20 Julho 2018
Deu confusão, nos Estados Unidos, a decisão de jogadores negros do “football” lá deles de não ficarem eretos – e muito menos com a mão sobre o coração – quando tocava o hino nacional antes dos jogos, na temporada passada.
A crônica é de Luis Fernando Veríssimo, publicada por O Estado de S. Paulo, 19-07-2018.
"E o Brasil? Nosso único problema com os símbolos da pátria é que nenhuma banda ainda se deu conta que o hino brasileiro tem duas partes", conclui o escritor.
Deu confusão, nos Estados Unidos, a decisão de jogadores negros do “football” lá deles de não ficarem eretos – e muito menos com a mão sobre o coração – quando tocava o hino nacional antes dos jogos, na temporada passada. Os jogadores se ajoelhavam durante o hino, em sinal de protesto contra nada muito específico, além das agruras e injustiças, históricas e atuais, sofridas pela comunidade afro-americana. Anos atrás, numa Olimpíada, dois atletas negros americanos, na hora de receberem suas medalhas, ergueram os punhos desafiadoramente, numa saudação ao movimento “black power” que crescia nos Estados Unidos. Os dois foram criticados por ignorar a determinação de não misturar política com esporte e contrariar o “espírito olímpico”. Não apareceu muita gente disposta a defendê-los.
Entre o protesto naquela Olimpíada e os jogadores ajoelhados contra o hino muita coisa mudou, para melhor, nas relações raciais americanas, mas muita coisa continua igual. É contra essa persistência que cresce a revolta. Os donos de clubes não sabem como lidar com o problema. Não podem obrigar seus enormes e bem pagos atletas a respeitar os símbolos da pátria como crianças numa escola.
O presidente Trump, que mal disfarça seu racismo, já chamou os ajoelhadores de traidores. Nos jogos, a grande maioria do público vaia os rebeldes, antes de começar a torcer por eles no jogo.
Não passou despercebida a imagem de três ou quatro jogadores negros da França, depois do jogo final, correndo no campo com bandeiras francesas desfraldadas. Muitos jogadores da França são filhos de imigrantes, outros nasceram em ex-colônias francesas, com razões de sobra para ver na bandeira tricolor um símbolo do imperialismo e da discriminação que ainda sofrem num país com pecados racistas no seu passado. Mas a maioria viu na bandeira um símbolo de integração, e uma resposta a gente como Le Pen, que sempre disse que a seleção da França precisava de um branqueamento para dar certo.
E o Brasil? Nosso único problema com os símbolos da pátria é que nenhuma banda ainda se deu conta que o hino brasileiro tem duas partes.
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