05 Junho 2015
"Na Alemanha, os católicos guerreiam debaixo da aba do chapéu, em vez de dar uma forma à própria fé. Porque todos querem ficar sob o mesmo chapéu, ou seja, o próprio, tanto os conservadores, como os progressistas e os do centro", escreve Wolfgang Thielmann, teólogo, em artigo publicado pela revista Christ & Welt, 22-05-2015. A tradução é de Ramiro Mincato.
Eis o artigo.
Debaixo de um chapéu deve estar, normalmente, uma só cabeça. Colocar debaixo dele uma inteira família, significa ter que fazer um grande esforço. Quase nunca o feltro se adapta a todos, e às vezes, quem quer algo diferente, não se sente incluído, antes esmagado sob a aba, ou oprimido pela escuridão ou pelo mau cheiro de dentro, e se opõe a tal opressão. Não obstante, continua sendo membro da família. No caso dos Estados ou Igrejas, a situação é semelhante. Na Irlanda, algumas pessoas sentiam-se esmagadas sob a aba larga do chapéu do lendário St. Patrick, e o cheiro sob o feltro, os privava de ar. O escândalo dos abusos tornou, pois, insuportável o já grande desconforto.
Com tudo isso, os irlandeses são em sua maioria católicos, e continuarão a sê-lo. O primeiro-ministro Enda Kenny, com o belo título de "Taoiseach" [ndr: antiga palavra irlandesa para "chefe", hoje "chefe de Governo"] disse, furioso, porque o processo de esclarecimento sobre os abusos se arrastava, ser um católico, mas não um "Taoiseach Católico". Ora, considerando-se ainda dentro da Igreja, ajuda a definir o que significa ser católico.
Os bispos irlandeses, que perderam a força de imposição, estão pensativos. Não têm mais o monopólio sobre as bênçãos irlandesas (de significado mais profundo ou no seu duplo sentido). As pessoas exortam-se reciprocamente. Mas os europeus continentais continuam indo à Irlanda, como no passado, em busca da religiosidade que os antigos monges espalharam dali para toda a Europa, sem preocupar-se se os homossexuais podem casar-se ou não.
Já na Alemanha, os católicos guerreiam debaixo da aba do chapéu, em vez de dar uma forma à própria fé. Porque todos querem ficar sob o mesmo chapéu, ou seja, o próprio, tanto os conservadores, como os progressistas e os do centro. E querem colocar o seu chapéu na cabeça do Papa. Porque o Papa encarna a unidade, e para os católicos a unidade é católica. Na verdade existem apenas maiorias e minorias. E acreditar, querida Christiane Florin, que um forte centro tem influência sobre a sociedade, é uma ilusão. As pessoas procuram credibilidade, seja no centro como nas margens.
Mas o mito da unidade é, para muitos católicos, mais importante do que dar glória a Deus nas alturas e paz na terra. Este mito também fornece munição para batalhas dentro da Igreja Católica, que na sua maioria são travadas sobre sexo, moral e o lugar das mulheres. Os conservadores veem a verdade no antigo, mesmo quando não é tão antigo assim. Para Stefan Oster, por exemplo, o bispo de Passau, conta apenas o casamento entre homem e mulher, como é normal desde meados do século XIX. Para o escritor Martin Mosebach, a verdade tem o aroma dos chinelos papais, que Francisco recusa. Outros, como os leigos reunidos no Comitê Central de Católicos Alemães, querem a bênção também para parceiros homossexuais, se prometem-se fidelidade reciproca. Ou até mesmo, ordenação de mulheres. Tanto uns, como os outros, esperam na força da imposição. Papa Francisco, no entanto, não favorece nem a uns, nem a outros. Deixa os bispos jogarem no ringue seus chapéus. No Sínodo sobre a família, em outubro, eles terão de chegar a um acordo sobre o que é bom sexo católico. Como se pudessem fazê-lo. Francisco, entretanto, celebra missa com refugiados e telefona para doentes no hospital.
Este papa destrói o mito de unidade que seus dois antecessores estabeleceram quase como um dogma. Francisco sabe que não são os dogmas que convencem, mas os argumentos e a sua pessoa. As pessoas o estimam e escutam, mesmo definindo seus critérios de vida contrários aos dele. O catolicismo está dividido faz tempo. Três bispos conservadores alemães compreenderam isso e, dias atrás, tomaram posição particular no âmbito do direito do trabalho. Também ali tratava-se de sexo e casamento. Já eram votos vencidos, mas agora tornaram a divisão há muito tempo presente entre os bispos visível. E isso vai criando um estilo.
Muitos padres e leigos católicos renunciaram, há muito tempo, ao mito de unidade, e ajudam definir, como os irlandeses, o que é católico. Abençoam as pessoas que pedem a bênção. Alguns abençoam também os homossexuais, outros não. Alguns padres oferecem a Eucaristia a católicos e protestantes e também para pessoas casadas pela segunda vez. Tal como seus colegas evangélicos e ortodoxos, falam com as pessoas a respeito dos seus desejos mais profundos e dos seus medos de Deus.
Não houve nenhum espírito de Pentecostes no referendo da Irlanda. Houve só uma maioria. Esta maioria os católicos ainda têm que aprender a organizar. E os trinta e três por cento que perderam, como agora, na Irlanda, continuam eles também ainda católicos. A família católica gradualmente se ‘reordenará’, mas só raramente se encontrará sob um mesmo chapéu. E é bom que seja assim.
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