11 Janeiro 2019
Vocês devem ter visto o vídeo no qual Olavo de Carvalho nega o heliocentrismo, o sistema segundo o qual a Terra gira em torno do sol. E também nega Einstein. Como vocês viram, eu disse nega. Não disse refuta. Qualquer um pode negar qualquer coisa. A refutação consiste em desarticular o axioma, o centro lógico de uma teoria. O sistema heliocêntrico não pode ser refutado porque não é uma hipótese. É uma evidência.
Evidências não podem ser colocadas em igualdade com hipóteses. Por exemplo, como o heliocentismo, a teoria da seleção natural de Darwin não é uma hipótese. É uma evidência que vem sendo confirmada há quase dois século por experimentos. Enquanto o criacionismo é uma hipótese que tem dez mil anos e nunca foi verificada, pois o termo-Deus, cerne de seu postulado, não é passível de verificação empírica. Por isso, equivaler darwinismo e criacionismo conduz a outros dois ismos: obscurantismo e charlatanismo.
A diferença entre uma hipótese e uma evidência é que a evidência é uma hipótese que foi confirmada por centenas de cientistas ao longo de séculos de debates e de experimentações. As evidências desmentem pragmaticamente as hipóteses anteriores. As evidências são passíveis de variações parciais, não de refutação global. Quem diz que refuta globalmente uma evidência é um charlatão. Um completo picareta. Simples assim.
O nome sofisticado par quem nega evidências é negacionista. Na historiografia, por exemplo, os negacionistas negam o Holocausto e o genocídio do povo judeu pelos nazistas. Os racistas são negacionistas das evidências da escravidão. Os feminicidas são negacionistas das infinitas evidências da violência contra a mulher. Olavo de Carvalho e os olavistas conseguem a proeza de serem negacionistas de quase todas as evidências do século XX.
Diferente do que o vigarista Olavo de Carvalho afirma, o heliocentismo e o geocentrismo não são duas hipóteses equivalentes. Isso é uma mentira deslavada. Ele está te enganando. O geocentrismo é uma hipótese que foi descartada e completamente refutada pelo heliocentrismo. E isso vem desde a Antiguidade.
O grego Aristarco de Samos descreveu e defendeu um sistema heliocêntrico. Eraclides de Ponto mediu as variantes da luz na Terra e propôs um sistema heliocêntrico. O Corpus Hermeticum, texto-base da religião solar da Antiguidade conhecida como hermetismo, tem uma descrição minuciosa do sistema heliocêntrico. Os Shatapatra Bramana, textos sagrados do hinduísmo, descrevem uma cosmologia heliocêntrica.
Na modernidade, Giordano Bruno foi queimado em uma fogueira pela Inquisição, formada pelos olavistas do século XVI (nada de novo sob o sol), por defender o heliocentismo e a pluralidade dos mundos. Copérnico defendeu o heliocentrismo, mas denegou-o, com medo de ter o mesmo destino. Galileu teve que abjurar (negar suas crenças) diante da Igreja porque demonstrou empiricamente o heliocentismo. Seria queimado também se não o fizesse. Toda cosmologia desde o século XVI e XVII é heliocêntrica: Kepler, Leibniz, Newton, Descartes, Hume, Locke, Kant, Humboldt, Poincaré, Whitehead e Einstein.
O desastre de pessoas como Olavo de Carvalho e seus seguidores no poder é inclassificável e inqualificável. Não consiste apenas em um problema político. É uma demência coletiva normatizada. Fingem refutar teorias quando na verdade apenas defendes superstições e o mais trivial senso comum. E negam os fatos e as evidências como se estivessem produzindo teoria. O desserviço dessa inversão é gigantesco. Imaginem milhares de pessoas, das mais variadas crenças, classes sociais, ideologias e graus de instrução sendo lobotomizadas por esses farsantes de internet.
Essa atitude, além de criminosa, é uma violência contra os milhares de professores e cientistas brasileiros. Muitos deles anônimos, ganhando a vida aos trancos e barrancos com salários de fome e trabalhando para difundir ideias absolutamente aceitas em todas as democracias liberais e em todos os países capitalistas do mundo.
Enquanto esses países enriquecem com ciência e tecnologia. Enquanto debatem pluriversos, emaranhamento quântico, teoria das cordas, universos alternativos, cosmologias paraconsistentes e ontologias pluralistas, os doentes mentais que governam o Brasil estão preocupados em saber qual bolinha gira em torno de qual. Se o sol orbita a Terra ou se a Terra o sol. O próximo passo será a defesa da Terra Plana.
O fato é que Bolsonaro sofre por sua incompetência e pelas enormes contradições internas do seu governo.
Mas até agora, se dependesse da esquerda, ele dormiria tranquilo.
A TERRA NÃO É PLANA
Cerca de 600 anos antes de Cristo, Tales de Mileto dizia que a Terra era sustentada pela água, sobre a qual deslizava como uma nau. Explicava assim os terremotos: eles ocorriam quando a Terra era chacoalhada pelo movimento dessa água que estava sob ela e a sustentava.
Anaximandro, discípulo de Tales, percebeu que essa hipótese conduzia a uma regressão infinita, da qual o pensamento lógico tem que fugir.
Se a Terra estivesse sustentada em alguma coisa, precisaríamos explicar onde esta coisa se sustentava, e assim indefinidamente. Cada suporte demandaria outro suporte.
A estabilidade do planeta não podia ser explicada assim, com apoios ou escoras. A Terra não podia estar sustentada em nada.
Então, por que não caía?
Porque estava imersa em um Universo homogêneo, no qual não havia uma direção preferencial, nem para cair nem para subir. “Onde não há diferenças”, dizia, “não há mudanças.”
A forma da Terra precisava confirmar essa indiferença. Ela seria tal que não permitisse os conceitos de “em cima” e “embaixo”, extinguindo completamente a possibilidade de uma direção preferencial.
Essa forma perfeitamente simétrica, sem lados de nenhum tipo, era a esfera.
Uma esfera pairando no vazio não pode cair, pelo simples fato de que não tem para onde cair.
Sentado em uma pedra e olhando para o céu, sem instrumentos além do pensamento lógico, o filósofo pré-socrático resolveu um problema que atormenta o povo de Jair Bolsonaro mais de 2.500 anos depois.
Abraços,
Cesar Benjamin
Posso ser totalmente chato????
Eu concordo com o general que falou que a guerra fria foi a terceira guerra mundial.
Aliás, curiosamente, a primeira pessoa a dizer isso (pelo menos que eu tenha visto) foi o subcomandante Marcos, do EZLN.
Se somarmos Angola, Moçambique, Vietnã, Argélia, Afeganistão e tantas outras guerras que opuseram Estados Unidos, e seus aliados, e URSS, veremos que houve de fato uma guerra mundial diluída no tempo e no espaço.
O governo Maduro é corrupto, violento e autoritário e está destruindo as conquistas da revolução bolivariana. Isso pra mim é inquestionável.
A partir disso, podemos fazer dois debates.
1) O eterno debate (pelo menos desde a URSS) entre as explicações exógenas (as mil formas de sabotagem) e as explicações endonegas (os limites do socialismo real) para entender os motivos do fracasso.
2) O que fazer a partir dessa constatação e do fato de que do outro lado repousa uma direita golpista, historicamente anti-democratica e totalmente subordinada aos interesses norte-americanos.
Eu aceito, inclusive, debater com quem acha que, dadas as circunstâncias, manter o apoio à Maduro ainda é necessário (embora eu discorde). Mas desde que tenhamos muito claro o que estamos defendendo. Nesse caso, seria a defesa do ruim contra o péssimo.
Maria e o Menino
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