02 Fevereiro 2018
No contexto da apresentação das Atas do 21º Seminário Nacional de Gnomônica, reunidas em um rico volume de 200 páginas, em 15 de dezembro passado, no Auditório de Valdobbiadene, participou como palestrante convidado o prof. Piero Benvenuti. Professor Emérito de Astrofísica na Universidade de Pádua, Benvenuti foi o responsável científico para a Agência Espacial Europeia, presidente nacional do Instituto de Astrofísica e membro da Agência Espacial Italiana. Em 2015 foi nomeado secretário geral da União Astronômica Internacional, um cargo que ainda ocupa. É um interessado ativo no diálogo entre ciência e teologia, docente do curso sobre criação e evolução na Faculdade Teológica do Triveneto de Pádua, e em 2011, foi nomeado por Bento XVI consultor ao Pontifício Conselho para a Cultura.
A entrevista é de Alessio Magoga, publicada por Settimana News, 27-01-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Prof. Benvenuti, vivemos em uma época de grandes descobertas astronômicas que vê - por exemplo - telescópios astronômicos transportados para o espaço. Não é verdade?
Hoje, o progresso da astronomia está principalmente relacionado com uma instrumentação cada vez mais sofisticada. Desde os anos 1960, começou-se a usar a tecnologia espacial para levar os nossos instrumentos de observação para fora da atmosfera e começou uma revolução: vimos fenômenos de que sequer tínhamos suposto a existência.
Recentemente vimos um grande evento: a recepção de sinais, como as ondas gravitacionais. Haviam sido previstas por Einstein em sua teoria da relatividade geral, mas nunca haviam sido detectadas por serem tão fracas e exigir um desenvolvimento tecnológico extraordinário.
O avanço da tecnologia permitiu-nos compreender a história do nosso universo e pensar em um novo modelo cosmológico que coloca o homem no centro da evolução: não mais no sentido geométrico, como no modelo aristotélico-ptolomaico, mas como ponto de chegada de um percurso de 14 bilhões de anos.
Hoje então ainda faz sentido ocupar-se de "relógios" solares?
Nesta época ainda tem valor o sistema do gnômon (a haste no centro do relógio, nde), que em sua formulação mais simples é uma barra colocada no solo que permite acompanhar o comportamento da sombra, de acordo com o movimento do sol e das estações. Este instrumento está ligado à cultura e as tradições de todos os povos do mundo: não existe cultura e nem civilização que não tenha desenvolvido um conhecimento da astronomia, desde as mais simples relativas ao sol. Seu movimento, só aparentemente parece ser regular, mas - como bem sabe quem lida com relógios de sol - não é exatamente assim: daí surge a aventura da astronomia que nasce na antiguidade.
Olhar para frente através dos novos instrumentos é fundamental para aumentar a compreensão do nosso universo; mas também é necessário olhar para trás para recuperar a história e afundar as raízes na nossa tradição. Para isso, é muito importante que existam ainda hoje grupos de apaixonados que continuem a cultivar o interesse científico pelos relógios de sol.
Você mencionou as "ondas gravitacionais": por que esse resultado é tão importante para a ciência?
Esta descoberta criou grande entusiasmo entre os cientistas. As ondas haviam sido previstas por Einstein, que havia intuído que o espaço - o que nós intuitivamente conhecemos - não é inerte nem absoluto ou estranho à nossa presença; mas se modifica como resultado da presença da massa. O sol, por exemplo, altera o espaço ao seu redor.
Este fenômeno foi provado pela primeira vez durante um eclipse solar em 1919. Na época, os astrônomos fizeram fotografias durante o eclipse total - o céu escurece e as estrelas se tornam visíveis - das estrelas próximas à borda do sol. A posição das estrelas durante o eclipse foi comparada com a sua posição quando o sol não estava presente; notaram que a posição era diferente, porque a luz proveniente das estrelas, passando perto da borda do Sol, era desviada. Eles descobriram assim que o espaço se curva perto de grandes massas.
Depois de ter verificado este fato - incrível na época -, Einstein pensou que, se a massa fosse deslocada, a perturbação provocada teria se espalhado no espaço, dando origem às chamadas ondas gravitacionais. Em essência, o espaço vibra devido ao efeito do deslocamento das massas (que precisam ser, no entanto, massas muito concentradas).
Uma vez admitida a existência de ondas gravitacionais, era preciso medi-las. Como?
O problema foi realmente detectá-las. Uma vez que essas ondas são vibrações, é preciso isolar o detector de qualquer outra vibração. Exigiu um trabalho de quase 70 anos para o refinamento da tecnologia necessária para captar essas ondas e dois anos atrás isso aconteceu.
Para ter certeza de que eram ondas gravitacionais e não outras vibrações, os detectores foram colocados a milhares de quilômetros de distância um do outro: um em Cascina (Pisa) e dois nos Estados Unidos. Se o sinal fosse visto exatamente no mesmo instante com as mesmas características pelos três detectores, esperar-se-ia que fosse um sinal proveniente do céu.
A grande novidade de dois meses atrás é que esta revelação foi realizada não só por instrumentos que revelam as ondas gravitacionais, mas também por instrumentos espaciais que captam as explosões de raios gama (raios gama são emitidos nas explosões de bombas atômicas que liberam enormes energias, ndr): foram vistos ao mesmo tempo uma explosão de raios gama e uma onda gravitacional. Teve-se assim a confirmação do que está na origem destes fenômenos.
Neste caso, trata-se da fusão de duas estrelas de nêutrons: girando uma ao redor da outra no final se "aglutinam" para se tornar uma única estrela (provavelmente um buraco negro). A partir desse evento catastrófico, há uma grande emissão de energia e também de ondas gravitacionais.
A importância é limitada ao interesse dos cientistas, ou mesmo os não-especialistas deveriam ficar interessados?
Essas coisas são difíceis de entender. O que significa que o espaço se curva, é difícil de entender concretamente, mas esta é a natureza do mundo real. Há uma grande animação no mundo científico por essas descobertas, porque estamos chegando cada vez mais perto de um modelo convincente e rico de elementos que podem descrever a nossa realidade.
A maneira como vemos o universo, em sua opinião, tem uma influência na cultura?
Com a revolução copernicana, o homem descobriu não ser o centro do universo, mas que está na periferia e se perdeu uma visão unificada do cosmos. Uma verdadeira cosmologia ressurgiu apenas nos últimos 50 anos. Agora sabemos quais são as características do cosmos e tudo isso tem uma influência sobre o nosso ser e sobre o nosso destino.
Uma das características desse novo modelo é, em primeiro lugar, que o cosmos tem uma história: uma história que temos condições de repercorrer por 14 bilhões de anos.
Nós, seres humanos estamos na extremidade desta história e emergimos apenas no final. Tudo isso sugere que não podemos nos imaginar como os únicos seres pensantes do universo, mas torna-se cada vez mais plausível supor que a vida também tenha se desenvolvido em outros planetas. Sabemos com certeza que em torno de todas as estrelas existem sistemas planetários. Nos próximos 20 anos vamos ser capazes de analisar a atmosfera dos planetas das estrelas mais próximas e descobrir se existem vestígios de vida biológica.
Acho que precisamos estar preparados para pensar que não estamos sozinhos no universo. Embora se deva logo dizer que não haverá possibilidade de comunicar com esses seres vivos, porque as distâncias e a velocidade de propagação da informação, que é fixa e é a velocidade da luz, não nos dará a possibilidade de uma verdadeira interação. Em todo caso, pensar que não estamos sozinhos modifica e modificará, por exemplo, o nosso modo de fazer filosofia e teologia.
Esses avanços científicos que desafios apresentam para a teologia e a ciência?
Do ponto de vista da teologia, acredito que tudo isso requeira um repensamento rápido e uma reinterpretação dos dogmas da fé, não para anulá-los, mas para torná-los mais compatíveis com o que aprendemos. Do ponto de vista da ciência, o perigo constante é de uma espécie de "divisionismo", ou seja, ver os fenômenos apenas no detalhe e não em sua totalidade. Tudo isso torna o universo numa espécie de "grande robô mecânico", onde tudo acontece por leis necessárias. A teologia por outro lado poderia oferecer uma visão global.
Vamos voltar para relógios de sol. Trata-se de temas especializados que são susceptíveis de serem do interesse para um pequeno círculo de estudiosos ou podem ensinar alguma coisa para todos?
Durante o último século houve uma transformação na relação entre o homem e a astronomia: a perda da oportunidade de observar o céu. Perda no sentido de que, se alguém teve a chance de olhar para o céu a partir de um deserto, sabe que tal visão aqui foi perdida. Aqui nós não temos nenhuma área escura que nos permita ver esse espetáculo. Existem possibilidades de recuperar algo da visibilidade do céu noturno, mas não teremos mais aquela visão.
Eu acho que é importante que as crianças cresçam com um conhecimento do céu e fenômenos celestes. O movimento do sol pode ser seguido com cuidado e facilidade. Eu gostaria que em todas as escolas primárias fosse instalado um gnômon no chão e as crianças acompanhassem, dia após dia, o que acontece: marcar onde a sombra passa, ao meio-dia, dia após dia ...
Devemos explorar esses conhecimentos para educar à observação dos fenômenos celestes, caso contrário, vamos olhar apenas para o relógio ou o smartphone. Parece-me uma grande oportunidade a ser valorizada: há realmente necessidade de alguém que conheça bem os relógios de sol. E eu espero que os apaixonados colaborem principalmente com as escolas.
Até mesmo os movimentos dos relógios de sol têm muito a ensinar. O que você acha?
Sim, têm um profundo significado que está enraizado na nossa cultura. A este respeito, como União Astronômica Internacional, temos a tarefa de nomear os objetos celestes. Nós estabelecemos como critério dar nomes que têm relação com a cultura. Alguns cientistas propõem nomes de alguma forma banais.
Nós insistimos em não aceitá-los, porque queremos o céu reflita a nossa cultura. Recentemente, 86 estrelas bem conhecidas foram nomeadas: quisemos darnomes que vêm das tradições astronômicas chinesas, indianas e africanas, para dar o sentido da conexão entre o céu e a cultura de toda a humanidade.
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O homem está ainda no centro do universo? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU