17 Fevereiro 2008
Antes mesmo de o presidente Lula ser eleito, em 2003, o economista e professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Luiz Filgueiras já lançava severas críticas ao antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Mudou o governo, mas permaneceu o modelo econômico, embora o discurso do governo seja outro, comenta o pesquisador. Os índices de crescimento que estão sendo apresentados na gestão de Lula, afirma Filgueiras, são conseqüências de “uma fase ascendente do ciclo econômico internacional, que afetou positivamente todos os países do planeta e, em especial, os da periferia do capitalismo”. Entretanto, ele alerta que o “crescimento por si mesmo não é condição suficiente para permitir uma melhora na distribuição de renda, embora possibilite uma redução da pobreza”
Em entrevista à IHU On-Line, realizada por e-mail, o economista comentou os possíveis impactos de a crise imobiliária americana atingir o Brasil. Sobre esse cenário, que assusta alguns e não preocupa outros, o economista se demonstra pessimista. Para ele, a potencialidade dessa crise sobre a economia brasileira tem duas portas de entrada: financeira e comercial. Em ambos os casos, “a vulnerabilidade externa da economia brasileira voltará a se manifestar, com impactos sobre as trajetórias da inflação da dívida pública; o que restringirá a capacidade de crescimento a partir do mercado interno”.
Critico ferrenho do governo federal, Luiz Filgueiras é autor, juntamente com Reinaldo Gonçalves, do livro A política econômica do governo Lula. Na entrevista a seguir, o economista questiona temas debatidos na obra e avalia as opções do governo na política econômica e social.
Graduado em Ciências Econômicas, pela Universidade Federal da Bahia, Luiz Filgueiras concluiu, na mesma universidade, o mestrado em Economia. Durante o doutorado em Ciências Econômicas, realizado na Unicamp, Filgueiras pesquisou propostas de política econômica para a agricultura brasileira. Atualmente, ele leciona no curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde também desenvolve pesquisas no Departamento de Economia Aplicada.
Eis a entrevista.
IHU On-Line - Por que o senhor é tão pessimista no que se refere à política econômica e social do governo atual? Há algo de positivo, na sua avaliação, que possa ser destacado?
Luiz Filgueiras - A minha visão crítica da política econômica e social do governo Lula é anterior ao início desse governo em 2003, pelo simples fato de que ela é, no fundamental, a continuação da política econômica do segundo governo de FHC (1999-2002): elevados superávits fiscais primários - tendo a DRU (Desvinculação de Receitas da União) como o seu instrumento principal -; metas de inflação - perseguidas com a manutenção de altas taxas de juros -; e câmbio flutuante, com a liberalização da conta de capitais do balanço de pagamentos. Essa foi a estratégia adotada, após a crise cambial de 1999, para a manutenção do que eu denomino de Modelo Econômico Liberal Periférico (abertura comercial e financeira, privatizações e desregulação do mercado de trabalho), quando ficou evidente a impossibilidade de continuação da chamada âncora cambial, tendo em vista a elevada vulnerabilidade externa da economia brasileira. A análise e a crítica desse modelo, bem como de suas políticas econômicas, já era feita no meu livro História do Plano Real (Editora Boitempo: 2000, 2003 e 2006).
Governo Lula. Uma continuidade de FHC?
O aparente paradoxo, agora, é o fato de que a mesma política econômica, do mesmo modelo econômico, apresenta resultados macroeconômicos menos decepcionantes a partir de 2003, levando a uma redução da vulnerabilidade externa conjuntural do país - o que abriu espaço para taxas de crescimento econômico um pouco maiores. A resposta cabal é de que isto se deveu a uma fase ascendente do ciclo econômico internacional, que afetou positivamente todos os países do planeta e, em especial, os da periferia do capitalismo. Portanto, a conjuntura internacional benigna é a variável-chave para se entender o que está acontecendo com esses países, inclusive o Brasil. No entanto, a crítica a esse modelo e às suas políticas econômicas tem perdido espaço no debate econômico mais recente, pois o pequeno ciclo de crescimento de curto prazo tem propiciado uma grande euforia, como é próprio dos tempos atuais de hegemonia do capital financeiro, onde o que vale, o que conta e o que é relevante é o aqui e o agora.
IHU On-Line - No livro A política econômica do governo Lula, fala-se em mistificação da história brasileira. Como essa mistificação se apresenta e se relaciona na política econômica e social do atual governo?
Luiz Filgueiras - A mistificação se expressa de quatro maneiras: 1- Em virtude de o atual governo apresentar a sua política econômica como sendo fundamentalmente distinta do governo anterior, aproveitando-se da conjuntura econômica mainternacional favorável, que tem possibilitado resultados macroeconômicos de curto prazo marginalmente melhores; 2- Em razão de apresentar esses resultados como sendo um novo ciclo de crescimento econômico de maior fôlego, comparando-o com o período de Juscelino e também com o período do chamado “milagre brasileiro”; 3- E, como corolário das duas anteriores, em virtude de se apresentar essa situação como um dos melhores períodos macroeconômicos da história do país, o que não é, de forma alguma, verdadeiro. E isto é repetido, sistematicamente, na forma de “nunca na história desse país...”; 4- Por fim, em razão de se apresentar uma política social focalizada (Bolsa Família), originariamente gestada no interior do Banco Mundial e já aplicada também pelo governo anterior, como sendo a solução para a distribuição de renda no Brasil. Em particular, apresenta-se uma melhora extremamente marginal na distribuição dos rendimentos do trabalho (distribuição pessoal ou familiar da renda) como sendo uma melhora na distribuição da renda em geral. O que também não é verdadeiro; ao contrário, a distribuição funcional da renda (capital X trabalho) só tem piorado contra o trabalho.
IHU On-Line - O senhor percebeu mudanças no mercado internacional e na política econômica do país, no governo Lula? Ainda carregamos muitas heranças da época de FHC?
Luiz Filgueiras - No seu início (primeiro ano), o governo Lula utilizou-se do slogan “herança maldita” da era FHC para justificar a manutenção do mesmo modelo econômico e da mesma política econômica. Afirmava-se, então, que isto seria passageiro e que logo que a situação melhorasse haveria uma outra orientação. No entanto, um novo ciclo econômico mundial iniciou-se em 2003, o que ficou evidente a partir de 2004. Com isso, rapidamente esse discurso foi substituído pela comparação da melhor performance macroeconômica atual com a do período anterior, justificando esse fato como sendo produto de uma nova política econômica. Em suma, a ênfase voltou-se então para a afirmação de que, apesar da “herança maldita” o governo Lula conseguiu reorientar os rumos do país. Na realidade, o governo Lula ratificou e reproduziu essa herança numa outra conjuntura internacional, o que tem levado, lamentavelmente, a certa legitimação do modelo e da política econômica. Este processo só pode ser devidamente compreendido se entendermos o processo de transformismo político pelo qual passou o PT a partir dos anos 1990, quando se iniciou, com o governo Collor, a Era Neoliberal no Brasil
IHU On-Line - A recessão econômica devido a crise imobiliária nos Estados Unidos, poderá deixar a economia interna brasileira mais vulnerável? E no mercado externo as conseqüências serão mais drásticas?
Luiz Filgueiras - Os eventuais impactos da atual crise sobre a economia brasileira têm, potencialmente, duas portas de entrada. A primeira é o mercado financeiro, através da livre mobilidade dos fluxos de capitais, com a compra e venda de ações e títulos da dívida pública do estado brasileiro. Nesta porta, os impactos são imediatos e já se fizeram sentir, ainda que longe dos efeitos provocados pelas crises anteriores: caiu a bolsa, subiu o risco Brasil e desvalorizou-se o câmbio; em razão da venda de papéis brasileiros (ações, títulos públicos e outros papéis de empresas) pelos fundos de investimentos, para compensar as perdas no mercado americano. Além disso, o impacto da crise também se manifestou na política monetária, com a decisão da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) de manter a atual taxa de juros e sinalizar para a sua manutenção até o final do ano, ou mesmo a sua elevação. De outro lado, em uma situação de acirramento da crise global, e na ausência de controle dos fluxos de capitais, uma fuga de capitais de grandes proporções será inevitável, em que pese a melhor situação atual do balanço de pagamentos do país, que permitiu, até agora, a redução da dívida externa e um acúmulo de reservas da ordem de US$ 185 bilhões - o que implicou a redução conjuntural da vulnerabilidade externa.
A motivação dessa fuga não dependerá do chamado “fundamentos da economia”: controle da inflação e trajetória da dívida pública, entre outros. A razão maior se situará, como das outras vezes, na própria dinâmica da especulação financeira, isto é, haverá uma busca por maior segurança através da aquisição de títulos do governo americano. A segunda porta de entrada da crise é o comércio internacional, caso a crise persista e se aprofunde. Neste caso, os impactos no balanço de pagamentos serão de médio e longo prazos, através da queda dos preços internacionais das commodities (agrícolas e industriais), que representam parte majoritária da pauta de exportações do país. Em ambos os casos, pelas portas financeira e comercial, a vulnerabilidade externa da economia brasileira voltará a se manifestar, com impactos sobre as trajetórias da inflação e da dívida pública; o que restringirá a capacidade de crescimento a partir do mercado interno.
Adicionalmente, o custo do financiamento para empresas e o governo aumentará. De qualquer forma, mesmo que a crise retroceda a partir do atual ponto em que se encontra - o que não é nem um pouco evidente -, não há a menor possibilidade de que a mesma se restrinja apenas a perdas nos mercados financeiros, penalizando exclusivamente os seus participantes. A separação, postulada pela teoria econômica ortodoxa, entre os mercados financeiros e a economia real é, rigorosamente, inexistente; sendo produto de uma concepção equivocada sobre a moeda. Esta última é tão real quanto qualquer outra mercadoria, com a diferença crucial de que a sua demanda (preferência pela liquidez) tem poder de provocar estragos enormes no conjunto da economia, no curto e no longo prazo.
IHU On-Line - Os países da América Latina podem estar mais suscetíveis a crise internacional? Nesse contexto, qual a situação do Brasil em relação aos visinhos latino-americano?
Luiz Filgueiras - Todos os países, em particular os países periféricos, estão sendo afetados e, no futuro, serão afetados mais ainda caso a crise global se aprofunde. Entretanto, o grau de “sofrimento” de cada um deles, agora e no futuro, dependerá de suas respectivas inserções internacionais (comercial e financeira) e de suas políticas econômicas. Aqueles com menores restrições ao movimento dos fluxos de capitais e dependentes de uma pauta de exportação calcada, sobretudo, em commodities e produtos com baixa intensidade tecnológica, baixo valor agregado e com pouca dinâmica no comércio internacional, tendem agora, e tenderão no futuro, a sentirem mais os efeitos da crise - quer ela estanque nas próximas semanas, quer ela venha a se aprofundar.
Brasil retardará crescimento?
No caso do Brasil, dada a problemática inserção comercial-financeira do país na economia internacional - com uma grande dependência das exportações de commodities e livre mobilidade dos fluxos financeiros -, a eventual continuação e aprofundamento da crise comprometerão seriamente a continuação da retomada do crescimento. E isto será mais verdadeiro ainda, se a resposta à crise for a manutenção da mesma política econômica implementada até agora, pois isto implicará, como é de praxe em seu receituário, a retomada do aumento da taxa de juros e o aumento do superávit fiscal primário, isto é, mais aperto fiscal e monetário. A alternativa a essa política, é o controle dos fluxos de capitais, no curto prazo, e a reconfiguração da pauta de exportações do país, no médio e longo prazos, em direção a produtos com maior intensidade tecnológica, maior valor agregado e com maior dinamismo no mercado internacional.
IHU On-Line - A equação econômica do governo apresenta uma política fiscal em que se aumenta a receita, corta-se gastos e mantêm-se os juros altos. Essa lógica será valida para pagar a dívida pública brasileira? Essas medidas conseguiram remover as principais restrições de crescimento econômico do país?
Luiz Filgueiras - A dívida pública subdivide-se em externa e interna. No governo Lula, a relação da dívida total com o PIB tem caído graças, mais uma vez, ao cenário internacional, que até o ano passado permitiu uma redução das taxas de juros, além de propiciar um maior crescimento do PIB. No entanto, isto se deve à redução, absoluta e relativa, da dívida pública líquida externa, porque a dívida interna cresceu sistematicamente, tanto de forma absoluta quanto como proporção do PIB. Isto vem acontecendo porque, com a atual política, está havendo uma troca de dívida externa (com prazos maiores e menores taxas de juros) por dívida interna (com prazos menores e maiores taxas de juros), em razão do volume de dólares que tem entrado no país. Isto significa dizer que se a crise mundial se aprofundar poderá haver um enorme salto na dívida pública interna e, por extensão, no total da dívida pública. Isto ocorrerá em razão do aumento da taxa de juros e da redução da taxa de crescimento do PIB, com a conseqüente redução da receita tributária.
IHU On-Line - Avaliando os últimos governos, como o senhor percebe a distribuição de renda no Brasil, levando em consideração que no ano passado, o desemprego foi considerado o menor nos últimos cinco anos, atingido 9,3%? O rendimento dos trabalhadores ainda continua baixo e a distribuição de renda desigual? Isso lhe parece uma contradição?
Luiz Filgueiras - A redução da taxa de desemprego é conseqüência direta de um maior crescimento econômico em relação ao período anterior. Como já mencionado, crescimento este associado direta e indiretamente à conjuntura internacional extremamente favorável a partir de 2003. Entretanto, o crescimento por si mesmo não é condição suficiente para permitir uma melhora na distribuição de renda, embora possibilite uma redução na pobreza. Para se avançar de fato em direção à desconcentração da renda teriam que ser tomadas medidas de caráter estrutural, como: 1- Reforma tributária, com taxação da propriedade e da renda de forma progressiva; 2- Realizar uma reforma agrária verdadeira; 3- Reformar e regular efetivamente o sistema financeiro; 4- Implementar uma política de salário mínimo de longo prazo, que garanta de fato o seu aumento real; e 5- Mudar a política econômica que transfere riqueza para os rentistas do estado e da sociedade.
IHU On-Line - Qual é a sua avaliação dos programas de incentivos propostos pelo governo? Alguns especialistas afirmam que o Bolsa Família foi responsável por cerca de 40% da redução da desigualdade social. Qual será a conseqüência desse tipo de assistência, a longo prazo?
Luiz Filgueiras - A distribuição pessoal/familiar da renda (que abarca fundamentalmente os rendimentos do trabalho) melhorou marginalmente. Isto se deveu, sobretudo, ao crescimento do salário mínimo que serve de base para os reajustes dos benefícios da previdência e da assistência social (que se referem à política social de estado, e não de governo como é o caso do Bolsa Família). Esse último programa é claramente assistencialista, não propiciando qualquer alternativa de saída aos seus beneficiários, que se tornam dependentes, permanecendo na condição de uma espécie de sub-cidadania. Mas esse foi o caminho escolhido pelo governo Lula, em vez de alterar, mesmo que gradativamente, as condições estruturais do alto grau de concentração de renda no país. Em suma, optou-se por uma política compensatória que funcionaliza a pobreza, que “alivia” (expressão do Banco Mundial) momentaneamente a pobreza, mas não acaba com ela.
IHU On-Line - Lula disse que, nesse ano, uma das prioridades de seu governo, será a reforma tributária. Que mudanças o senhor considera necessárias nesse cenário?
Luiz Filgueiras - Quando Lula e o grande capital falam da necessidade de uma reforma tributária estão se referindo, em geral, a uma maior racionalização e eficiência do sistema tributário e à desoneração do capital. O fundamental, que é a construção de um sistema tributário justo socialmente - o que implicaria taxação progressiva da propriedade e da renda, das grandes fortunas e das heranças -, não é nem de longe considerado. E isto sem falar na questão do pacto federativo, que exigiria uma nova relação entre as diversas instâncias de governo.
IHU On-Line - Durante o mandato, Lula reiterou varias vezes que "em time que está ganhando não se muda". Entretanto, no ano passado, vários críticos do governo como Marcio Pochmann, João Sicsu e Coutinho passaram a integrar "um novo time". Como o senhor avalia o ingresso desses desenvolvimentistas no segundo mandato de Lula?
Luiz Filgueiras - Esse “novo time” é produto, antes de tudo, do quadro macroeconômico mais favorável que, como já visto, foi resultado fundamentalmente da conjuntura internacional extremamente favorável que tem permitido uma maior folga para a operacionalização da política econômica ortodoxa. De qualquer forma, independentemente da reconhecida competência desses economistas e de suas concepções político-econômicas progressistas, o fato é que o núcleo duro da política econômica continua preservado. Na verdade, o discurso desenvolvimentista do governo acaba sendo mais retórico e também é produto da conjuntura, além de ser uma pequena concessão política à frações mais progressistas da aliança que sustenta o governo .
IHU On-Line - Como o senhor avalia a posição do governo frente à insistência na transposição do rio São Francisco? Lula e os movimentos sociais estão cada vez mais distantes?
Luiz Filgueiras - Não tenho conhecimentos técnicos para defender ou atacar a transposição. No entanto, é evidente que todos os movimentos sociais envolvidos com a problemática, e com atuação na região, se posicionaram contra e foram “olimpicamente” ignorados pelo governo. Mas, em razão do cenário econômico mais favorável, até 2007, com redução das taxas de desemprego, e da política assistencialista do Bolsa Família, a popularidade de Lula continua elevadíssima. E isto apesar da política econômica ortodoxa, da não realização da reforma agrária, da liberalização dos transgênicos, da reforma da previdência do funcionalismo público etc. Para isto, é fundamental também o fato das direções sindicais e mesmo da maioria dos movimentos sociais serem ligadas, direta ou indiretamente, ao PT e ao governo Lula - o que tem reduzido a disposição de luta dessas organizações populares. Por outro lado, com o Bolsa Família, Lula fincou as bases para a consolidação do “Lulismo”, a partir de uma espécie de populismo regressivo, que não integra ao mercado de trabalho (como era o de Getúlio Vargas).
IHU On-Line - A política do governo atual, ainda pode ser considerada de esquerda?
Luiz Filgueiras - Por tudo que já disse até aqui é evidente que a política econômica do governo, e o próprio governo Lula, não podem ser identificados, nem de longe como sendo de esquerda. Aliás, figuras importantes do grande capital percebem e verbalizam isto constantemente, ao elogiarem o governo e a sua política econômica, como, por exemplo, em entrevistas dadas recentemente pelos dirigentes maiores do Grupo Itaú e do Grupo Odebrecht.
IHU On-Line - Quais seriam os novos pilares para mudar e construir uma política econômica eficiente?
Luiz Filgueiras - A eficiência de uma política econômica não pode ser pensada apenas do ponto de vista técnico. A atual política econômica tem sido eficiente, sobretudo, para os rentistas e o agronegócio. Por isso, antes de tudo tem que se fazer a seguinte pergunta: eficiência para quem, resultados para quem? Além disso, toda política econômica é expressão de um certo arranjo político, da hegemonia de certas classes e frações de classe. Por isso, não se pode pensar uma alternativa à atual política econômica sem pensar na necessidade de se re-configurar o bloco de poder dominante no país. E isto não é nem um pouco fácil ou trivial. Medidas como controle do fluxo de capitais (com a regulação da conta de capitais do balanço de pagamentos), redução do superávit fiscal primário (com a retomada efetiva dos investimentos pelo estado), administração da taxa de câmbio (tornando-a competitiva para produção de bens de elevado conteúdo tecnológico), reforma e regulação do sistema financeiro (com taxação de seus lucros extraordinariamente elevados), reforma agrária efetiva (com o apoio através do crédito e da adoção de novas tecnologias) etc. contrariam direta e indiretamente o capital financeiro e o agronegócio, os dois principais pilares do bloco de poder dominante. A questão, portanto, está na dificuldade de se conseguir a reconfiguração política do bloco de poder dominante, numa conjuntura de fracionamento da esquerda e de desmobilização dos movimentos sociais. Basta ver que o principal protesto contra a transposição do rio São Francisco se resumiu a uma atitude individual de um bispo, com a sociedade praticamente assistindo passivamente o desenrolar da situação.
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A crise financeira internacional e a vulnerabilidade externa da economia brasileira. Entrevista Especial com Luiz Filgueiras - Instituto Humanitas Unisinos - IHU