Por: Jonas | 25 Julho 2012
Ficará gravada, na vida de Aída Robles (foto) e na história do Paraguai, a ocasião em que somente ela votou contra o julgamento político de Fernando Lugo e que 76 deputados votaram a favor. Uma frente a 76, sentindo impotência e desilusão. Iniciava-se, assim, no último dia 21 de junho, a destituição do mandatário, que chegaria ao desfecho final no dia seguinte, no Senado, com outra votação escandalosa: 39 legisladores disseram sim ao julgamento político, três se opuseram. “Doeu muito, como você pode imaginar. O nível de acusação dava vergonha, não havia provas, nada contundente”, afirmou Aída Robles, pelo telefone, com um tom que se elevou quando disse “vergonha”, relembrando o julgamento realizado em 24 horas e que mudou drasticamente o rumo político de seu país. Responsabilizaram Lugo pelo massacre de Curuguaty quando a investigação sobre esse trágico fato ainda estava em curso.
A reportagem é de Mercedes López San Miguel, publicada no jornal Página/12, 23-07-2012. A tradução é do Cepat.
Aída Robles recorda que foi convencida por suas companheiras da associação das enfermeiras a encabeçar a lista de deputados pelo Departamento Central. Durante 28 anos, Robles trabalhou no Hospital de Clínicas e foi dirigente sindical das enfermeiras em épocas de ditadura stronista. “Aída se destacou por ser combativa, por denunciar a falta de insumos e hospitais nas cidades departamentais e que os salários eram muito baixos. Estávamos lutando nas ruas”, afirma Antonio López, dirigente da Central Nacional de Trabalhadores, uma das quatro centrais sindicais importantes do Paraguai. López sublinha que essa luta não foi em vão. “Atualmente, o salário das enfermeiras está melhor e há mais verbas para a saúde”.
Robles, de 58 anos, mãe e avó, ganhou uma cadeira, em 2008, pelo Partido Popular Tekojoja, liderado pelo senador Sixto Pereira. Hoje, esta mulher ocupa uma cadeira pelo Partido de Participação Cidadã, um agrupamento de esquerda de recente criação. Ambos partidos fazem parte do conglomerado Frente Guazú, que apoiou a candidatura de Fernando Lugo, em aliança com o tradicional Partido Liberal Radical Autêntico. A legisladora atribui à falta de experiência política dos movimentos de esquerda o fato de conseguirem apenas quatro cadeiras no Congresso – a sua com os Deputados e mais três no Senado, incluindo a de Sixto Pereira. “Teríamos que ter montado uma lista única para que haja uma maior representação da esquerda. Tivemos a nossa falha na falta de unidade e de experiência política.” Sem hesitar, Aída Robles também destaca que não esperavam a atitude desleal dos liberais, sem bem que se entende, olhando para trás, que foi atípica e cada vez mais espinhosa a aliança com eles. “O Partido Liberal é a segunda força do país depois do Partido Colorado. Há tempo os liberais vêm dando sinais de que não aceitavam os cargos que tinham e travavam projetos do governo. Até que viraram contra Lugo, junto com os colorados.”
Um desses maus sinais dado pelos liberais foi sua permanente rejeição em aprovar o Imposto de Renda Pessoal, que aprovaram sem titubear, após a saída de Lugo. Outra iniciativa impulsionada por ele, hoje ex-presidente, que foi freada no Congresso, é o ônus à exportação de soja, medida resistida por grupos econômicos que tinham forte vinculação com os legisladores.
A destituição de Lugo foi um plano bem elaborado. Antes, vinte e três vezes tentaram levar o presidente a julgamento político. Robles lamenta que se tenha freado um governo que vinha aplicando políticas em favor dos setores mais necessitados. Um exemplo é o Programa de Transferências de Rendas Condicionadas, uma assistência que se oferece à mãe quando apresenta a carteira de vacinação e a matrícula de seu filho na escola. Outro plano social se chama Programa Tekopora (viver bem), que almeja garantir alimentos, saúde e educação para a população pobre da cidade e das áreas rurais. “A partir do governo de Lugo os setores populares puderam aceder à saúde de forma gratuita. As crianças receberam alimentação adequada nas escolas; um copo de leite e um complemento alimentar. Criaram-se planos para as grávidas. Aprofundou-se a ajuda para pessoas de baixos recursos e aos aposentados”, destaca Aída Robles.
A enfermeira, dirigente sindical, e única deputada que votou contra a destituição de Lugo, continuará batalhando de cara com as eleições de abril. “Hoje somos vinte organizações que formam a Frente Guazú. Esperamos chegar a um acordo para montar uma lista única”, disse a mulher que entende de lealdade.
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Aída Robles. A única deputada a votar contra a destituição de Lugo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU