28 Novembro 2011
As exportações caem pelo quarto mês consecutivo, a produção industrial já está há 34 meses estagnada e algumas empresas avaliam se fecham ou se se mudam. Ao mesmo tempo, os trabalhadores se rebelam e pedem melhores salários e condições de trabalho.
A reportagem é de Marcelo Justo e está publicada no jornal argentino Página/12, 26-11-2011. A tradução é do Cepat.
A crise mundial está chegando à China. As exportações caíram pelo quarto mês consecutivo, a produção industrial está em seu pior momento em 34 meses e uma onda de conflitos trabalhistas está sacudindo um país que não tem o direito de greve contemplado na Constituição. Nos últimos 10 dias mais de 10.000 trabalhadores na província de Cantão, sul do país, coração das zonas francas do "milagre chinês", pararam suas atividades.
Os rangidos do modelo exportador podem ser sentidos por todos os lados. Por conta da crise da União Europeia, principal destino das exportações chinesas, e do anêmico crescimento dos Estados Unidos, o número de pedidos de compra mostrou este mês a queda máxima desde o começo da crise financeira de 2008. Segundo a Federação de Indústrias de Hong Kong, uma terça parte de suas 50.000 empresas filiadas poderá fechar suas portas ou cortar drasticamente sua produção no final do ano. Em resposta a essa contração da demanda, as empresas estão cortando as horas extras dos trabalhadores, fundamentais para operários que ganham um salário mínimo de 1.500 yuans (cerca de 236 dólares). Segundo a China Labour Bulletin, uma organização independente com sede em Hong Kong, que monitora a situação do trabalho, os operários acrescentam ao seu salário cerca de mil yuans com as horas extras. "Com isso podem viver. Sem isso, não chegam ao final do mês", assinala o porta-voz Geofrey Cothall.
A província de Cantão (Guangdong), unida por um cordão umbilical invisível a Hong Kong, é paradigmática da crise de um modelo baseado nos baixos custos do trabalho. Ponto de partida do Gaige Kaifan (liberalização) de Deng Xiao Ping na década de 1980, o Cantão sofreu uma queda de 9% em suas exportações. No conflito da empresa taiwanesa de calçados Pou Chen, que tem entre seus clientes a Nike e a Adidas, cerca de 7.000 trabalhadores saíram às ruas de Dongguan para exigir que a companhia interrompa a transferência de sua produção para o interior da China e o Vietnã, lugares que podem competir com custos de trabalho menores. Esta transferência começou há cerca de dois anos e vem se acelerando com a crise econômica mundial.
Se a costa leste da China, com suas zonas francas, serviu nas últimas duas décadas para conter a inflação nos países desenvolvidos e gerar uma ilusão de consumo que não correspondia com o estancamento do salário real, hoje o mesmo papel é exercido pelo interior da China e outros países asiáticos. Um empresário têxtil de Hong Kong, Harry Lee, diretor da Tal Apparel, o expressou de maneira contundente: "Se há cinco anos me perguntavam onde criar uma companhia, eu respondia na China em primeiro lugar, na China em segundo lugar e em terceiro lugar também. Isso mudou", disse. A crise não é sentida apenas no setor têxtil. Na histórica Nanjing foram os trabalhadores que fazem a coleta do lixo os que fizeram, em 16 de novembro, dois dias de greve em protesto contra os baixos salários (2.000 yuans) e contra as demoras em fechar um acordo de trabalho.
Este ano pareceu o despertar dos trabalhadores chineses, com uma série de conflitos com multinacionais que levaram a um aumento generalizado dos salários. Na empresa de eletrônicos com mais trabalhadores em nível mundial a taiwandesa Foxconn, provedora da Apple e Iphone, 13 trabalhadores se suicidaram devido às condições de superexploração no trabalho, um fato que provocou um forte escândalo nacional, mudanças na empresa e aumentos salariais de 33%. Greves similares sacudiram a japonesa Honda e outras multinacionais. Longe de uma primeira manifestação de descontentamento no trabalho, fazia parte de uma tendência de toda a década, que passou inadvertida à imprensa ocidental, muito fascinada com o milagre chinês. "A diferença é que no começo da década eram conflitos pela ruptura de condições básicas de trabalho, como o pagamento de salários, e nestes últimos tempos trata-se de uma luta ativa pela melhoria das condições de trabalho e de salário", assinala Cothall.
Outra diferença é a atitude mutante do Partido Comunista. Em 2010, pareceu alentar silenciosamente os conflitos rompendo esse estranho casamento de convivência celebrado nos anos 1980 entre as multinacionais e um governo nominalmente marxista, que em 1982 havia eliminado da Constituição o direito à greve. Esta mudança respondeu a uma tentativa de modificar o modelo exportador para um baseado mais no consumo que, como se sabe, necessita de trabalhadores com poder aquisitivo. O problema é que em troca requer tempo e a China é um gigante com quase 1,4 bilhão de habitantes que tem que responder a necessidades múltiplas e quase sempre urgentes. Desde agosto, o governo está alentando medidas de ajuda às pequenas e médias empresas e se especula que no começo do próximo ano pode ter um relaxamento das taxas de juro que ajudem a contornar a tempestade. O incentivo político é forte. O governo está obcecado pela estabilidade social simbolizada pelo conceito confuciano de harmonia (he xie), central nos discursos dos dirigentes. Com o congresso do Partido Comunista de 2012 à vista, que decidirá a sucessão à atual dupla do presidente Hu Jintao e do primeiro-ministro Wen Jiabao, a estabilidade social será fundamental para uma transição sem sobressaltos. Apesar dos problemas, a economia tem um crescimento de 9%, menor que o esperado, mas invejável para muitos. A dívida social do modelo exportador é, no momento, o tendão de Aquiles.
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A economia chinesa está dando sinais de esfriamento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU