Por: André | 25 Julho 2016
Dor e preocupação. Mas também vontade para que a Justiça faça seu trabalho e a situação das Irmãs Orantes e Penitentes de Nossa Senhora de Fátima seja esclarecida. Pelo bem da Igreja. São considerações de Santiago Olivera, bispo de Cruz del Eje e presidente da Comissão Episcopal de Comunicação da Conferência Episcopal da Argentina. Na entrevista, ele esclareceu alguns detalhes sobre a incrível história das religiosas que se envolveram em uma das investigações por corrupção política mais escandalosas dos últimos tempos.
Na madrugada de 14 de junho, na residência das irmãs, foi detido José López, ex-secretário de Obras Públicas nos mandatos da presidência de Cristina Fernández de Kirchner. Ele tentava esconder ali quase nove milhões de dólares. O caso comoveu a opinião pública argentina, provocando descontentamento entre os católicos.
A entrevista é de Andrés Beltramo Álvarez e publicada por Vatican Insider, 21-07-2016. A tradução é de André Langer.
Eis a entrevista.
Como a Igreja argentina recebeu este escândalo?
Com dor, surpresa e preocupação. Primeiro, tomamos conhecimento das bolsas e parecia que as irmãs não tinham muito a ver com o fato. Mas é estranho que elas tenham deixado alguém entrar às 3h da madrugada, sobretudo quando se trata de pessoas que queriam ser religiosas de clausura. É raro que alguém queira dar uma esmola a essa hora. Foi muito pouco prudente tanto por parte da pessoa como das irmãs. Depois apareceram outras contradições, quando apareceu um vídeo que mostra as irmãs ajudando López a levar as bolsas para dentro, com uma arma junto às bolsas. Elas deveriam publicamente pedir perdão por sua torpeza, por sua ingenuidade e, se existe culpa, por essa culpa.
Qual é a situação eclesiástica delas?
É uma associação privada de fiéis. No sentido estrito, não são monjas, mas aqui na Argentina chamamos todas as religiosas de monjas, embora não o sejam. As monjas, estritamente falando, são de clausura. Esta instituição era “in fieri”, estava no processo de transformar-se em um mosteiro. Enquanto isso, as religiosas vivem e se vestem como monjas, sem usurpar nada, porque o bispo lhes deu permissão. Para transformar-se em mosteiro necessitam da permissão da Santa Sé, que, obviamente, não têm. Mas elas fazem parte da Igreja. O bispo anterior, Rubén Di Monte, as fundou e celebrava aí a missa, por isso penso que devemos nos responsabilizar por elas, que assumamos a responsabilidade, que não digamos uma coisa por outra. Dizer que não são monjas poderia dar a impressão de que nos deslindamos, mas a Arquidiocese não pode fazer isso.
Agora foi anunciada uma profunda investigação. O que isso significa?
Parece-me muito bem que o arcebispo (de Mercedes-Luján, Agustín Radrizzani) tenha ordenado esta investigação e que tenha nomeado uma comissão que estude a responsabilidade das irmãs. É preciso ver qual é a conclusão em nível eclesial, dar a reparação e a sanção respectiva se se comprovar um ilícito, uma irregularidade e um ato não conforme o espírito da associação. Ao nível penal, estão imputadas, porque podem ter favorecido os atos deste senhor que quis esconder [o dinheiro] nesse lugar onde devia ser enterrado o bispo ou um lugar para guardar dinheiro, com muitas câmeras. Suponho que tratarão de descobrir se cumpriram os motivos pelos quais foi fundada a associação privada de fiéis ou se desviaram e caíram na tentação. Às vezes, o contato com o poder faz cair em coisas não santas.
A investigação conta com o aval da Santa Sé?
O núncio apostólico afirmou que ele informa constantemente a Santa Sé sobre este problema. Isso me parece muito bom, porque os núncios são aqueles que têm a responsabilidade de informar o Papa sobre a realidade das Igrejas particulares. E embora o bispo Agustín Radrizzani seja juiz nisto, tudo chegará ao Vaticano e ao Papa.
Tratando-se de um Papa argentino, terá uma atenção particular neste caso?
Ele conhece muito bem a nossa realidade argentina, conhece a situação e as pessoas envolvidas. Ele conheceu o falecido arcebispo Di Monte e também conhece Radrizzani. Isso o toca muito de perto, mas não o impedirá de agir como pastor da Igreja universal e iluminar o que deve ser iluminado. É um bom caminho o fato de [dom Radrizzani] ter nomeado dois padres para que investiguem, conversem e informem sobre as conclusões.
Qual é o papel da Conferência Episcopal Argentina neste caso?
O presidente (dom José María Arancedo) falou claramente e disse que não existe nenhuma possibilidade de abrir uma exceção à lei, que não existem prebendas por ser religioso, mas se respeita a autonomia local de cada diocese. A conferência não é uma instância maior em relação à atuação de cada bispo. Ele esclareceu que o bispo responde perante o Papa, não perante a Conferência Episcopal, que é um órgão de comunhão e de colaboração pastoral.
Esta situação afeta muito a imagem da Igreja?
Muitas vezes, a mídia não comunica as coisas boas com força e isto me dá muita pena, porque existe tanta vida religiosa santa, tantas irmãs e irmãos que acompanham muitíssimos doentes, pobres, que padecem o flagelo da droga, dos sem teto, dos anciãos e das crianças. Essa é a vida religiosa argentina, não estas três irmãs que, por ingenuidade ou torpeza, cometeram esse erro. Suponho que, em seu coração, estejam arrependidas porque se equivocaram. Que não se obscureça a beleza desta obra.
O que dizer aos fiéis desconcertados e preocupados?
Em primeiro lugar, que a verdade tem uma força esplendorosa e faz muito bem, embora doa. Trata-se de buscar caminhos de transparência. Ninguém está acima da lei, ninguém escapa da justiça. Nem a Igreja. Se existem suspeitas, que se investigue e que se estude.
Por outro lado, somos todos homens e mulheres com falhas, com pecado e possibilidade de nos equivocar. Não somos Deus, não somos imaculados, cometemos falhas, somos frágeis e pecadores. Que rezem pelos consagrados, por todos nós e que chamem a atenção quando devam fazê-lo, mas que não coloquem todos no mesmo saco.
Se um médico comete uma ação má não são todos os médicos que são maus. Se uma pessoa na Igreja comete um erro, embora seja grave, não é toda a Igreja que é má. Obviamente, sofremos, e como dizia Santo Agostinho, a Igreja é santa e pecadora, porque é formada por nós que somos pecadores.
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Argentina. “As irmãs do escândalo deveriam pedir perdão” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU