06 Mai 2021
"A queda inédita da esperança de vida que ocorreu em 2020 pode se repetir com maior intensidade em 2021, especialmente porque não há um planejamento por parte do Governo Federal para aliviar o Brasil desta situação catastrófica", escreve José Eustáquio Diniz Alves, demógrafo e pesquisador em meio ambiente, em artigo publicado por EcoDebate, 05-05-2021.
Uma característica marcante da modernidade é a queda das taxas de mortalidade e o aumento da expectativa de vida da população mundial. Uma vida mais longa é essencial para o desenvolvimento econômico e social pois as pessoas, as famílias e as empresas só investem no aumento do capital humano se sentirem que haverá retorno para o investimento em saúde, educação e ciência e tecnologia. Uma vida longa é um direito humano básico e, quanto maior for a longevidade, maiores serão os retornos econômicos e sociais.
Neste sentido, é inacreditável ouvir o ministro da economia do Brasil, Paulo Guedes, criticar o aumento da expectativa de vida, dizendo que “Todo mundo quer viver 100 anos” e que a longevidade é insustentável para os cofres públicos. Óbvio que o problema não está na maior longevidade, mas sim na forma de funcionamento do sistema de saúde e no modelo de repartição simples do sistema previdenciário. Comemorar a queda da expectativa de vida é o mesmo que ficar ao lado do novo coronavírus e contra o bem-estar geral.
Lastimavelmente, a alta mortalidade ocorrida em 2020 foi responsável pela redução da expectativa de vida no Brasil em quase 2 anos, conforme estudo publicado por pesquisadores de renome internacional (Castro et. al. 09/04/2021) e sumarizado no gráfico abaixo.
Desta forma, o artigo “Reduction in the 2020 Life Expectancy in Brazil after COVID-19” estima que houve uma redução média de 1,94 ano na expectativa de vida ao nascer da população brasileira, voltando aos níveis de 2013. Considerando a expectativa de vida aos 65 anos, a queda foi de 1,58 ano, fazendo a sobrevida da população idosa voltar ao nível de 2009. A queda da esperança de vida ao nascer foi maior entre os homens e entre os habitantes da região Norte. Choques exógenos podem derrubar a esperança de vida, mas, em geral, ela se recupera rapidamente, como ocorreu no Japão, quando Fukushima foi atingida por terremoto, tsunami e acidente nuclear, ao mesmo tempo, em 2011.
Porém, no caso brasileiro, os autores consideram que a atual queda no tempo médio de vida não deve se recuperar de imediato, por cinco motivos. Primeiro, o Brasil continua batendo recordes de vidas perdidas em 2021 e, apenas os 4 primeiros meses de 2021 repetiu o número de mortes da Covid-19 de 2020. O país se tornou um berçário de novas cepas do novo coronavírus. Segundo, a sobrecarga do sistema de saúde e o colapso hospitalar prejudica o atendimento dos serviços de atenção primária no Brasil. Terceiro, aumenta a morbidade em decorrência da Covid-19 e há evidências de que as sequelas da pandemia podem encurtar a vida de parte dos milhões de brasileiros que foram infectados pelo SARS-CoV-2. Quarto, o Brasil já vinha sofrendo com a recessão econômica que começou em 2014, mas o declínio da economia em 2020 e todo o impacto da pandemia veio agravar a situação de pobreza, insegurança alimentar e desemprego, o que deve ter impacto na sobrevivência da população mais pobre do país. Quinto, as reduções no orçamento da saúde e as mudanças no modelo de financiamento tendem a reduzir o acesso e a cobertura da atenção primária e aumentar a mortalidade infantil e outras mortes evitáveis.
Em síntese, a queda inédita da esperança de vida que ocorreu em 2020 pode se repetir com maior intensidade em 2021, especialmente porque não há um planejamento por parte do Governo Federal para aliviar o Brasil desta situação catastrófica.
Portanto, o que estava ruim em 2020 piorou em 2021. No ano passado houve cerca de 195 mil mortes pela Covid-19 e no início de maio já chegou a 410 mil vidas perdidas. Provavelmente, o número total de vidas perdidas para a pandemia deve chegar a 700 mil óbitos até o final do ano. Ou seja, serão mais de 500 mil mortes da Covid-19 somente em 2021, mais de o dobro do ano passado. Isto significa, que a expectativa de vida vai cair mais ainda no corrente ano. Significa que o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) vai diminuir e o Brasil vai cair no ranking global.
Assim, é urgente que o Brasil se esforce para controlar a pandemia o mais rápido possível. Neste esforço de enfrentar a pandemia e a queda da economia é fundamental que o censo demográfico do IBGE seja realizado ainda em 2021. A decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), ocorrida no dia 28/04, determinou que o governo federal tome as providências para realizar o Censo demográfico ainda em 2021. A decisão atendeu a um pedido do governo do Maranhão.
Esta decisão é fundamental para resgatar o império da Lei 8.184/1991 que obriga o governo a fazer o censo no espaço máximo de 10 em 10 anos. Assim, agora é a hora de juntar força e fazer o possível e o impossível para realizar um censo de qualidade e com todos os protocolos de segurança! No dia 07 de maio será a vez do plenário do STF se manifestar. Não realizar o censo é desrespeita a Constituição e a legislação nacional. Só com informações corretas e atualizadas poderemos retomar o caminho do aumento da expectativa de vida da população brasileira.
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Decrescimento vegetativo e queda da expectativa de vida. Artigo de José Eustáquio Diniz Alves - Instituto Humanitas Unisinos - IHU