28 Abril 2019
O direito humano à alimentação adequada e os impactos sociais da MP 870/2009 foram discutidos em audiências públicas no Congresso Nacional
A informação é da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, publicada por Ministério Público Federal - MPF, 25-04-2019.
Os impactos sociais impostos pela Medida Provisória 870/2019 – editada em 1º de janeiro para reestruturação administrativa do governo federal – foram tema de uma série de audiências públicas promovidas nesta semana pelo Congresso Nacional e que contaram com a participação da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, Deborah Duprat.
A MP 870 alterou a organização dos órgãos da Presidência da República e dos ministérios, além de mudar atribuições e a estrutura dessas pastas e de outras repartições. Entre suas ações, a medida estabeleceu o monitoramento governamental de organizações sociais no Brasil, além de extinguir o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), órgão que tinha como missão propor diretrizes para assegurar o direito a uma alimentação adequada.
“Esses foram os dois pontos essenciais de preocupação da PFDC. São duas matérias que se aproximam exatamente no que diz respeito à garantia de participação social, um direito fundamental”, ressaltou a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, durante a audiência pública sobre o tema promovida na quarta-feira (24) pelo Senado Federal. A representante do MPF destacou que é natural a adoção de uma reforma administrativa a cada nova gestão governamental, mas alertou que direitos fundamentais não podem ser suscetíveis à desestruturação organizacional.
“Há uma jurisprudência já bastante consolidada de que os direitos fundamentais têm um aspecto material, mas também organizacional. Significa, portanto, que não se pode desmontar a estrutura que sustenta administrativamente a realização de um direito sem que medida equivalente, ou melhor, seja implementada em substituição”. Segundo Deborah Duprat, esse vácuo desorganiza, por completo, a tríade instituída pela Lei 11.346/2006, que criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) – do qual faz parte o Consea – e que possibilitou ao Brasil ser retirado, em 2004, do Mapa Mundial da Fome.
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional era um órgão consultivo diretamente ligado à Presidência da República – um espaço de participação da sociedade civil na formulação e avaliação de políticas públicas na área. O conselho foi criado em 1993, pelo então presidente Itamar Franco, e revogado no governo Fernando Henrique Cardoso com a criação do Programa Comunidade Solidária. Em 2003, o Consea foi restabelecido pela Lei 10.683, com suas características centrais de articulação, intersetorialidade, descentralização e participação social.
“O Consea permitiu ao Brasil estabelecer um conceito de segurança alimentar que incorpora propostas, vivências e sabedorias dos diferentes setores da sociedade e busca fazer a união entre duas grandes dimensões: a produção de alimentos e a saúde”, explicou Elisabetta Recine, ex-presidente do conselho. Segundo Elisabetta, esse modelo – reconhecido internacionalmente – permitiu atuar de uma maneira sistêmica diante de um dos problemas mais fundamentais no Brasil: a fome.
Para Deborah Duprat, o desmonte dessa estrutura torna-se ainda mais grave diante das políticas de austeridade atualmente implementadas no País – especialmente a Emenda do Teto de Gastos, que congelou por 20 anos investimentos públicos na área de saúde, educação e assistência. É dessa perspectiva que compartilha a organização Articulação Semiárido Brasileiro, também presente à audiência: “extinguir o Consea é condenar os mais pobres, sobretudo do Semiárido, da região Norte e das periferias das cidades, à miséria e à fome. Nós queremos políticas de Estado que promovam a vida, e não que tragam mortes”.
Também na quarta-feira, a PFDC participou do lançamento, na Câmara dos Deputados, da Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional. A frente retoma experiência de 2007, com o intuito de ser uma ferramenta de apoio à tramitação de propostas legislativas que ajudem a democratizar o acesso regular e permanente de todos os brasileiros a alimentos de qualidade.
Já nesta quinta-feira (25), a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão também foi representada na audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e que também teve como tema o direito humano à alimentação adequada e os impactos da MP nas políticas públicas de segurança alimentar e nutricional. O diálogo contou com a participação de parlamentares, organizações sociais e especialistas. Um total de 541 emendas à MP 870/2019 já foram apresentadas por deputados e senadores. Ao menos 12% delas reivindicam a manutenção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
Com o objetivo de contribuir nessa análise, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão encaminhou ao Congresso Nacional, em fevereiro, uma Nota Técnica com um conjunto de argumentos que demonstram a inconstitucionalidade dos dispositivos da MP que desmontam atribuições e responsabilidades do Consea. Além dos subsídios aos parlamentares, a PFDC também encaminhou à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, uma representação solicitando que seja enviado ao Supremo Tribunal Federal um pedido de análise da inconstitucionalidade dos dispositivos da MP 870 que extinguem o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
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Extinção do Consea desorganiza sistema que possibilitou ao Brasil sair do Mapa Mundial da Fome’, alerta MPF - Instituto Humanitas Unisinos - IHU