01 Março 2013
Os cardeais norte-americanos já estão todos em Roma. Não só Roger Mahony, decidido a entrar no conclave apesar dos casos de pedofilia no clero de Los Angeles, mas também Timothy Dolan, Sean O'Malley, Donald William Wuerl. Encontram-se no North American College, no Gianicolo, e se dizem prontos para lançar o tema com o qual os "reformadores", muitos cardeais estrangeiros juntamente com alguns italianos, pretendem abrir os jogos do conclave: a reforma da Cúria Romana depois dos escândalos internos filhos de uma governança certamente não impecável.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada no jornal La Repubblica, 28-02-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Pouco depois da última audiência do papa na Praça de São Pedro, o cardeal Julián Herranz, chefe da comissão que investigou o Vatileaks, caminha rápido, óculos escuros como de costume, rumo a Borgo Santo Spirito. Às perguntas sobre o dossiê secreto, ele responde com um seco "no comment", mas já é certo que prestará contas do seu trabalho nas congregações gerais que precedem o conclave. Uma prestação de contas que, se não se deterá sobre os nomes e sobrenomes daqueles que, dentro do Vaticano, remaram contra o papa – durante a audiência, Ratzinger falou de "águas agitadas e vento contrário" –, também não deixará de mostrar a substância de uma Cúria Romana a ser sacudida e refundada totalmente.
No envelope confidencial que Bento XVI deixa selado para o seu sucessor, além do dossiê sobre o Vatileaks há também aquele esboço de reforma da Cúria sobre o qual em 2007 o cardeal Attilio Nicora tentou trabalhar. O esboço, depois, passou para as mãos do ambrosiano Francesco Coccopalmerio, ex-vice do cardeal Carlo Maria Martini e chefe do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, que algumas pessoas gostariam que fosse eleito ao sólio de Pedro justamente em chave reformadora.
A reforma foi congelada até hoje, não só pela progressiva diminuição das energias físicas do papa, mas também por uma resistência de diversos setores da Cúria atavicamente relutantes a mudanças que fariam perder o seu prestígio e privilégios. Uma Cúria em que Nicora e Coccopalmerio foram, nos últimos anos, forasteiros. Não por acaso Nicora, curial entre os mais severos no caminho da transparência e da adequação das finanças vaticanas às normativas antilavagem de dinheiro, foi destituído ao último dos seus dois encargos importantes: o lugar na comissão de vigilância do IOR.
Mas ele também, assim como Coccopalmerio, entrará no conclave. E saberá oferecer apoio aos "reformadores" estrangeiros. Além dos norte-americanos, há também o austríaco Christoph Schönborn, entre os mais acérrimos inimigos da velha Cúria "encobertadora" sobre a pedofilia, e o australiano George Pell que, por calúnias que circularam por conta própria no Vaticano, colocou em risco a sua chegada em Roma como prefeito dos bispos.
O "esboço Nicora-Coccopalmerio" quer desmantelar a estrutura verticalista do Vaticano, aquele gargalo que tem no seu fundo a Secretaria de Estado e dentro do qual nem todas as informações das quais o papa precisaria para governar conseguem passar. Foi Paulo VI, no quinto ano do seu pontificado, que deu à Secretaria todo o poder do qual ela goza agora. Ele o fez porque, tendo trabalhado por anos na própria Secretaria, sabia como geri-la, embora concedendo-lhe espaço de ação.
Mas ele nunca imaginaria que, nos anos de Karol Wojtyla e de Ratzinger, ela se tornaria como que um superministério capaz de decidir estratégias e políticas até mesmo para além do próprio pontífice.
É dos últimos anos o crescente descontentamento dos prefeitos dos nove "ministérios" vaticanos por causa da impossibilidade de dialogar diretamente com o papa e decidir com ele as estratégias a seguir. Tudo passa pelo crivo da Secretaria de Estado e dos seus homens, um crivo que, mesmo que só pela enorme quantidade de trabalho, bloqueia já no nascimento um fluxo de informações que deveria ser natural.
Quando o número dois da Secretaria de Estado era o atual prefeito da Propaganda Fide, o cardeal Fernando Filoni, foi a ele que muitas culpas de mau governo foram imputadas. Tarcisio Bertone, secretário de Estado, substituiu-o por Angelo Maria Becciu, mas certas dificuldades permaneceram. Tanto que, na semana passada, o papa, depois da missa de Cinzas, confidenciou aos cardeais presentes na basílica vaticana o seu próprio pesar por ter falhado na reforma mais importante, justamente a da Cúria Romana.
A necessidade de mudar de rota está totalmente nas palavras de diversos "figurões" do Colégio Cardinalício. Cormac Murphy-O’Connor, ex-arcebispo católico de Westminster, fala da urgência de ter "mais colegialidade, "mais democracia" na Igreja. Propõe um "governo dos bispos", não mais só do papa; em suma, uma solução menos romano-cêntrica. Ele diz: "Não é só o pontífice que governa a Igreja". Mas é "o papa junto com os bispos". E ainda: "Hoje são necessárias renovação e reformas, especialmente no nosso modo de governar".
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Um governo mais colegial: o pacto secreto entre purpurados - Instituto Humanitas Unisinos - IHU