17 Janeiro 2012
Apesar da reação epidérmica de grande parte do aparelho partidário e da militância ideológica, entrou definitivamente na pauta do PT a proposta de aliança eleitoral feita pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, com o PSD indicando o nome do candidato a vice-prefeito na chapa a ser encabeçada pelo ministro Fernando Haddad (Educação).
O comentário é de Raymundo Costa e publicado pelo jornal Valor, 17-01-2012.
Kassab já havia falado do assunto com um ou outro petista. A novidade foi tornar pública a oferta. Num primeiro momento, causou perplexidade. Depois o PT passou a desconfiar de uma manobra maquiavélica de Kassab a fim de aumentar seu próprio cacife nas negociações com o PSDB, que anda arredio à manutenção da parceria.
Agora já é possível afirmar: a coligação do PSD é hipótese seriamente analisada na cúpula do PT, ainda improvável mas possível, em especial se o partido chegar à conclusão de que pode vencer no primeiro turno, se disputar aliado a Kassab.
A política de São Paulo, o maior colégio eleitoral do país e principal reduto do PSDB, transita por tempos estranhos.
É manifesta a distensão nas relações do governo tucano de Geraldo Alckmin com a presidente Dilma Rousseff. Prova disso são as "parcerias estratégicas" firmadas pelos dois governos para a execução de programas como o Minha Casa, Minha Vida.
O prefeito Gilberto Kassab, por seu turno, parece convencido de que o projeto de poder do PT ainda tem muito fôlego e que de nada adianta ficar malhando em ferro frio na oposição.
O PT agora se dedica a fazer contas. Por elas, Haddad entra na eleição com cerca de um terço dos votos paulistanos, que é historicamente o desempenho do partido. Mas entra com uma condição de crescimento que outros candidatos petistas não tiveram antes em São Paulo.
Além de ser um candidato mais digerível "à direita", Fernando Haddad conta com um fato novo: pelo menos por enquanto, as pesquisas indicam que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva será um grande eleitor em São Paulo, condição que ele nunca teve antes em relação aos principais líderes tucanos.
A decisão é de Lula. Havia ontem quem se lembrasse da reação de incredulidade do partido ao ser informado de que o candidato do ex-presidente a prefeito de São Paulo era o ministro da Educação, Fernando Haddad.
Nome de fora do aparelho petista, Haddad parecia inviável diante de nomes como os da ex-prefeita Marta Suplicy e dos deputados Jilmar Tatto e Carlos Zarattini - pré-candidatos que já gastaram muita sola de sapato na periferia da cidade nos debates e contatos com a militância.
Aos poucos o PT foi se acostumando com o nome do ministro da Educação - assim como se acostumou com a escolha de Dilma Rousseff ainda em 2009 -, e não restou outra opção a Marta, Tatto e Zarattini, a não ser desistir de disputar a indicação do partido. E não houve a menor comoção na militância petista: mesmo sem digerir a vontade de Lula, ela foi aceita e o PT seguiu em frente.
É difícil para os adversários da aliança evocar razões ideológicas - o candidato a vice-prefeito na chapa de Fernando Haddad seria o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles. Se ele serviu para o governo Lula durante oito anos consecutivos - recorde de permanência no cargo de um presidente do Banco Central (BC) -, por que não serviria como vice-prefeito de Haddad?
Há as razões relativas à campanha. Um exemplo: a mudança repentina de curso que o PT deverá proceder depois de oito anos de dura oposição ao prefeito e ao condomínio presidido pelo PSDB que ele representou até agora. Kassab soube fazer esse percurso com maestria - do PFL ao PSD, passando pelo DEM. Caberia ao marketing petista dar boa explicação aos eleitores.
Também é relativo o fato de Meirelles ser de Anápolis (GO) e só recentemente ter transferido seu domicílio eleitoral.
O ex-presidente do BC estudou e fez sua carreira profissional em São Paulo, antes de mudar-se para os Estados Unidos, em 1996, para assumir uma vice-presidência do BankBoston, no qual já trabalhava desde 1974. Em São Paulo. Mais precisamente na rua Líbero Badaró, onde ficava a sede do banco.
É desse período o envolvimento de Meirelles com a fundação de uma ONG denominada "Viva o Centro", voltada para a recuperação do centro histórico de São Paulo. Seria um exagero, portanto, a afirmação de que Meirelles nada tem a ver com a cidade.
Resta saber a vontade do próprio Meirelles. A trajetória político-partidária recente do ex-presidente do BC é de projetos não concluídos.
Depois que ele deixou de bater ponto no banco americano, ingressou na política como candidato a deputado federal mais votado de Goiás, nas eleições de 2002. Pelo PSDB. Não chegou a assumir o mandato, ao qual renunciou para assumir a presidência do Banco Central no governo Lula, e pediu desfiliação do PSDB.
Na sucessão de Lula, inscreveu-se no PMDB, diante da perspectiva de assumir a vaga de candidato a vice-presidente de Dilma Rousseff. Deu Temer. O PMDB de Goiás acenou para ele com a candidatura ao governo estadual. Meirelles se mostrou indeciso. Agora está no PSD e transferiu o título de eleitor para São Paulo. É o nome capaz de viabilizar a aliança do PT com o PSD, muito embora Kassab tenha dito a Lula que ele poderia escolher o nome que quisesse em sua base de apoio político.
Pode dar em nada, como toda conversa a oito meses da eleição. Mas a corrida eleitoral em São Paulo começa de maneira diferente, ao mostrar dois protagonistas fora do roteiro habitual de PT e PSDB.
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Protagonistas fora de ordem.. PT avalia seriamente aliança com PSD - Instituto Humanitas Unisinos - IHU