17 Setembro 2013
"Há necessidade de política. Ou, melhor, de grande política e de grandes líderes, não de ocasionalismo e improvisações, em um mundo em que a Alemanha monetarista corta o galho onde está sentada, e os Estados que importam se enfrentam como impérios".
A reportagem é de Bruno Gravagnuolo, publicada no jornal L'Unità, 07-09-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Mensagem forte e "clássica" de Massimo Cacciari (geofilósofo, estudioso de teologia política, pensador da "Krisis") no "Festival da Política" de Mestre, na Itália. E o coração da mensagem – inesperada, dada a recente rejeição da palavra "esquerda" por parte do filósofo – é precisamente esta: restituir ao Político a sua "autonomia". Mas inervada em organizações de massa, composta por interesses, valores e competência.
Portanto, nada de populismos e de lógicas de marketing ("[Matteo] Renzi é bom e agrada – diz Cacciari –, fez-se por si mesmo, mas não se importa com o partido, o que é uma loucura. Nem se entende que país ele tem em mente..."). Nada de populismos. E nada de "nostalgias".
Eis a entrevista.
O destino da Política já está marcado, nas garras de populismo, economia global e fundamentalismo?
Não, a Política ainda é central e indispensável no mundo global. Contanto que se volte a pensá-la como fulcro autônomo de uma complexidade mais ampla. Como síntese de sistema. O verdadeiro ponto é outro. É o Poder, que se tornou poroso e inapreensível, evasivo. Feito de mil variáveis e interesses. Mas é precisamente por isso que precisamos de política, ou, melhor, de Grande Política, guiada por grandes líderes à altura da complexidade e dos interesses em jogo.
O senhor fala de "líder". Mas, além dos sonhos de Max Weber, vimos muitos sonhos e sempre devotados ao populismo, feroz ou light...
Líderes e liderismo podem ser regressivos e despolitizantes. Foi frequentemente assim no século XX. Mas o verdadeiro líder não é um homem sozinho no comando, mas sim o chefe de uma organização, que por sua vez é um invólucro de interesses e de valores. Obama e Blair não foram simulacros de opinião. Abriram caminho dentro de um aparato de partido. E se adonaram dele com batalhas políticas fortíssimas. Eles são o fruto de uma dura seleção.
Camadas, classes e interesses materiais continuam sendo essenciais para animar um "partido"?
O dado material dos interesses é crucial, como base concreta e critério de orientação para a frente: para deslocar as compatibilidades dadas, um partido é uma parte, capaz de se orientar para o todo. E capaz de transformar as suas ancoragens materiais em pontos de vista gerais e praticáveis. É uma atitude que, antigamente, se chamava hegemonia, mas parece dissolvida.
Como é possível fazer valer uma hegemonia dos dominados quando o vínculo financeiro e de mercado é o imperativo-chave, sob pena da catástrofe?
Esse vínculo sempre houve, mas o seu poder de persuasão nunca foi absoluto. Há falhas e contradições a se percorrer. E alianças a se tecer. Eis o que um partido com visão ampla deveria saber fazer. Caso contrário, recai-se em um gnosticismo barato: o bem contra o mal, de jogos fechados e impenetráveis. Ao contrário, vivemos em um mundo policêntrico, e não dividido entre uma multidão explorada e indistinta, e um capital financeiro igualmente indistinto e invencível. A política de massa deveria ter um ponto de vista científico, estratégico. E um partido deve funcionar como uma multinacional econômica, que sabe onde investir e como.
A esquerda – que o senhor não gosta mais de chamar assim –, esmagada por mercantilismo, hedonismo, "valores" e "direitos", está desprovida de protagonismo e subjetividade...
Sim, mas por quê? Porque passou por cima do nexo entre a parte e o todo, entre interesses a se privilegiar e valores a se defender. Entre particular e geral. No fim, a esquerda se dissolveu no céu dos direitos individuais. Verdade: eu não gosto mais da palavra esquerda. Ela evoca um deslizamento, um fracasso. Um velho bloco social. A velha esquerda não existe mais, esse mundo não existe mais. O nome evoca o antigo.
Mas como chamar esse sujeito, que, embora ferido e incerto, ainda existe?
Como quisermos: força do trabalho ou partido do trabalho. Até mesmo partido democrático podia ir bem. Contanto que fossem postos em foco as características do novo trabalho e o nexo entre democracia e trabalho. Falo das mil formas – materiais e tangíveis – que o trabalho assumiu, incluindo o trabalho de empresa. Fracassamos, porque faltou um partido. Um aparato de conhecimentos especializados e radicado nos interesses.
Chamava-se PCI [Partido Comunista Italiano], mas, goste-se ou não, chegamos ao PD [Partido Democrático], desejado pelo senhor fortemente. O senhor o renega?
O PCI devia ser superado, mas foi uma grande realidade. Ele ainda tem algo a nos ensinar sobre o funcionamento dos partidos. O PD não funcionou, e entre os culpados eu também me coloco. Pensamo-lo como frágil agência de opiniões e confluência de aparatos. Antes, porém, houve a imprevisível vitória de Berlusconi em 1994, e ficamos hipnotizados pelo "inimigo": do ponto de vista organizativo e da agenda política. Jogou-se na defesa, sem projeto: nos gastos públicos e clientelas, justiça, instituições, política industrial, bancos, fisco. Talvez houve uma chance em 2008, com Veltroni, mas ele mesmo não soube converter o resultado eleitoral em um verdadeiro partido.
A seu ver, a Igreja de Francisco, com a sua teologia política, é o único canal de defesa das camadas subalternas no mundo?
Conjugar terra e céu, miséria e redenção, está desde sempre nos fins da Igreja. Por isso, lhe é mais cômodo virar a página nos momentos de crise, como fez de modo incrível com Francisco. A teologia deste papa, por enquanto, é feita de gestos e de acolhida. De inovação na Cúria. O verdadeiro ponto é a relação com a modernidade, o modo pelo qual se pretende "mantê-la sob controle" ou transformá-la. Este pontífice, por enquanto, me parece um herdeiro da Rerum Novarum de Leão XIII, eixo da doutrina social da Igreja. Grande herança de um grandíssimo antecessor.
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A política necessária. Entrevista com Massimo Cacciari - Instituto Humanitas Unisinos - IHU