02 Agosto 2019
Cidadãos se mobilizam em abaixo-assinados pela proteção do Fundo Amazônia e para impedir desmatamento na maior floresta tropical do mundo.
A escolha de um ministro controverso. O maior projeto de preservação da Amazônia em risco. A negação dos dados de desmatamento divulgados por um instituto reconhecido internacionalmente. O incentivo à exploração mineral em terras indígenas. A ameaça ao meio ambiente nunca pareceu tão real no Brasil. Pelo menos é o que indicam diversas mobilizações online, surgidas em defesa da Amazônia, que reúnem quase 400 mil apoiadores na plataforma de abaixo-assinados Change.org.
A reportagem é de Change.org, reproduzida por CartaCapital, 02-08-2019.
A postura do governo federal diante da política ambiental tem provocado reações de protesto mesmo de pessoas sem qualquer ligação profissional com a área. Inconformada com os rumos do país no tratamento do meio ambiente, a estudante de Direito Valéria dos Santos Magalhães, que mora em Manaus, decidiu tomar uma atitude pela proteção da maior floresta tropical do mundo: coletou mais de 309 mil assinaturas em uma petição contra o desmatamento. “Vi isso tudo e quis fazer algo”, comenta a manauara.
Valéria vislumbrava um retrocesso para o meio ambiente ainda durante as eleições presidenciais do ano passado, quando o então candidato Jair Bolsonaro demonstrava defender a exploração da Amazônia pelo agronegócio. Desde então, ela passou a coletar apoios em defesa da floresta. “Eu defendo que a Amazônia deve ser sim explorada, mas de forma consciente, responsável, aberta a pesquisas para que possamos ver o que se pode extrair dela, que seja de bom uso econômico e ecológico, de forma que não a prejudique ou que cause danos quase irreversíveis”, explica.
Motivada pelo desespero, como define, a estudante enxerga com positividade o apoio recebido na mobilização que criou. “Vejo isso como uma evolução positiva da sociedade, uma pessoa motiva a outra e é a motivação o primeiro passo para conseguir mudar o mundo”, diz. Mais do que uma ligação geográfica com a Amazônia, por ter nascido e crescido na capital amazonense, Valéria sempre se interessou pelas questões ambientais por ter um círculo de amigos formado por cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e por estudantes de Biologia. A jovem destaca a preocupação que tem sentido nos colegas.
“Eles estão bem preocupados e chateados. É muito chato você dedicar a sua vida em pesquisas a favor da Amazônia, do meio ambiente, e ver que nada disso vai valer a pena”, comenta a manauara, ressaltando o descaso do atual governo com os profissionais da área.
Há duas semanas, o presidente Jair Bolsonaro questionou dados de desmatamento divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), dizendo ter o sentimento de que eles não condizem com a verdade. Na ocasião, o presidente ainda criticou o diretor do instituto reconhecido internacionalmente, Ricardo Magnus Osório Galvão, afirmando que a apresentação desses números prejudica o nome do Brasil. Segundo o Inpe, o desmatamento na Amazônia cresceu 88% em junho, em comparação com o mesmo mês do ano passado.
A atitude do mandatário da República mais atrapalha do que beneficia o combate ao problema, como acredita a estudante Valéria. “Eu acho uma tremenda ignorância. Eu não consigo, de verdade, entender o que se passa no conhecimento dele, deixar dados e pesquisas de lado é como fechar os olhos para o óbvio e entregar a situação nas mãos da sorte, eu acho uma falta de respeito com quem está ali se dedicando todo santo dia para estudar e chegar a uma conclusão, em uma base, e ser desconsiderado sem motivo algum, em troca de quereres vazios, em troca de mudanças radicais que vão prejudicar mais do que ajudar”, desabafa.
Assim como a estudante de Direito e mesmo sem atuação profissional na área, o fisioterapeuta e especialista em acupuntura e gestão de sistemas e serviços de saúde, Gilberto Roque Sonoda, se mobiliza contra os ataques do governo ao meio ambiente. O morador de Niterói, Rio de Janeiro, também utilizou a plataforma Change.org para unir apoiadores em prol da Amazônia. Gilberto criou uma campanha em defesa do Fundo Amazônia, o maior projeto global de financiamento para preservação da Floresta Amazônica.
Gilberto, que também é especialista em informática e informação em saúde, abriu o abaixo-assinado online, no final de maio, depois que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, declarou intenção em alterar as regras do Fundo Amazônia para que os recursos fossem destinados à indenização de proprietários de terras por desapropriações em unidades de conservação. Até o momento, a petição conta com mais de 13 mil assinaturas.
“Esta mobilização é fundamental para contrapormos aos desmandos do atual governo, que quer entregar nossa Amazônia ao agronegócio e aos exploradores de minério. Este abaixo-assinado não é meu, ele é de todos, pois quer levar às autoridades nacionais e internacionais a importância de defendermos a Amazônia”, enfatiza Gilberto. Nos últimos dias, o presidente Jair Bolsonaro também anunciou que buscará parcerias internacionais para a gestão da Amazônia, defendendo a exploração mineral inclusive em terras indígenas.
O Fundo Amazônia existe há 10 anos e investe em projetos de combate ao desmatamento e incentivo do desenvolvimento sustentável. Segundo dados do Fundo, cerca de 3 bilhões de reais já foram captados para destinação a pesquisas e geração de renda na floresta. Alemanha e Noruega, responsáveis por 99% das doações ao Fundo, ameaçaram interromper o repasse de verbas caso haja alteração na finalidade de aplicação dos recursos.
“Assim que tomei conhecimento das intenções do Ministro do Meio Ambiente em utilizar as verbas do Fundo Amazônia para pagar indenizações a grileiros que invadiram unidades de conservação da Amazônia, senti a obrigação de fazer alguma coisa para mobilizar outras pessoas, que pensam da mesma forma, para denunciarmos este absurdo”, fala Gilberto, que no dia a dia tenta tomar atitudes simples em defesa do meio ambiente, como a compostagem doméstica, a produção de menos lixo, reciclagem, plantio de árvores e economia de água.
A plataforma de abaixo-assinados online Change.org Brasil hospeda, ainda, outras sete mobilizações contra o desmatamento e em defesa da Amazônia. No total, as campanhas acumulam quase 390 mil apoiadores. Uma das petições, que conta com quase 3 mil assinaturas, pede a demissão do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
Ao lembrar das alterações climáticas, decorrentes da degradação do meio ambiente, o fisioterapeuta Gilberto lembra que “não temos mais tempo” e que a atual e futuras gerações estão sendo colocadas em risco. Por isso, destaca a importância das mobilizações.
“Considero também como um estímulo a esta causa a barbárie ambiental que o governo Bolsonaro está promovendo. A população, mesmo aqueles que votaram nele, já percebe que isso está muito errado. Esta petição vem atender ao desejo destas pessoas em apontar a falha na condução da política ambiental do governo”, ressalta. “Nossas maiores riqueza estão sendo entregues às multinacionais e este será o destino da Amazônia, caso não haja uma grande mobilização das lideranças nacionais e de nós, cidadãos brasileiros, para defendê-la”, finaliza.
A equipe da Change.org Brasil entrou em contato com a assessoria de imprensa do Ministério do Meio Ambiente para ter um esclarecimento quanto aos rumos da política ambiental no país, mas não recebeu resposta até o fechamento desta reportagem.
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Petições mobilizam 400 mil pessoas contra política ambiental de Bolsonaro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU