramos diante de uma aliança entre política e criminalidade que lucra com a pele dos últimos, como evidenciado pela Mafia Capitale [grupo mafioso de marca político-empresarial que opera em Roma]. Falamos sobre isso com o padre Bartolomeo Sorge, jesuíta, diretor do Instituto San Fedele, especialista em doutrina social da Igreja.
A reportagem é de Silvia Truzzi, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 10-06-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis a entrevista.
Nos últimos meses, a política foi tocada repetidamente por investigações de corrupção: Mose, Expo e agora Mafia Capitale.
A política é uma realidade viva e, como toda realidade viva, tem alma: a tensão ideal e ética. Se esta se perde, a política morre. E, quando morre, apodrece e nos corrompemos. A corrupção que a política manifesta hoje, portanto, é o sintoma da sua morte. Depois do fim das ideologias – sobre o qual se pode discutir longamente, mas que, sem dúvida, davam um impulso ideal e uma tensão ética –, a política perdeu a alma, a sua tensão ética e ideal. É por isso que não chamam mais a atenção os títulos dos telefornais que, todos os dias, falam de escândalos.
A abstenção cresce. No entanto, a política, que fala muito de relação com o povo, não parece alarmada. O que você pensa a respeito?
Quando a política morre, difundem-se duas doenças graves, que podem ser mortais para os sistemas democráticos. A primeira é a antipolítica, que se propaga especialmente entre os cidadãos eleitores. Ela se manifesta no desinteresse, no abstencionismo, até chegar à rejeição do sistema e de toda a classe dirigente. A segunda patologia é o populismo, que, ao contrário, atinge quem governa. Ela se manifesta na tendência de privilegiar a relação direta com o povo, com as ruas, e colocam-se em segundo plano as mediações institucionais, ou seja, as regras da democracia representativa. As instituições são deslegitimadas, e prevalece um pragmatismo que faz vir à tona os líderes e leva a formas inaceitáveis de arrogância e de intolerância para com as minorias.
Quem governa não parecem muito preocupados com a distância dos cidadãos da política.
As duas coisas estão unidas. Quem tem o poder prefere a relação direta com o povo. Chega-se a dizer: "Eles me condenaram? Quem se importa! Eu tenho o consenso dos cidadãos que votam em mim".
Na polêmica sobre a lista dos inapresentáveis, ninguém ressaltou como deveria ser predominante o interesse dos cidadãos de poderem escolher entre candidatos de bem.
Tudo o que ajuda os cidadãos a fazerem uma escolha política mais informada e prudente é precioso. Por 11 anos eu estive em Palermo, vi a máfia cara a cara. E toquei com a primeira o fato de como é útil revelar aos cidadãos os manejos do crime organizado que vive de cumplicidade e gostaria de permanecer oculto: o trabalho da Comissão Parlamentar é importante nesse sentido. Mas tornar pública a lista a poucas horas do silêncio eleitoral não era oportuno e revelou ser contraproducente. Levou tempo para recolher os dados necessários, tudo bem, mas era evidente que a iniciativa, no contexto em que foi tomada, seria interpretada como uma retaliação ou uma vingança da esquerda do Partido Democrático. Isso tornou praticamente irrelevante a intervenção da comissão e produziu mais danos do que vantagens.
Um nó jurídico, mas, acima de tudo, ético diz respeito ao governador da Campânia, Vincenzo De Luca: inelegível por causa da lei Severino. Que sinal envia aos cidadãos o fato de declarar que "a lei não é um problema"?
Eu conheci De Luca pessoalmente, quando ele era prefeito de Salerno e me impressionou ver como ele trabalhou bem pela sua cidade. Não tenho dúvidas de que, como administrador, ele tem notáveis qualidades. Há um "mas". O problema da representação política não pode ser reduzido a uma questão exclusivamente capacidade jurídica ou de capacidade operativa: o aspecto ético vem antes. Pode acontecer que um político, sem a culpa dele, encontre-se em uma situação que lhe tira credibilidade, até mesmo na ausência de uma condenação penal. Quero dizer que a credibilidade moral é algo diferente, a partir do plano estritamente jurídico. E a honrabilidade moral é um dote necessário para aqueles que devem governar. No caso de De Luca, desde o início, ele precisava ter a coragem de reconhecer que a situação tornava inoportuna a sua candidatura, embora esta fosse legítima no plano estritamente jurídico e até desejável no plano administrativo.
A situação de De Luca era muito conhecida antes das eleições, porém, optou-se por não levá-la em consideração, criando um curto-circuito paradoxal. Como o Estado pode pedir para se respeitar as leis se os seus representantes, em primeiro lugar, não o fazem?
Voltemos ao início da nossa conversa. Benedetto Croce, o pai da cultura laica, diz: não pode subsistir um modelo de sociedade sem um fundamento ético. E, além disso, ele, que não era religioso, acrescentava que a ética não pode prescindir da dimensão religiosa. O que isso quer dizer? Que uma sociedade não fica de pé se se basear exclusivamente sobre as regras jurídicas e econômicas. Ao lado destas e para assegurar a sua eficácia, não se pode prescindir da consciência moral.
Como é possível sair disso?
Com a formação. Em particular, a exemplaridade de quem governo tem um enorme peso educativo. Essa convicção amadureceu em mim a partir da experiência siciliana dos anos 1980. Para enfrentar a máfia, era preciso se dedicar à formação de uma nova classe dirigente. Ao mesmo tempo, era importante envolver a escola, a mídia, a Igreja e todas as agências educativas na formação de uma nova consciência cívica em nível popular. Assim, nasceu a "Primavera de Palermo". Sem uma forte pressão moral pela legalidade, o dinheiro e a corrupção continuarão de modo irrefreável a sua obra devastadora da política e da vida democrática.
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''Se a política é podre, nascem líderes arrogantes e intolerantes.'' Entrevista com Bartolomeo Sorge - Instituto Humanitas Unisinos - IHU