13 Junho 2011
As más notícias sacodem a terceira maior economia do mundo. A fusão do núcleo de Fukushima foi pior do que o anunciado, e o premiê está a ponto de se demitir.
A reportagem é de Rafael Méndez e está publicada no jornal El País, 12-06-2011. A tradução é do Cepat.
O Japão deu demonstrações de sobra de sua capacidade para se levantar da lona. Como Sísifo, obrigado a empurrar uma enorme pedra montanha acima que sempre acabava rolando morro abaixo, o país encara sua enésima reconstrução. Mas o faz cada vez com menos forças e diante de obstáculos sempre maiores.
O tsunami de 11 de março passado deixou a paisagem de uma guerra ao longo de centenas de quilômetros na costa nordeste. Quase dois meses depois do terremoto de magnitude 9 os povoados costeiros continuavam arrasados. Bastava percorrer a rachada estrada da costa – Ishinomaki, Onagawa, Urashuku... – para atravessar a desolação: cidades destruídas como se tivessem sido bombardeadas, prédios reduzidos a pó, barcos nos telhados, carros levados centenas de metros, inclusive quilômetros de seu lugar... Alguns militares usando máscaras revolviam sem muita esperança os escombros enquanto moradores aqui e acolá remexiam suas coisas em busca de algo que poderia ser salvo (os objetos mais valiosos nesses casos eram os álbuns de fotografias).
O tsunami se espremeu nas fozes da costa e alcançou em alguns pontos 30 metros de altura, o equivalente a um prédio de 10 andares. Arrastou povoados inteiros. Há cerca de 15.000 mortos e outros tantos desaparecidos, 10 vezes menos que no maremoto da Indonésia, em 2004. O sistema de alerta do Japão (quase todas as companhias de telefones celulares lançam mensagens de texto com o aviso às vezes só meio segundo antes do tremor) evitou uma tragédia ainda maior.
Mas três meses depois do terremoto, milhares de pessoas continuam em abrigos e o premiê, Naoto Kan, está com os dias contados no posto. O Japão, o país mais endividado do planeta (sua dívida é mais do dobro do produto interno bruto) necessita gastar bilhões para reconstruir cidades inteiras – um comitê de especialistas comunicou que as tarefas podem durar uma década.
Como o definiu o secretário-geral da OCDE, Ángel Gurría, "exatamente quando a economia japonesa começava a decolar, chegou o tsunami". Depois de uma década perdida pela explosão da bolha imobiliária, as grandes companhias japonesas anunciam que 2011 será um ano negro em suas contas. Não apenas têm problemas na cadeia de fornecimento, mas que há ameaças de apagões devido a problemas de fornecimento de energia elétrica pelas crescentes reticências ao seu parque nuclear.
E como se o tsunami já não tivesse sido uma catástrofe com poucos precedentes, se agravou com Fukushima: uma palavra que evoca o pior dos temores. A usina nuclear, com seis reatores e situada praticamente ao nível do mar, está pior do que o Governo do Japão informou durante os primeiros meses. Na terça-feira passada, o Governo enviou ao Organismo Internacional de Energia Atômica (OIEA) um relatório no qual admite que nas primeiras horas os núcleos dos reatores 1, 2 e 3 se fundiram e que possivelmente os recipientes em que o combustível está confinado foram danificados. Isto implica que o combustível está em forma de magma fundido fora do recipiente, uma situação mais grave que a pior previsão feita pelos especialistas no dia das explosões de hidrogênio na central.
O relatório revela que tudo o que o Japão revelou durante semanas ficou aquém do que realmente aconteceu. Quem sabe se a versão oficial era amável porque o Governo e a administradora da central, a Tepco, não sabiam o que estava acontecendo ou porque minimizaram os fatos. Com cada novo dado, o Japão piorou o panorama de Fukushima. Inclusive acaba de duplicar sua estimativa da radiação que vazou, que, inicialmente, disse ser de cerca de 10% da emissão ocorrida em Chernobyl, mas que continua aumentando.
"A magnitude dos danos do combustível é maior do que acreditávamos. Isso nos obriga a analisar algumas coisas com mais detalhe, como a resistência dos recipientes", explica o secretário da agência nuclear da OCDE, o espanhol Luis Echávarri. Este acrescenta que já nem sequer se pode dar como certo que a central tenha resistido ao terremoto inicial, como afirmaram as autoridades japonesas durante mais de um mês, que garantiam que houve apenas um erro de previsão em relação ao tsunami: "Eu não asseguraria que a nuclear suportou perfeitamente o terremoto, mas levará tempo para separar os efeitos do terremoto e do tsunami".
Apareceram isótopos radioativos até 60 quilômetros da central nuclear e dois trabalhadores receberam mais de 500 milisieverts de dose de radiação, mais do dobro do autorizado para a emergência. Os ecologistas pedem que as mulheres grávidas sejam evacuadas e o Japão admite que pode voltar a aumentar a área de exclusão. O efeito Fukushima levou ao desligamento de outras nucleares em zona sísmica, razão pela qual o país tem que rever todo o seu sistema energético. Outro enorme desafio para o país-Sísifo.
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O Japão continua tremendo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU