Por: André | 27 Junho 2016
“Fará bem a todos comprometer-se a sentar as bases de um futuro que não se deixe absorver pela força enganosa da vingança”. A Praça da República é um símbolo imponente da transformação de Erevan, que passou de uma pequena cidade regional a uma grande metrópole. Desde os anos 1940 até 1992 chamava-se Praça Lênin, devido à gigantesca estátua do líder soviético que se encontrava em seu centro, até que foi demolida. Aqui também aconteceu o último encontro do segundo dia da visita do Papa Franciscoà Armênia. Na presença de milhares de pessoas, o Bispo de Roma e o Catholicos Karekin II se abraçaram e rezaram juntos pela paz.
Fonte: http://bit.ly/28Xayvs |
A reportagem é Andrea Tornielli e publicada por Vatican Insider, 25-06-2016. A tradução é de André Langer.
No começo da cerimônia, o Papa e Karekin II, que acabavam de aterrissar após o voo de Guiumri, atravessaram a pé a praça lado a lado e iam abençoando a multidão. Em sua saudação, Karekin II recordou que “há algumas décadas, nós saudávamos o Terceiro Milênio com a esperança de que seria o início da convivência na solidariedade entre as nações” e da paz. Ao contrário, “atualmente, recebemos notícias preocupantes de um aumento das atividades bélicas e dos atos de terrorismo, do indizível sofrimento humano e de perdas irreparáveis. As crianças, os adolescentes, as mulheres e os idosos em diferentes partes do mundo, de diferentes nacionalidades, religiões e confissões, são vítimas de armas mortais e da violência brutal ou escolhem o caminho dos refugiados”.
Em seguida, Karekin II citou o genocídio armênio, para acrescentar que “também hoje a nossa nação vive na difícil situação de uma guerra não declarada e deve proteger a paz dentro das fronteiras do nosso país a um preço muito grande, além dos direitos do povo do Nagorno-Karabakh de viver em liberdade em seu berço materno”. “Em resposta às aspirações pacíficas do nosso povo – acrescentou o Catholicos –, o Azerbaijão violou o cessar-fogo e começou operações militares na fronteira da República de Nagorno-Karabakh no mês de abril. Aldeias armênias foram bombardeadas e destruídas, soldados que protegiam a paz, assim como crianças em idade escolar, foram assassinados e feridos, civis pacíficos e desarmados foram torturados”.
Quando tomou a palavra, o Papa Francisco repetiu seu agradecimento a Deus pela “real e íntima unidade” entre a Igreja católica e a Igreja apostólica armênia: “O nosso encontro não é um intercâmbio de ideias, mas de dons”. Francisco disse que vê com confiança “o dia em que, com a ajuda de Deus, estaremos unidos junto do altar do sacrifício de Cristo, na plenitude da comunhão eucarística”, uma “meta tão desejada”.
Bergoglio também recordou todos os mártires que “selaram com o sangue a fé comum em Cristo: são as nossas estrelas no céu, que brilham sobre nós e indicam o caminho que nos falta percorrer na terra, rumo à plena comunhão. Entre os grandes Pais, desejo mencionar o santo Catholicos Nerses Shnorhali. Ele manifestava um amor extraordinário por seu povo e suas tradições, e, ao mesmo tempo, estava aberto às outras Igrejas, incansável na busca da unidade, desejoso de realizar a vontade de Cristo: que os crentes ‘sejam um só’. E para alcançá-la, segundo São Nerses, não basta “a boa vontade de alguém na Igreja: é indispensável a oração de todos”.
Somente a caridade, prosseguiu o Bispo de Roma, “é capaz de sanar a memória e curar as feridas do passado: só o amor apaga os preconceitos e permite reconhecer que a abertura ao irmão purifica e melhora as próprias convicções. Para o santo Catholicos, é essencial imitar, no caminho rumo à unidade, o estilo de amor de Cristo, que ‘sendo rico’, ‘humilhou-se a si mesmo’. Seguindo seu exemplo, somos chamados a ter a coragem de deixar as convicções rígidas e os interesses próprios de lado, em nome do amor que se abaixa e se dá, em nome do amor humilde”. De fato, “nem os cálculos nem os interesses, mas o amor humilde e generoso atrai a misericórdia do Pai” para suavizar “a dureza dos corações dos cristãos, também daqueles que, às vezes, estão fechados em si mesmos e em seus próprios benefícios”.
“Quão grandes são, hoje, os obstáculos no caminho da paz e quão trágicas são as consequências das guerras! Penso – indicou Francisco – nas populações forçadas a abandonar tudo, de modo particular no Oriente Médio, onde muitos dos nossos irmãos e irmãs sofrem violência e perseguição por causa do ódio e de conflitos, alimentados sempre pela praga da proliferação e do comércio de armas, pela tentação de recorrer à força e pela falta de respeito à pessoa humana, especialmente os fracos, os pobres e os que pedem apenas uma vida digna”.
O Papa referiu-se novamente aos massacres que o povo armênio sofreu há 100 anos. “Não deixo de pensar nas terríveis provas que seu povo experimentou. Passou um século do “Grande Mal” que se abateu sobre vocês. Esse ‘extermínio terrível e sem sentido’, este trágico mistério de iniquidade que seu povo experimentou em sua carne, permanece impresso na memória e arde no coração. Quero reiterar que seus sofrimentos são nossos: ‘são os sofrimentos dos membros do Corpo Místico de Cristo’; recordá-lo não é apenas oportuno, mas necessário. Que sejam uma advertência em todo tempo, para que o mundo não volte jamais a cair na espiral de tais horrores!”
Mas, Francisco também convidou para fazer que a “memória, perpassada pelo amor”, seja capaz de “tomar caminhos novos e surpreendentes, onde as tramas de ódio se transformem em projetos de reconciliação, onde se pode esperar em um futuro melhor para todos, onde são “felizes os que trabalham pela paz. Fará bem a todos se comprometer para sentar as bases de um futuro que não se deixe absorver pela força enganosa da vingança; um futuro, onde não nos cansemos jamais de criar as condições para a paz: um trabalho digno para todos, a solicitude pelos mais necessitados e a luta sem trégua contra a corrupção, que deve ser erradicada”.
O Papa convidou os jovens para se transformarem em construtores da paz e manifestou seu desejo de que “se retome o caminho de reconciliação entre o povo armênio e o povo turco, e possa a paz surgir também no Nagorno Karabakh”.
Para concluir, Francisco saudou os armênios enviando-lhes um abraço, a todos os armênios da diáspora, e pediu-lhes que sejam “mensageiros deste desejo de comunhão, ‘embaixadores de paz’”. “O mundo inteiro precisa deste seu anúncio, precisa desta sua presença, precisa do seu testemunho mais puro. Kha’ra’rutiun amenetzun! [A paz esteja com vocês!]
O Catholicos também recordou os novos países que aderiram para condenar “o genocídio armênio, entre os quais está a Alemanha, que era aliada da Turquia durante a Primeira Guerra Mundial”. Também afirmou: “O nosso povo agradece a Sua Santidade e a todos os que apóiam e defendem a justiça, e espera que a Turquia, após Sua mensagem e a pedido de muitos países, assim como das instituições internacionais, saiba demonstrar muita coragem para encarar sua história, para acabar com o embargo ilegal contra a Armênia e cessar o apoio às provocações militares do Azerbaijão”.
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“Comprometamo-nos com um futuro sem a força enganosa da vingança” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU