24 Setembro 2015
“Por mais que exista um crescimento de energias renováveis no país, o acesso a essa energia não é garantido nos municípios produtores, porque o valor dessa energia é elevado e as comunidades que se localizam próximo das empresas não recebem benefícios”, afirma o sociólogo.
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Segundo ele, na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por telefone, a expansão dos parques eólicos para os municípios pobres também está associada a um “falso discurso” de aumento de empregos e superação da dependência de arrecadação dos munícipios do estado e da União. Contudo, alerta, “depois de 10 anos de produção de energia renovável no litoral, não houve melhora no ritmo das arrecadações, ou seja, não estamos vendo transformações significativas desses investimentos nos municípios produtores”. Segundo ele, ao longo da última década, não foram produzidos ou divulgados dados que comprovem “mudanças nas condições de acessibilidade aos bens públicos como saúde, educação, alteração da infraestrutura dos municípios” em função dos investimentos de energia eólica nesses municípios.
Ângelo Magalhães da Silva frisa ainda que a população dos municípios não é beneficiada com a produção de energia e tampouco tem acesso à energia mais barata. “Toda essa energia ingressa no sistema nacional de energia e é comprada por empresas que têm participação na própria produção de energia. Então, é uma energia renovável, mas não há nenhum retorno dessa energia para as funções sociais que estão ligadas à sua consolidação, ou seja, as comunidades não recebem um barateamento da energia renovável”. Segundo ele, também não existem dados que indiquem o consumo dessa energia. “O discurso é de que a energia que as pessoas estão utilizando é a do parque eólico, mas não há como constatar isso através de dados a fim de verificarmos, porque depois que a energia entra na rede ela é distribuída, ficando difícil localizar o real destino dela. O maior consumidor interno da energia eólica não é quem precisa, são as empresas que usam o mercado de energia como elemento de competitividade. A energia eólica é cara porque a sua produção se dá em função dos mecanismos de regulação do mercado, ou seja, via os leilões realizados pelo Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica – Proinfa, os quais não visam o beneficiamento da população, mas a negociação nos mercados de energia”, conclui.
Ângelo Magalhães da Silva é licenciado e mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. É doutor em Ciências Sociais na área de Política, Desenvolvimento e Sociedade pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da mesma universidade. É ainda professor adjunto de Sociologia da Universidade Federal Rural do Semiárido – UFERSA.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - O que suas pesquisas têm verificado sobre os parques eólicos instalados em 18 municípios do Rio Grande do Norte?
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Ângelo Magalhães da Silva – Essa pesquisa foi aprovada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq e envolve duas universidades, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN e a Universidade Federal Rural do Semi-Árido - UFERSA, e oito pesquisadores. Nosso objetivo é compreender quais são os impactos socioeconômicos dos parques eólicos e já temos algumas constatações. Entre elas, constatamos uma relação entre os governos municipais, as comunidades e as empresas de energia eólica, a qual revela uma associação entre economias pobres e estruturas produtivas modernas. Por exemplo, estamos percebendo que há um avanço, ou seja, uma interiorização da produção de energia eólica no Rio Grande do Norte, a qual já ocupa também uma parte significativa do litoral setentrional do Rio Grande do Norte, que faz uma conexão com o litoral do Ceará. Mas essa expansão da energia eólica vem sendo insuficiente para o projeto de expansão da energia eólica no estado. Então, o setor empresarial vem descobrindo, no interior do Rio Grande do Norte, os municípios pobres que ficam mais do lado agreste do estado, ou seja, estão descobrindo terras devolutas, terras sem propriedade formal, terras improdutivas e assentamentos que podem ser negociados. Nesse sentido, está havendo uma migração da energia eólica do litoral para o interior, porque a instalação de parques eólicos na região litorânea é mais cara para as empresas, justamente porque elas têm de disputar capitais com o setor turístico. É por essa razão que elas passaram a investir no interior, onde as terras não são utilizadas para investimentos do turismo.
Inicialmente, quando as empresas passaram a investir em energia eólica no estado, tinham um discurso de que era preciso investir no litoral, porque lá havia vento e as condições necessárias para garantir a produção da energia. Mas esse é um discurso falacioso, porque a energia eólica não vive exclusivamente de vento, mas de um pacote de elementos de competitividade, que envolvem a condição da terra, os mecanismos de mercado, que no caso brasileiro são os leilões, e também – esse é um fato novo que estamos analisando – da deficiência tributária dos municípios em que as empresas se instalam.
“No RN não há desdobramento de cadeias econômicas do ponto de vista da criação de empresas locais” |
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10 anos de investimentos em energia eólica
O discurso das empresas para produzir energia eólica no interior enfatiza a maior arrecadação dos municípios para suprirem as dependências do Estado e da União. As empresas argumentam que, com os parques eólicos, haverá empregos. Mas no Rio Grande do Norte, depois de 10 anos de produção de energia renovável no litoral, não houve melhora no ritmo das arrecadações, ou seja, não estamos vendo transformações significativas desses investimentos nos municípios produtores. O que percebemos ainda é que há uma dependência dos municípios com relação às transferências governamentais e da União. Não temos ainda nenhum dado que comprove que as mudanças nas condições de acessibilidade aos bens públicos como saúde, educação, alteração da infraestrutura dos municípios, ocorrem em função dos investimentos de energia eólica nesses municípios.
Além disso, há um dado que deve ser revelado: por mais que exista um crescimento de energias renováveis no país, o acesso a essa energia não é garantido nos municípios produtores, porque o valor dessa energia é elevado e as comunidades que se localizam próximo das empresas não recebem benefícios. O que se percebe é que as aproximações que as empresas fazem com as famílias mantêm aquele discurso antigo que já percebemos no Nordeste: de que a saída para o desemprego e para a falta de crescimento está em dispor as terras das comunidades para as grandes empresas. Esse discurso do crescimento e da responsabilidade das empresas com as comunidades não se efetiva, porque há empregabilidade no período de instalação dos parques, e há uma transferência dos recursos tributários durante a instalação dos parques, mas depois desse processo o que se vê nos municípios produtores de energia renovável é o aumento da criminalidade, de doenças transmissíveis como HIV, elitização do acesso à terra, falta de mobilidade populacional.
Estrutura econômica moderna e suas condições ambíguas
O que vemos é uma estrutura econômica moderna que opera em condições sociais ambíguas e desiguais. Por isso o discurso de que a energia eólica é barata e de que seremos autossuficientes em energia eólica não revela as contradições que ocorrem nos municípios, porque eles continuam pobres. Esse discurso de atrair os projetos de energia eólica para os municípios não revela que a terra, nesses municípios, será mais cara, que a especulação imobiliária será crescente.
A terra é o principal fator que faz com que as empresas migrem para o interior e é isso que determina o impacto da energia eólica. Percebemos que essas empresas têm estratégias diferentes para se instalarem, de acordo com a condição do uso da terra: quando elas se deparam com assentamentos de camponeses, a negociação exige mais habilidade das empresas, porque estão lidando com grupos organizados. Mas quando a estratégia consiste em comprar terra de camponeses ou de uma família que tem casa na cidade e uma pequena fazenda no interior, o discurso é diferente: de um lado, argumentam que é preciso regularizar a terra para vendê-la e, de outro, junto com a prefeitura, dizem que a terra não é propriedade das famílias e deve ser desapropriada para o uso da energia renovável.
O que ocorre no Rio Grande do Norte é uma clássica manifestação de acumulação de capital realizada pelas empresas, governos municipais e camponeses ou proprietários. Ou seja, são formas antigas de acumulação que ganham características novas no capitalismo moderno através da especulação, da espoliação fundiária e da despossessão da terra.
Desdobramentos econômicos
No aspecto econômico, no Rio Grande do Norte não há desdobramento de cadeias econômicas do ponto de vista da criação de empresas locais para atender os quase 90 parques eólicos que existem. Ou seja, não há nenhum desdobramento desses parques na criação de novas empresas nos municípios, não há a criação de uma dinâmica de serviços e comércios em função desses parques, que poderiam transformar a vida das pessoas que vivem nesses municípios. Ao contrário, essa energia, que é moderna e competitiva, tem sua manutenção feita por empresas que são de fora dos municípios. A estrutura física dos cata-ventos é composta não por uma gestão municipal, mas porque alguns municípios são ricos em calcário e por conta disso conseguem produzir a estrutura do cata-vento, mas a estrutura tecnológica do aerogerador vem de fora. Somente no Ceará há um desdobramento desse tipo de investimento, e lá já surgiram empresas competitivas, modernas, que são resultado do investimento em energia eólica e fotovoltaica, que deram uma nova dinâmica ao estado do Ceará.
“O discurso de que a energia eólica é barata e de que seremos autossuficientes em energia eólica não revela as contradições que ocorrem nos municípios” |
IHU On-Line – Como funciona a instalação dos parques em relação ao uso da terra? Os proprietários arrendam as terras ou elas são compradas pelas empresas?
Ângelo Magalhães da Silva – Eles arrendam as terras e recebem de 2 a 5 mil reais por cata-vento instalado, mensalmente, dependendo da área em que cada parque será instalado. Então, a negociação de compra e venda depende da infraestrutura que existe próximo aos parques, como por exemplo, estradas, rodovias federais, distribuição de gás, turismo. Com isso estou querendo dizer que as negociações variam de acordo com a localização das terras e as condições de competitividade que envolvem a condição fundiária da terra. Esse valor de 2 a 5 mil dá-se em função do tamanho da terra, da condição dela, do fato de ela estar regulamentada ou ser uma terra devoluta, em função da condição morfológica, se permite mais ou menos vento, em função da proximidade com a comunidade, etc.
Os parques de energia eólica estão cada vez mais próximos das comunidades, ou seja, de onde as pessoas moram. A literatura mostra que o impacto dos parques gera descaracterização na migração das aves, morte das aves, além de ruído, mas nada disso é levado em consideração durante a construção dos parques. Ao contrário, se diz que eles não têm ruídos, e o principal discurso das empresas se dá na comparação da produção de energia eólica com energias que poluem de forma absurda. Esse tipo de comparação não pode ser feito porque estamos falando de uma energia que tem outras finalidades e que ocupa um território em outras condições. O impacto, nesse caso, é social.
IHU On-Line – Quais as condições nefastas desses parques?
Ângelo Magalhães da Silva – Durante a instalação, primeiro, a proliferação de doenças sexualmente transmissíveis – o que já consta em pesquisas de mestrado -, depois, desemprego gerado após a instalação dos parques. Outro fator negativo é a dependência parcial que os munícipios passam a ter, durante a instalação, da tributação de circulação de qualquer mercadoria. Durante o processo de manutenção da energia, o município não tem nenhum controle sobre a arrecadação, ou seja, dos tributos que derivam da comercialização da energia eólica. Outro fato diz respeito ao crescimento da especulação imobiliária nos municípios que têm energia eólica. Além disso, temos dados compartilhados pelo Ministério Público e pelas procuradorias de meio ambiente, da invasão de 20% de área de preservação ambiental permanente. Tenho dados que não posso divulgar agora, de empresas que estão respondendo a processos judiciais porque seus parques eólicos estão instalados em áreas de preservação ambiental. No polo Costa Branca, que fica no litoral setentrional, num território que envolve cinco municípios, já há 20% de área de preservação permanente ocupada, sendo que essas áreas não podem ser ocupadas para atividades econômicas.
Outro problema é o seguinte: para onde irão, depois de 20 ou 30 anos, os resíduos sólidos desses equipamentos dos cata-ventos? Essas torres irão virar sucata e as paisagens que hoje são bonitas vão virar centros de sucatas. Como as empresas se responsabilizarão por isso? As empresas não têm uma prática sociocorporativa e ambiental nas regiões em que estão instaladas. Elas se aproximam das escolas e das famílias com um discurso de que a energia eólica é fundamental, se apropriando de duas grandes instâncias que são estratégicas para o grande capital: a escola e a família. Pela escola, fazem o trabalho de alienação e convencimento de que é possível e necessário que se legitime a energia renovável e, pelas famílias, as convencem a disponibilizarem suas terras para o uso de energia eólica. É uma falta de conscientização, que não tem nenhuma responsabilidade social.
A responsabilidade social que as empresas realizam nos município se limita a encontros com as escolas, que são convidadas a visitarem os parques. O discurso da empresa é o de dizer que a energia renovável irá gerar renda no município, e que o emprego e a renda serão permanentes, quando na verdade crescem os empregos informais e sazonais durante a instalação dos parques. Ao mesmo tempo essa dinâmica esconde os efeitos posteriores da instalação dos parques: a diminuição do emprego e o aumento da especulação imobiliária.
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“Empresas estão respondendo a processos judiciais porque seus parques eólicos estão instalados em áreas de preservação ambiental” |
IHU On-Line – Há possibilidade de gerar empregos em função da manutenção dos parques? O que dificulta a criação de uma rede econômica que preste esse tipo de serviço na região?
Ângelo Magalhães da Silva – O maior índice de empregabilidade se dá na instalação do parque. Até aí parcialmente ocorre uma intervenção municipal, mas a manutenção posterior não é feita por empresas do município, e sim por empresas internacionais que não têm sede no Rio Grande do Norte, que vêm para o estado e em um mês fazem a manutenção de todos os parques. Depois disso, o acompanhamento dos parques é feito por um número muito reduzido de engenheiros.
Em contrapartida, as empresas dizem que não absorvem a mão de obra local para fazer a manutenção permanente dos parques, porque ela não é qualificada. Mas temos, no Rio Grande do Norte e no Nordeste, diversas universidades que formam engenheiros de energia. Mas os polos preferem contratar empresas que têm expertises e estão instaladas fora do Estado. A manutenção dos parques não é feita pelo conhecimento produzido localmente. No Ceará, ao contrário, isso já acontece, porque eles estão mais avançados.
Apesar disso, o que permitiu a presença da energia eólica no Rio Grande do Norte foi a estrutura logística já existente e criada pelo petróleo, pelo turismo, por uma estrutura produtiva primária que facilitou o acesso das empresas ao litoral.
Outra questão polêmica é o destino dessa energia: ela não é destinada ao consumo local, comunitário, e tampouco se fala em reduzir o preço da energia para municípios em que a energia é gerada; ao contrário, toda essa energia ingressa no sistema nacional de energia e é comprada por empresas que têm participação na própria produção de energia. Então, é uma energia renovável, mas não há nenhum retorno dessa energia para as funções sociais que estão ligadas à sua consolidação, ou seja, as comunidades não recebem um barateamento da energia renovável. Ao invés disso, trata-se de uma energia que se torna muito cara e não consegue ser moderna ou dinâmica para as populações que precisam de uma energia mais barata.
Não há nenhum dado que indique que uma parte desses municípios consuma energia eólica. O discurso é de que a energia que as pessoas estão utilizando é a do parque eólico, mas não há como constatar isso através de dados a fim de verificarmos, porque depois que a energia entra na rede ela é distribuída, ficando difícil localizar o real destino dela. O maior consumidor interno da energia eólica não é quem precisa, são as empresas que usam o mercado de energia como elemento de competitividade. A energia eólica é cara porque a sua produção se dá em função dos mecanismos de regulação do mercado, ou seja, via os leilões realizados pelo Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica – Proinfa, os quais não visam o beneficiamento da população, mas a negociação de energia nos mercados de energia.
O Brasil é um mercado promissor de energia eólica porque seu consumidor é intracorporativo, ou seja, se produz energia eólica barata e quem vai consumir essa energia são as grandes corporações, as empresas que compram energia no mercado de energia, mas essa energia não é destinada à sociedade.
“O discurso da empresa é o de dizer que a energia renovável irá gerar renda no município, e que o emprego e a renda serão permanentes, quando na verdade crescem os empregos informais e sazonais durante a instalação dos parques” |
IHU On-Line – Como se dá a distribuição dessa energia na rede?
Ângelo Magalhães da Silva – Ela entra na rede elétrica pelo operador nacional, mas pode ser adquirida pelas empresas que compram energia elétrica no mercado. O mercado de energia elétrica no Brasil é um mercado aberto, livre de concorrência e regulado parcialmente pelos leilões. Por exemplo, uma empresa que trabalha com produção de cana-de-açúcar pode comprar uma parcela de gigawatts dos Parques Eólicos, ou os Parques podem produzir energia e distribuir diretamente da fonte do parque nas bolsas de ações; é uma negociação empresarial.
O que quero dizer é que as comunidades, os 18 municípios que estamos estudando, estão formalmente envolvidos com a atividade de energia renovável. Esses municípios não sofreram alterações na sua estrutura produtiva e muito menos na distribuição e no consumo de energia que é resultado da expansão da energia eólica. Ao contrário, o que resulta da energia eólica nos municípios é uma redefinição do mercado de terras, em que se beneficia a parcela da população que tem terras. Alguns municípios têm suas receitas acrescidas, mas por um tempo muito exíguo, muito pequeno, e mesmo aqueles municípios que têm parcialmente suas receitas elevadas pela energia renovável não demonstram, segundo as nossas pesquisas, mudanças. Ao contrário, são 18 municípios pobres que continuam dependentes das transferências governamentais. Ou seja, a atuação das corporações que fabricam energia não se desdobra em questões econômicas locais.
Não tem sido possível regular essa situação porque não há cultura ou movimento político que determine o controle da produção dessa energia e tampouco a forma como ela deve ser utilizada. Em outros países, na Espanha, por exemplo, há um controle da energia e da água pelo Estado, pelas comunidades e pelas empresas que produzem energia. No Brasil, ao contrário, temos uma falta de consciência política sobre o que é energia renovável, o que é sustentabilidade, e após a concessão e a contratação da terra para produção de energia renovável, a comunidade fica à mercê do ritmo dessas energias.
Um dado interessante: é sabido que a produção de petróleo é feita através dos cavalos mecânicos, que geram uma área de devastação já medida pela própria Petrobras. O sistema de energia eólico é muito parecido, porque cria uma área devastada que, em seu somatório, chega a ser bastante elevada - não tenho o dado de área devastada porque ainda estamos analisando. Mas essa área passa a ser de uso privado, é feito o cercamento das terras e são criadas novas vias de acessos, as quais são de uso exclusivo para a empresa que produz energia eólica.
Nós ainda não conseguimos detectar quais são essas famílias envolvidas nesse processo e como estão lidando com isso, mas há uma coerção sutil por parte das empresas, que necessitam de fazendas, terras e áreas ambientalmente protegidas, há uma coerção das empresas perante as prefeituras e há uma coerção entre empresa e prefeitura com relação às famílias.
Outro dado é que essa contratação de terras para uso da energia eólica impõe limites à produção agrícola dos camponeses, ou seja, no momento em que se instala a energia eólica, há um contrato entre os participantes que diz que não será possível desenvolver atividades econômicas na área, ou seja, não poderá desenvolver a agricultura de subsistência, a pecuária, a caprinocultura, nem desenvolver outra atividade paralela sem a autorização da empresa. Portanto, há um processo claro de despossessão e espoliação. Acredito que essas questões ligadas ao Rio Grande do Norte serão expandidas como estratégias corporativas para o Nordeste.
“A contratação de terras para uso da energia eólica impõe limites à produção agrícola dos camponeses” |
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IHU On-Line O senhor mencionou que foi verificado um aumento no índice dos casos de HIV. Qual a relação entre a instalação dos Parques Eólicos e o aumento dos índices da doença?
Ângelo Magalhães da Silva – Essa informação consta numa pesquisa de mestrado de um aluno do Observatório, que constatou, segundo entrevistas com moradores dos municípios locais do litoral, que após a instalação dos parques eólicos o índice de HIV cresceu. Essa é uma informação que não está baseada num dado oficial, porque foi obtida através de entrevistas com líderes locais, assistentes sociais, pedagogos e as comunidades. Há informações correntes que a transmissão do HIV foi feita através de um trabalhador infectado, que trabalhava no parque eólico e veio de fora do estado, e ele teria transmitido a doença para alguns moradores locais.
Além disso, as pesquisas mostram que o índice de gravidez entre jovens é muito alto e crescente. As entrevistas que esse mestrando fez com membros dos postos de saúde local revelam também um crescimento das doenças infectocontagiosas. Nós ficamos muito espantados com esses dados, mas tivemos de relativizá-los, porque ainda não sabemos se essas doenças infectocontagiosas estão se expandindo para os 18 municípios. Com certeza há um impacto nas condições de saúde pública local nas cidades, que já são decadentes. O que se verifica, de fato, é um crescimento da violência, com roubos de carros e motos, porque a dinâmica da instalação envolve uma logística muito rápida na cidade.
Por Patricia Fachin
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Rio Grande do Norte: um polo de negociação energética? Entrevista especial com Ângelo Magalhães da Silva - Instituto Humanitas Unisinos - IHU