04 Fevereiro 2020
"O Apocalipse, embora não escondendo a dramaticidade da existência, não quer ser aterrorizante, não quer incutir um medo mortal, mas quer expressar, acima de tudo, o sentido da majestade e da soberania do Senhor, capaz de intervir e endireitar o curso das existências pessoais e até da história".
A opinião é do pastor valdense italiano Eugenio Bernardini, moderador da Mesa Valdense da Itália. O artigo foi publicado em Il Fatto Quotidiano, 02-02-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
As palavras e, sobretudo, as imagens do Apocalipse (o último livro da Bíblia) fascinaram e inquietaram gerações e gerações de seres humanos, crentes e não crentes, que leram as suas páginas como se fossem a chave interpretativa do seu presente (de cada presente) e, sobretudo, do futuro iminente (de cada geração): um julgamento divino catastrófico, um terrível castigo destinado a envolver todos os povos do mundo e a natureza inteira.
Hoje também parece que estamos vivendo em uma época inquieta de transpasso, com as suas ansiedades e com as suas imagens “apocalípticas”: Auschwitz, Hiroshima, Chernobyl, o Oriente Médio em chamas, o aquecimento global do clima... Uma época que parece um prelúdio a catástrofes piores e que estimula pregações ameaçadoras, não mais a prerrogativa de extremistas religiosos, mas também de políticos.
O Apocalipse, porém, embora não escondendo a dramaticidade da existência, não quer ser aterrorizante, não quer incutir um medo mortal, mas quer expressar, acima de tudo, o sentido da majestade e da soberania do Senhor, capaz de intervir e endireitar o curso das existências pessoais e até da história.
No início do livro (1,9-20), encontramos como primeira imagem justamente a visão real do Jesus ressuscitado em toda a sua glória e poder: a veste longa e o cinturão de ouro são emblemas reais (ou, por menos, de um personagem de altíssimo nível); os pés de cobre, a voz, o rosto resplandecente expressam poder; os cabelos brancos não significam velhice, mas sim eternidade, a espada de dois gumes que sai da sua boca é o símbolo da eficácia da sua palavra. O olhar flamejante também é símbolo de autoridade e de poder.
Diante dessa majestade e soberania, o fiel sente o peso da própria condição de indignidade e pequenez: a pura e simples presença – até mesmo muda – do divino provoca tamanho abalo a ponto de pôr de joelhos qualquer consciência crente: “Quando o vi, caí como morto a seus pés” (1,17). Mas, como no passado, em casos semelhantes, encontramos a mesma palavra de sempre: “Não tenha medo” (1,17). Uma palavra que reabilita o fiel diante de si mesmo e lhe permite escutar a designação de uma missão: “Escreva o que você viu” (1,19), e aqui, além disso, há também uma mão tranquilizadora que repousa sobre o ombro (ou sobre a cabeça) da testemunha: “Ele colocou a mão direita sobre mim” (1,17).
O personagem da visão se apresenta como “o primeiro e o último. Sou o Vivente. Estive morto, mas estou vivo para sempre. Tenho as chaves da morte e do Hades” (1,17-18), isto é, como Aquele que controla e domina o grande adversário: a morte e a morada dos mortos.
No Apocalipse, por isso, descobrimos o mesmo evangelho (“Boa Notícia”) de outros textos bíblicos, a mesma graça reabilitadora, a mesma confiança do Senhor que vem e confia às suas testemunhas tarefas de grande responsabilidade. Um Senhor não solitário, que se encontra entre as suas Igrejas, os “sete candelabros” (1,12): uma bela imagem da vocação da Igreja a viver ao lado do seu Senhor e a difundir não uma luz própria, mas sim a luz de Cristo, e de mantê-la bem alta, bem visível ao mundo.
Respeitemos, portanto, esse último livro da Bíblia, escutando aquilo que ele diz realmente, e não as nossas fantasias angustiadas e “apocalípticas”. Porque ele se apresenta como um “quinto evangelho” (G. Comolli, “Apocalisse. Il libro del mondo rinnovato” [Apocalipse. O livro do mundo renovado], Ed. Claudiana, 2017), no qual o Jesus ressuscitado volta mais uma vez para nos confirmar que estão sendo preparados para todos nós “um novo céu e uma nova terra”, onde não haverá mais dor, nem morte, nem injustiça, porque “eis que faço novas todas as coisas” (21,1-5).
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O Apocalipse não é apocalíptico: é um “quinto Evangelho” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU