Por: Jonas | 11 Fevereiro 2012
Marie Collins, da Irlanda, foi a única vítima de abuso de menores, por parte dos sacerdotes, que falou sobre o tema no simpósio internacional acontecido na Pontifícia Universidade Gregoriana, entre os dias 6 e 9 de fevereiro, com o apoio do Vaticano.
A entrevista é de Gerard O´Connell e está publicada no sítio Vatican Insider, 10-02-2012. A tradução é do Cepat.
Abusada por um sacerdote aos 13 anos, enquanto era paciente de um hospital infantil, em Dublin, não pôde falar de sua terrível experiência até os 47 anos. Atualmente, casada e com um filho, fez campanha durante muitos anos pela proteção das crianças e justiça para os sobreviventes de abusos sexuais por parte de clérigos.
No dia 7 de fevereiro, falou diante dos bispos de 110 conferências episcopais e superiores de 30 Ordens Religiosas sobre o problema a partir da perspectiva da vítima. Depois de participar de todos os eventos do simpósio, “Rumo à Cura e à Renovação”, ao final, compartilhou suas impressões.
Eis a entrevista.
Você esteve presente durante todo o simpósio. Qual é sua impressão geral?
Vim aqui sem estar segura do quanto era sincero tudo isso, somente com a esperança de que haveria sinceridade. Depois de ouvir conversas, observado reações, escutado os bispos e de participar nas sessões, creio que há, definitivamente, uma mudança de atitude.
Os bispos disseram de forma bastante explícita o que se espera deles. Creio que haja uma mudança de direção a partir da cúpula.
Já parecia ser assim antes, mas assistindo a todos os eventos e escutado tudo, sinto que há uma mudança genuína de direção. Espero não me equivocar.
Vi esta mudança, em particular, ao escutar dom Scicluna ontem (8 de fevereiro). Scicluna não deixou dúvidas a todos os presentes e, especialmente, aos bispos e superiores das Ordens Religiosas sobre quais são as prioridades: a criança é e deve ser a prioridade. Não há espaço para segredos, para o encobrimento, nem para a proteção do acusado. Ele deixou muito claro. E, ao falar sobre a cooperação com as autoridades civis, disse que a denúncia era somente o início: a cooperação deve começar por aí. Senti-me muito animada.
Na entrevista coletiva anterior ao simpósio, da qual eu participei, dom Scicluna admitiu que existem algumas pessoas na Igreja que não concordam com a necessidade de uma mudança e, basicamente, disse que estão equivocadas e que terão que mudar. Pareceu-me algo muito importante. Deu-me esperança. Senti que ele não poderia pôr-se de pé, e dizer o que estava dizendo, se ao menos não tivesse o apoio do Papa.
Depois, ouvi que na entrevista coletiva, após seu discurso, que havia normas no Direito Canônico que permitem que os bispos sejam penalizados, caso forem negligentes, de alguma forma, ao tratar sobre esse tema. Isso também me deu esperança porque não teria sentido introduzir essas diretrizes se, depois, não houver consequências caso um bispo as ignorar.
Definitivamente, tive a impressão de que mesmo que este simpósio não seja organizado diretamente pelo Vaticano, não obstante, ele se encontra por trás e o apoia na sua totalidade.
Então, você volta para casa com a convicção de que a Igreja tem mudado e está mudando?
Sem dúvida, volto para casa com a esperança de que há uma mudança real. Não acredito que tivemos algo assim, há alguns anos, quando recebíamos todo tipo de desculpas: que era a homossexualidade, a sociedade secular, os problemas depois do Concílio Vaticano II (que levaram a cometer todos esses abusos); todas essas desculpas, que lançavam a culpa nos outros.
Então, você pode ver evidenciado, nesse simpósio, uma mudança de atitude e de pensamento na Igreja?
Foi o que pude perceber na noite de terça-feira (7 de fevereiro), durante a vigília de penitência na Igreja, presidida pelo cardeal Ouellet, prefeito da Congregação dos Bispos. No centro da celebração estava o fato fundamental de que a Igreja estava pedindo perdão pelo que fez no passado. Senti, realmente, que não estava apenas pedindo perdão pelo que fizeram os pedófilos, mas também pelo que os próprios bispos fizeram, aqueles que encobriram e protegeram os pedófilos, etc.
Senti que ver isso, nesse contexto, com o apoio do Vaticano, era importante. Muitos sobreviventes, provavelmente, não estão de acordo comigo sobre isso, porém é o que senti.
Mesmo assim, não significa que devemos esquecer o passado, só porque aparentemente estão mudando o rumo e estão começando a fazer melhor as coisas. Ao reconhecer isto, não estamos dizendo que o passado não existiu e que agora podemos esquecê-lo. Ainda é necessário que haja explicações sobre o passado, ainda tem que haver justiça para as pessoas que seguem sofrendo. Jamais diria que, por começar a existir uma nova atitude e as coisas poderem melhorar, podemos esquecer de todo o restante. Jamais!
Acredito, não obstante, que há uma mudança. E creio que se as pessoas como dom Scicluna podem continuar fazendo o que fazem, a mudança também continuará.
Se Dom Scicluna pode falar do modo como você relata, é porque sabe que está refletindo o pensamento de Bento XVI e que conta com o apoio total do Papa.
Esse é o ponto. Ele não poderia dizer as coisas que disse ontem se não contasse com o apoio do Papa, porque foi muito, mas muito claro diante dos bispos sobre as expectativas que há para o futuro e do que não pode voltar a acontecer.
Além disso, quando escutamos o cardeal Levada e os demais cardeais falarem, nesta semana, todos tivemos a sensação de que isto não é simplesmente uma fachada, não é um exercício de relações públicas. É realmente sinal de mudança.
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Em relação ao problema dos abusos na Igreja, uma vítima vê “mudança de direção” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU