03 Outubro 2012
A presença de Yara Caznok, professora no Departamento de Música da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, nas dependências do Instituto Humanitas Unisinos – IHU já é praticamente uma marca registrada. Sempre linda e jovem, com o sorriso aberto característico, ela apresentou, na tarde de ontem, 02-10-2012, o minicurso “Semânticas do Mistério na Música. Audição comentada de três concertos de Beethoven”, dentro das atividades do XIII Simpósio Internacional IHU Igreja, cultura e sociedade. A semântica do Mistério da Igreja no contexto das novas gramáticas da civilização tecnocientífica.
Yara proporcionou ao público presente uma experiência de encontro, por meio da escuta, com a concepção musical de Beethoven presente no gênero “música pura”, a partir de três concertos para solista (s) e orquestra. Dos três concertos selecionados, dois deles eram para solistas: o Concerto para Violino, em Ré maior Op. 61 (o único para este instrumento escrito por Beethoven), cuja gravação escolhida para o minicurso trazia o som de um violino Stradivarius de 1704, com a jovem intérprete Isabelle Faust, e o 5º Concerto para piano, denominado “Imperador”, em Mi bemol maior Op. 73, tocado pelo pianista romeno Radu Lupu. A terceira obra foi o Concerto Triplo, para piano, violino e violoncelo, em Dó maior Op. 56, em uma gravação mais antiga, em um dos modelos de concepção interpretativa beethoviniana: os solistas eram David Oistrakh (violino), Mstislav Rostropovich (violoncelo) e Sviatoslav Richter (piano), sob regência de Herbert von Karajan.
Foram ouvidos apenas excertos das peças, pois a duração total das três obras não caberia nesse formato de encontro, mas Yara recomendou a todos os participantes que, ao voltar para casa, fossem procurar no Youtube a gravação integral dos concertos e usufruí-los em sua totalidade.
Mas antes de tudo, ela lançou ao público a seguinte pergunta: “O que Beethoven faz neste simpósio? O que ele tem a dizer apenas com peças instrumentais, em que os sons dialogam sem o uso de outros recursos? A resposta vocês darão no final das audições”.
Para contextualizar as obras a serem ouvidas, Yara trouxe uma pequena biografia de Beethoven, que viveu em uma Europa conturbada, entre 1770 e 1827, morrendo aos 57 anos. “Era um músico e compositor sensível aos fatos de sua época. Fazia uma música endereçada ao novo homem, que via a intensidade da vida”. Católico e com uma espiritualidade bem desenvolvida, Beethoven começou a ter vários problemas em função de uma crescente surdez que o acompanhou até sua morte, fazendo com que ele se afastasse socialmente e ficasse cada vez mais retraído.
A professora da Unesp compartilhou com o público trechos do testamento de Beethoven, que sensibilizaram pela confissão da tentação do compositor em suicidar-se. “Ele era um exilado social, viva na solidão imposta pela surdez. Só a arte o amparou; a arte como possibilidade para acreditar na vida com as pessoas”.
E impressiona realmente a genialidade de Beethoven por ter composto tantas peças sendo surdo. Yara explica: “um bom músico não precisa ouvir de fora. Ele não precisa tocar o que compôs no piano para saber se está certo. Ele tem tudo soando internamente”.
A professora realmente ama o que faz. Ela balançava a cabeça com satisfação enquanto ouvia os trechos escolhidos, pedia mais volume e vibrava, com os olhos marejados ao final... Os gestos de Yara são muito significativos, fortes, explicativos. É possível visualizar a música pelas mãos dela. Realmente, é difícil não se emocionar ouvindo as peças.
Para Yara, Beethoven une razão, emoção, sensação e memória. “É tudo e muito mais. Ouvindo-o nos questionamos como é possível? Quando se sai de um concerto, temos energia e vontade de fazer algo no mundo. É uma sensação de alegria, energia e otimismo, de felicidade compartilhada. Beethoven nos faz descobrir capacidades que a gente nem sabia que tinha”, destaca.
Sensações da plateia
Para o professor Egon Fröhlich, é impressionante a história de superação de Beethoven diante da tentação do suicídio. “Ele enfrentou uma vida sofrida, com muito trabalho, para compor estas peças incríveis que ouvimos aqui hoje. Se ele tivesse se matado, ninguém teria composto-as”.
Já os seminaristas do Seminário de Santa Maria, Douglas Carré e Guilherme Schmidt, descrevem a experiência do minicurso como fantástica: “Eu já havia participado de uma oficina com a professora Yara sobre Bach e gosto muito dessa dinâmica que liga religião, música, cultura e arte. Foi um momento catártico”, define Douglas. “Me fez sentir vivo, com vontade de viver. Em um mundo com tanto barulho e porcarias auditivas, tivemos uma oportunidade sublime e subimos ao céu nesta tarde”, descreveu Guilherme.
Texto de Graziela Wolfart. Fotos de Natália Scholz
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Música para enfrentar o mundo e agir em comunidade - Instituto Humanitas Unisinos - IHU