29 Setembro 2020
Nesta entrevista, o padre e teólogo brasileiro Antônio José de Almeida aborda a questão do celibato. Alheio a todo rebuliço midiático que essa questão sempre desperta, Almeida aborda o assunto sem atalhos.
A entrevista é de Óscar Elizalde Prada, publicada por Vida Nueva Digital, 28-09-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Por que este debate sempre suscita tensões na Igreja?
Com a sexualidade toca-se em uma pulsão humana radical, mais poderosa que o ter e menos controlável que o poder. O celibato encarcera a sexualidade, porém não a elimina. Apesar de suas motivações teológicas, pastorais e institucionais, se vê em dificuldades frente às solicitações da carne, se perdendo, muitas vezes, diante de escapadas ocasionais ou inclusive do concubinato. Se em certos ambientes o sexo é um tabu, em alguns eclesiásticos se está diante de um prato servido em bandeja de prata para a psicanálise.
Estás contra a lei do celibato?
Não seria necessária, o celibato autêntico não necessita de lei. Isso sim, tampouco é ilegítima. A Igreja pode estabelecer, com peso de lei, os requisitos que considera necessários ou convenientes para o acesso e a permanência nos ministérios, particularmente os ordenados. E considerar que o celibato é conveniente ao ministério, porém não necessário.
Para alguns é sim...
O cardeal Sarah afirma que existe um vínculo ontológico-sacramental entre o sacerdócio e o celibato, e que qualquer enfraquecimento desse vínculo poria em causa o magistério do Concílio e de Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI. Essas afirmações fazem parte do repertório tradicionalista – ou fundamentalista – de defesa do celibato e de sua lei. Para bispos, padres e diáconos, não havia outra lei na Igreja antiga senão a da monogamia, o que obviamente implicava fidelidade. Nos primeiros três séculos, a maioria dos ministros ordenados eram casados.
Os argumentos a favor da obrigação de se abster da atividade sexual são interpretações tendenciosas de uma concepção helenística totalmente alheia à religião bíblica, a Jesus e a Paulo. Mas, progressivamente, normas específicas foram impostas, como a lei da continência, até que, no século XII, se chegou à proibição de ordenar homens casados e de que padres casassem. A lei do celibato foi aprovada pelo Segundo Concílio de Latrão (1139) e confirmada pelo IV (1213).
Em que ponto estamos hoje?
Se o celibato fosse tão necessário, não teríamos na Igreja Católica presbíteros casados de rito oriental. Nem mesmo a constituição apostólica ‘Anglicanarum coetibus’, de Bento XVI, teria admitido padres casados que desejassem continuar exercendo o ministério, algo já previsto na encíclica ‘Sacerdotalis coelibatus’, de Paulo VI. O decreto ‘Presbyterorum ordinis’, do Vaticano II, deixa claro que o celibato não é uma exigência da própria natureza do sacerdócio. Quando Sarah fala de “celibato indispensável”, ele está em conflito com a doutrina da Igreja. Heresia ou delírio?
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“O celibato não é uma exigência da própria natureza do sacerdócio”. Entrevista com Antônio José de Almeida - Instituto Humanitas Unisinos - IHU