Por: Cesar Sanson | 15 Março 2013
A ação das mulheres do Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na fazenda Aliança, em Tocantins, de propriedade da família da senadora Kátia Abreu (PSD-TO), denuncia a relação da ruralista com trabalho escravo, crime  ambiental e grilagem de terras. A manifestação ocorreu no dia 7 de  março.
A reportagem é de Marcio Zonta e publicada pelo Brasil de Fato, 13-03-2013.
Em nota divulgada sobre o acontecimento, Kátia Abreu chamou o MST de “movimento dos sem lei” e a Via Campesina, que representa um conglomerado de movimentos sociais do campo na América Latina, de “milícia”.
As  ofensas destinadas aos quilombolas, indígenas, ribeirinhos e camponeses  contrários a seu projeto no campo tem sido constante desde que a figura  da também presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do  Brasil (CNA) ganhou notoriedade na mídia.
Para  pesquisadores de Tocantins este comportamento seria temor da ruralista  pelas várias denúncias que envolvem seu nome em crimes ambientais e  favorecimentos políticos no estado. “Kátia Abreu tem medo da exposição  do seu nome atrelado a desmatamentos e grilagem de terras, justamente  porque está envolvida nessas questões e por isso vive atacando os  movimentos sociais e comunidades tradicionais da Amazônia”, alega o  professor da Universidade Federal de Tocantins, Eliseu Ribeiro Lima.
Os  apelidos de “Miss Desmatamento” e “Rainha da Motosserra”, empregados à  ruralista pelos movimentos ambientalistas expõem, ainda, uma trajetória  política pautada pelos antigos preceitos da União Democrática Ruralista (UDR).  “Essa defesa da propriedade acima de tudo vem com Kátia Abreu desde que  era presidente do sindicato rural do município de Gurupi, em  Tocantins”, comenta Eliseu.
 
Sem-terra
Embora a história política de Kátia Abreu esteja ligada a cargos de direção em entidades de classe, a senadora  não registra seus imóveis rurais em seu nome. A ruralista detém apenas  um registro de propriedade no Instituto de Colonização e Reforma Agrária  (Incra) de Tocantins. Um funcionário da instituição em Palmas,  que prefere não se identificar, disse que a senadora coloca seus bens  rurais em nome de “laranjas, geralmente familiares”.
Para o professor Eliseu,  que estuda a questão agrária na região, a senadora teria uma imensidão  de terras. “São muitos hectares em seu poder em Tocantins e justamente  para não expor isso, Kátia Abreu só tem registrado em seu nome uma  pequena propriedade”, revela.
Segundo Lima, os dados do Incra encobrem, por exemplo, o favorecimento do grupo político local dirigido pelo governador José Wilson Siqueira Campos (PSDB-TO), destinado à senadora. No município de Campos Lindos, ao  norte do estado, o governador teria no final da década de 1990 “grilado  terras e distribuído a preço simbólico entre seus amigos empresários e  parte da família Abreu para beneficiamento de soja na região”, relata o  professor.
Siqueira Campos, governador do estado na época, emitiu um decreto jurando de utilidade pública uma área de 105 mil hectares de terra. Kátia Abreu e seu irmão, Luiz Alfredo Abreu, teriam pagado em lotes de 1,2 mil hectares de terra R$ 8 o hectare.
 
Sem Lei
Outro tema que envolve o nome da família Abreu é o trabalho escravo. A aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC)  do Trabalho Escravo, que estabelece a desapropriação de imóveis rurais  flagrados com funcionários em condições análogas de escravidão, já foi  diversas vezes questionada pela senadora. Kátia Abreu defende que  a expropriação da terra seja apenas depois do julgamento em última  instância, sem a reversão imediata para a reforma agrária.
“Negar  ao proprietário do imóvel o direito de defesa em juízo, especialmente  no caso da exploração do trabalho escravo, determinando a imediata  expropriação do bem, dará ensejo a incontáveis injustiças, em  decorrência, sobretudo, de defecções na correta elucidação dos fatos”,  alega a ruralista.
Quando a PEC do Trabalho escravo foi votada em meados de 2012 pela Câmara dos Deputados, o deputado federal Irajá Abreu (PSD-TO), filho da senadora, foi um dos 57 parlamentares que votou contra.
Em  agosto do ano passado, 56 trabalhadores em condições análogas à de  escravidão foram libertados pela Policia Federal da Fazenda Água  Amarela, de propriedade do irmão da ruralista, André Luis de Castro Abreu, em Araguatins, no Tocantins.
Os  trabalhadores, recrutados no Maranhão, viviam em alojamentos precários,  sem água potável nem fossa sanitária. Eram transportados na carroceria  de caminhão por motorista sem habilitação e cumpriam regime de trabalho  de 10 a 11 horas diárias, com intervalo de apenas 15 minutos para  almoço.
 
Crime ambiental
Ademais, a família Abreu também  estaria envolvida em casos de crime ambiental em Tocantins. Conforme  informações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos  Naturais Renováveis (Ibama) de Palmas, a fazenda ocupada pelas mulheres  sem-terra teria sido embargada em 2010 e os proprietários levados a  julgamento em 2012 por “destruir, desmatar e danificar florestas”.
A fazenda, em nome de Irajá,  também dono de uma empresa de reflorestamento com eucalipto, ainda  teria uma outra infração ambiental que a embargaria novamente em 2011.  Parte do documento emitido pelo órgão especifica: “cortar árvores ou  demais formas de vegetação natural em área considerada de preservação  permanente”. A ruralista e seu filho, Irajá, seriam os principais  opositores de projetos de preservação de biomas, como o cerrado  tocantinense.
Em meados de 2102 ambos pressionaram o governador  de Tocantins para a não aprovação de um projeto que destinava à região  R$ 9 milhões do Fundo Mundial para o Meio Ambiente. As regiões da Serra  da Cangalha, com 16,8 mil hectares, Interflúvio Tocantins-Paranã, com  105,4 mil hectares, e Vale do Rio Palmeiras, de 20 mil hectares,  estariam em risco e seriam beneficiados pelo projeto.
Irajá tentou  persuadir os diversos órgãos competentes ao assunto alegando já existir  no estado de Tocantins 50% de áreas protegidas, citando Reserva Legal e  Áreas de Preservação Permanente. No entanto, ele não mencionou a  diferenciação das Unidades de Conservação de proteção integral em  relação a essas áreas, cuja exigência é mais severa.
Por sua vez, Kátia Abreu argumentou junto ao Ministério de Meio Ambiente que as unidades de  proteção permanente prejudicariam o agronegócio na região, já que parte  das terras produtivas de Tocantins seriam atingidas.