20 Outubro 2008
O geógrafo Pedro Costa Guedes Vianna vive na Paraíba, mas ainda está bastante ligado ao contexto político da sua terra natal, o Rio Grande do Norte. Por isso, a IHU On-Line o contatou para que ele pudesse fazer uma análise do resultado das eleições neste estado, dando continuidade à série de entrevistas sobre as eleições municipais de 2008. Micarla Sousa foi eleita prefeita da cidade de Natal com o apoio de Agripino Maia, um dos maiores opositores do governo Lula. No entanto, para o professor Pedro, isto não significa uma derrota para a imagem do presidente no RN. “A vitória de Micarla parece que está muito mais associada a uma derrota da governadora Vilma, e da própria Fátima. O povo de Natal assistiu durante muito tempo o grupo político dos Alves e a própria Vilma desqualificarem Fátima e o PT, de todo o tipo possível. De repente, querem que o eleitorado aceite que tudo aquilo foi um passado sem marcas e que estavam enganados em relação à Fátima e ao PT de Natal”, refletiu. A entrevista foi realizada por e-mail.
Clóvis Luiz Pereira Oliveira, por sua vez, conversou por telefone com a IHU On-Line sobre as eleições na capital da Bahia. As análises pós-eleições afirmaram que o grande derrotado desse pleito foi ACM Neto e o carlismo criado por Antonio Carlos Magalhães enquanto vivo. No entanto, o cientista político acredita que as intenções do DEM foram atingidas no estado quando, neste contexto, conseguiu se inserir no contexto político baiano. Agora, neste segundo turno, entre PT e PMDB, a disputa é pelo uso da imagem do presidente. “Os dois candidatos atuais estão utilizando a imagem do presidente de várias formas, e isso vai anular, certamente, a eficiência da vinculação à imagem de Lula”, disse ele.
Pedro Costa Guedes Vianna possui graduação em Geografia, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestrado em Geografia, pela Universidade Federal de Santa Catarina, e doutorado em Geografia Física, pela Universidade de São Paulo. Por 19 anos, atuou como geógrafo na SUDERHSA, organismo de gestão de águas do Estado do Paraná. Atualmente, é professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal da Paraíba e coordena o Grupo de Estudos e Pesquisa em Água e território.
Clóvis Luiz Pereira Oliveira é doutor em Ciência Política, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. É pesquisador do programa A Cor da Bahia (UFBA/Fundação FORD) e professor assistente da Universidade Estadual de Feira de Santana e do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ.
Confira as entrevistas.
Entrevista especial com Clóvis Luiz Pereira Oliveira
IHU On-Line – O que sinaliza a derrota de ACM Neto?
Clóvis Luiz Pereira Oliveira – Em Salvador, existe uma clivagem político-partidária muito forte. Existem segmentos de esquerda e direita, mas também uma proporção grande de pessoas que ficam com voto volátil de centro. A idéia do anti-carlismo é muito forte. Então, a direita representada pelo carlismo, ao longo dos últimos tempos, criou um secto enorme composto por um terço do eleitorado de Salvador. Estes nutrem simpatia por ACM Neto e seu grupo, que passam a idéia de eficiência administrativa, apesar de governarem com um toque de nepotismo e patrimonialismo. Esse grupo é tido como um segmento de políticos fortes que conduzem as atividades com determinação. Esse tipo de idéia é muito forte no imaginário local. Por outro lado, existe uma oposição a esse tipo de jeito de fazer político. Então, o ACM conseguiu criar a própria mística do carlismo e também a idéia do anti-carlismo. Um se nutre da própria imagem do outro. Nesse momento, o que aconteceu é que, por conta da rejeição do carlismo e pela força que o anti-carlismo foi tomando, o prefeito atual conseguiu entrar nesse vácuo da oposição ao carlismo e da falta de consistência do segmento de oposição.
IHU On-Line – A derrota de ACM Neto era inesperada? O que levou o povo de Salvador não levá-lo ao segundo turno?
Clóvis Luiz Pereira Oliveira – Não era inesperada, não. O que aconteceu é que foi inflada muito nas prévias a dinâmica de eleições. Quando você tem as primeiras intenções de voto, os candidatos que são mais conhecidos tendem a ter uma avaliação mais positiva. Quando começa o processo eleitoral e os outros candidatos começam a ter a visibilidade muito maior e o debate passa a acontecer de maneira muito mais freqüente, a tendência é que alguns vêem diminuir suas intenções de voto e aumentar a intenção em relação aqueles que não apareciam naquele primeiro momento. Houve uma supervalorização da imagem de ACM Neto, na medida em que ataques foram feitos para desconstruir a imagem dele. Então, ele chegou ao patamar final. Mesmo assim, seu desempenho foi muito bom em relação às expectativas da campanha que era tão somente de marcar posição no espaço político-ideológico de Salvador e na Bahia, em geral. Isso porque seu partido, que era o PFL, mudou de marketing e redefiniu o partido para Democratas (DEM) e nesse momento precisava marcar espaço nessa nova reconfiguração político-partidária local. Então, de certa forma, os objetivos da campanha foram atingidos.
IHU On-Line – Que influência a figura de Lula pode ter no segundo turno em Salvador?
Clóvis Luiz Pereira Oliveira – Todos os candidatos reivindicaram para si o apoio de Lula, associaram a sua imagem a do presidente. Aliado a isso, a imagem de Lula ficou comprometida devido a um depoimento dele veiculado durante a campanha eleitoral onde dizia que agiria com isenção e respeito a qualquer um dos chefes do executivo que foram eleitos. Então, nesse contexto, a idéia de romper com a tradição patrimonialista e autoritária, para beneficiar muito mais os políticos da base, acabou sendo redefinido pelo depoimento do presidente. Os dois candidatos atuais estão utilizando a imagem do presidente de várias formas e isso vai anular, certamente, a eficiência da vinculação à imagem de Lula. Os dois transitam no mesmo campo político-ideológico. Um dele é do PT, que é uma esquerda com uma inclinação para centro, e o outro tem uma história ligada ao PDT e depois migrou para o PMDB. Então, pelas alianças que tem sido feitas, o eleitorado não consegue se localizar em termos de partido de direita, esquerda, centro, progressista ou conservador. A campanha está se desenvolvendo mais em termos de personalistas, ou seja, quem tem mais credenciais em termos de atributos pessoais, administrativos ou morais para governar a cidade.
Entrevista com Pedro Costa Guedes Vianna
IHU On-Line – Que Brasil que sai dessas últimas eleições?
Pedro Costa Guedes Vianna – Em minha opinião, o Brasil deu mais um passo no processo de consolidação do processo democrático. Embora a democracia brasileira ainda não tenha se proposto a resolver o grande problema de nossa nação, ou seja, a injusta distribuição de nossas riquezas e do fruto de nosso trabalho, sem dúvidas ela tem sido um avanço, ainda que insuficiente, nesta direção.
Outra coisa a ser notada é que os esquemas políticos tradicionais, embora ainda resistam, estão sendo superados pelos resultados práticos das administrações. Neste caso das gestões municipais, a reeleição acabou “premiando” as boas e medianas administrações. Assim, somente os gestores com péssimos resultados não são eleitos. Isso atinge até os grandes esquemas políticos que, como raras exceções, não conseguem mais impor sua vontade apenas pela tradição e uso de uma boa máquina eleitoral ou partidária.
IHU On-Line – Micarla Sousa foi eleita com o apoio de Agripino Maia. Essa eleição pode significar uma derrota de Lula no estado?
Pedro Costa Guedes Viana – Acho que não. Se alguém quiser, pode dizer que Lula não é o “deus” que alguns imaginam, ou seja, ele não consegue eleger todos seus partidários, aí está a oportunidade. Mas daí a dizer que houve uma derrota de Lula no Rio Grande do Norte existe uma distância enorme. A vitória de Micarla parece que está muito mais associada a uma derrota da Governadora Vilma, e da própria Fátima. O povo de Natal assistiu durante muito tempo o grupo político dos Alves e a própria Vilma desqualificarem Fátima e o PT, de todo o tipo possível. De repente, querem que o eleitorado aceite que tudo aquilo foi um passado sem marcas e que estavam enganados em relação à Fátima e ao PT de Natal.
O povo achou que estavam tentando enganar o eleitorado e que tudo não passava de uma atitude oportunista, tão comum na política brasileira e nordestina. Conheço muita gente que sempre votou em Fátima para deputada, e que agora estava com muitas dúvidas antes do dia 5 de outubro. Para terminar, a postura pessoal de Fátima como candidata não ajudou muito, não que simpatia seja uma exigência para que alguém se eleja, mas que ajuda, ajuda, sobretudo quando as propostas para a cidade não diferem muito, como foi o caso de Natal nesta eleição.
IHU On-Line – Como o senhor analisa a atuação da esquerda no Rio Grande do Norte?
Pedro Costa Guedes Viana – Sinto muito, mas o termo "esquerda" está sendo usado neste país de forma absurdamente contraditória e conflituosa, o que me impede de ter condições de dar uma resposta correta.
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Eleições municipais em Natal e Salvador. Entrevista especial com Pedro Costa Guedes Vianna e Clóvis Luiz Pereira Oliveira - Instituto Humanitas Unisinos - IHU