17 Abril 2011
Membros da Comissão de Verdade que trata dos abusos cometidos durante e depois do golpe de junho de 2009 contra Manuel Zelaya avisam que o governo de Lobo pode acabar sendo denunciado à Corte Penal Internacional.
A reportagem é do jornal Página/12, 17-04-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A Mãe diz "nos damos bem", e o Nobel sorri. Nora Cortiñas, Mãe da Praça de Maio – Linha Fundadora e Adolfo Pérez Esquivel estão juntos na luta pela verdade e a justiça também em Honduras. Ambos trabalham na Comissão de Verdade que foi instalada nesse país um anos após o golpe de Estado contra Manuel Zelaya em junho de 2009.
Afirmam ao Página/12 que os integrantes da comissão estão sendo ameaçados, perseguidos e até atacados. Isso coloca em risco a elaboração de um relatório que deveria ser terminado em outubro deste ano.
O atual governo de Porfirio Lobo não reconhece o trabalho que Cortiñas, Pérez Esquivel, o jurista canadense Craig Scott e a diretora da Comissão de Direitos Humanos do Equador, Elsie Monge, dentre outros, estão realizando, porque seu governo instalou sua própria Comissão da Verdade.
Mas, principalmente, porque o relatório investiga os casos de violações aos direitos humanos durante e depois do golpe. "Se forem confirmados os crimes, valos levar o caso perante a Corte Penal Internacional", afirma o Nobel da Paz argentino.
Eis a entrevista.
Por que vocês decidiram fazer parte da Comissão de Verdade?
Nora Cortiñas – A repressão ao povo hondurenho continua porque o governo de Lobo, um governo constitucional entre aspas, está reprimindo os professores, os sindicatos fortes e os jornalistas. Ele tem um alvo claro: quanto mais combativo é o grupo, mais é reprimido.
Adolfo Pérez Esquivel – Os golpes de Estado na América Latina não podem ser feitos sem o consentimento da embaixada norte-americana. Nos Estados Unidos, eles não têm golpes de Estado porque não há uma embaixada dos Estados Unidos (risos). A derrubada de Mel Zelaya em Honduras é um teste para toda a região. Instalam-se governos com certo teor constitucional, que são apoiados por setores civis e a Suprema Corte em um marco de pseudolegalidade. Mas é um golpe de Estado.
Nora Cortiñas – A comissão investiga e denuncia as violações dos direitos humanos durante o golpe e como consequência do golpe. Visitamos as comunidades de Zacate Grande e La Flor, no departamento de Choluteca. Os que trabalham na comissão recebem ameaças, perseguições, telefonemas intimidatórios. Pedimos apoio para que a comissão siga trabalhando. Queremos que sejam protegidos.
Adolfo Pérez Esquivel – Tivemos duas reuniões importantes. Uma foi com o espaço G16 que é representado por diversas embaixadas, a União Europeia, havia representantes do PNUD (Nações Unidas) e do FMI, em que lhes expusemos a situação para que estejam a par e para que apoiem a Comissão de Verdade. A reunião na Suprema Corte de Justiça nos deixou a sensação de que não vai se encarregar da questão. Ela recebe a informação, mas não quer intervir.
Nora Cortiñas – A Suprema Corte é a mesma que estava quando o golpe ocorreu. Aqui estão todas as ameaças físicas (mostra vários papeis) de cada mês. Uma das pessoas da nossa segurança foi agredida brutalmente.
(O texto sobre o ataque diz: "Março de 2010: Tentou-se sequestrar um membro da equipe de segurança. Viajava em um táxi em Tegucigalpa, perto das 9h da manhã, quando quatro homens armados e sem identificação o abordaram. Os sujeitos o atacaram, causaram-lhe graves feridas na cabeça. Isso fez com que ele perdesse a audição de forma permanente no ouvido direito").
Há denúncias de desaparecidos?
Adolfo Pérez Esquivel – Desaparecidos, assassinatos, torturados em prisões. Há jornalistas agredidos, perseguidos, intimidados.
Nora Cortiñas – É uma intimidação para que não haja mais manifestações.
Adolfo Pérez Esquivel – É um destacamento avançado sobre a democracia na América Latina para impôr as democracias entre aspas, restringidas e inclinados aos centros de poder. Os Estados Unidos instalam mais bases militares ou as ampliam. Vão ampliar a base de Palmarola, em Honduras, com mais efetivos.
Vocês estão em contato com a Frente Nacional da Resistência?
Nora Cortiñas – Esta comissão é autônoma, e tentamos não ter nenhuma relação para que continue sendo independente, para que não haja suspeitas de que temos um partidarismo político.
Uma vez feito o relatório, vocês vão apresentá-lo perante alguma instância judicial internacional?
Adolfo Pérez Esquivel – Perante as Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos, a União Europeia e, logicamente, a todos os órgãos internacionais e hondurenhos. Na situação atual, trata-se de crimes de lesa humanidade. O caso de Honduras se encaixa na competência da Corte Penal Internacional. Se forem constatados os crimes de lesa humanidade, haveria a competência da CPI.
Nora Cortiñas – Não podemos entregar o documento a um governo que é formado por pessoas que deram o golpe...
Adolfo Pérez Esquivel – A grande preocupação do governo é que ele não seja reconhecido internacionalmente. Lobo quer a reincorporação de Honduras à OEA e o reconhecimento das embaixadas. Sabemos que o presidente colombiano Santos convidou Chávez e Lobo para Bogotá. O que aconteceu nessa reunião? Ignoramos. Parece-me muito boa a posição do governo argentino. Se a OEA aceitar Honduras, é uma ameaça para todo o continente. Nisso, a Unasul tem um papel fundamental em favor do estado de direito.
A reportagem é do jornal Página/12, 17-04-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A Mãe diz "nos damos bem", e o Nobel sorri. Nora Cortiñas, Mãe da Praça de Maio – Linha Fundadora e Adolfo Pérez Esquivel estão juntos na luta pela verdade e a justiça também em Honduras. Ambos trabalham na Comissão de Verdade que foi instalada nesse país um anos após o golpe de Estado contra Manuel Zelaya em junho de 2009.
Afirmam ao Página/12 que os integrantes da comissão estão sendo ameaçados, perseguidos e até atacados. Isso coloca em risco a elaboração de um relatório que deveria ser terminado em outubro deste ano.
O atual governo de Porfirio Lobo não reconhece o trabalho que Cortiñas, Pérez Esquivel, o jurista canadense Craig Scott e a diretora da Comissão de Direitos Humanos do Equador, Elsie Monge, dentre outros, estão realizando, porque seu governo instalou sua própria Comissão da Verdade.
Mas, principalmente, porque o relatório investiga os casos de violações aos direitos humanos durante e depois do golpe. "Se forem confirmados os crimes, valos levar o caso perante a Corte Penal Internacional", afirma o Nobel da Paz argentino.
Eis a entrevista.
Por que vocês decidiram fazer parte da Comissão de Verdade?
Nora Cortiñas – A repressão ao povo hondurenho continua porque o governo de Lobo, um governo constitucional entre aspas, está reprimindo os professores, os sindicatos fortes e os jornalistas. Ele tem um alvo claro: quanto mais combativo é o grupo, mais é reprimido.
Adolfo Pérez Esquivel – Os golpes de Estado na América Latina não podem ser feitos sem o consentimento da embaixada norte-americana. Nos Estados Unidos, eles não têm golpes de Estado porque não há uma embaixada dos Estados Unidos (risos). A derrubada de Mel Zelaya em Honduras é um teste para toda a região. Instalam-se governos com certo teor constitucional, que são apoiados por setores civis e a Suprema Corte em um marco de pseudolegalidade. Mas é um golpe de Estado.
Nora Cortiñas – A comissão investiga e denuncia as violações dos direitos humanos durante o golpe e como consequência do golpe. Visitamos as comunidades de Zacate Grande e La Flor, no departamento de Choluteca. Os que trabalham na comissão recebem ameaças, perseguições, telefonemas intimidatórios. Pedimos apoio para que a comissão siga trabalhando. Queremos que sejam protegidos.
Adolfo Pérez Esquivel – Tivemos duas reuniões importantes. Uma foi com o espaço G16 que é representado por diversas embaixadas, a União Europeia, havia representantes do PNUD (Nações Unidas) e do FMI, em que lhes expusemos a situação para que estejam a par e para que apoiem a Comissão de Verdade. A reunião na Suprema Corte de Justiça nos deixou a sensação de que não vai se encarregar da questão. Ela recebe a informação, mas não quer intervir.
Nora Cortiñas – A Suprema Corte é a mesma que estava quando o golpe ocorreu. Aqui estão todas as ameaças físicas (mostra vários papeis) de cada mês. Uma das pessoas da nossa segurança foi agredida brutalmente.
(O texto sobre o ataque diz: "Março de 2010: Tentou-se sequestrar um membro da equipe de segurança. Viajava em um táxi em Tegucigalpa, perto das 9h da manhã, quando quatro homens armados e sem identificação o abordaram. Os sujeitos o atacaram, causaram-lhe graves feridas na cabeça. Isso fez com que ele perdesse a audição de forma permanente no ouvido direito").
Há denúncias de desaparecidos?
Adolfo Pérez Esquivel – Desaparecidos, assassinatos, torturados em prisões. Há jornalistas agredidos, perseguidos, intimidados.
Nora Cortiñas – É uma intimidação para que não haja mais manifestações.
Adolfo Pérez Esquivel – É um destacamento avançado sobre a democracia na América Latina para impôr as democracias entre aspas, restringidas e inclinados aos centros de poder. Os Estados Unidos instalam mais bases militares ou as ampliam. Vão ampliar a base de Palmarola, em Honduras, com mais efetivos.
Vocês estão em contato com a Frente Nacional da Resistência?
Nora Cortiñas – Esta comissão é autônoma, e tentamos não ter nenhuma relação para que continue sendo independente, para que não haja suspeitas de que temos um partidarismo político.
Uma vez feito o relatório, vocês vão apresentá-lo perante alguma instância judicial internacional?
Adolfo Pérez Esquivel – Perante as Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos, a União Europeia e, logicamente, a todos os órgãos internacionais e hondurenhos. Na situação atual, trata-se de crimes de lesa humanidade. O caso de Honduras se encaixa na competência da Corte Penal Internacional. Se forem constatados os crimes de lesa humanidade, haveria a competência da CPI.
Nora Cortiñas – Não podemos entregar o documento a um governo que é formado por pessoas que deram o golpe...
Adolfo Pérez Esquivel – A grande preocupação do governo é que ele não seja reconhecido internacionalmente. Lobo quer a reincorporação de Honduras à OEA e o reconhecimento das embaixadas. Sabemos que o presidente colombiano Santos convidou Chávez e Lobo para Bogotá. O que aconteceu nessa reunião? Ignoramos. Parece-me muito boa a posição do governo argentino. Se a OEA aceitar Honduras, é uma ameaça para todo o continente. Nisso, a Unasul tem um papel fundamental em favor do estado de direito.
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"Há repressão em Honduras" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU