Assim, a religião tornou-se "suave"

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08 Janeiro 2018

Cristianismo não é apenas uma religião do livro. É também uma religião do alimento e da abundância é sempre serviu para santificar as festas. Selando um acordo entre o espírito e os sentidos. Muitos dos mais famosos pratos italianos, de fato, surgem a partir dessa superalimentação festiva que transforma o Natal, a Páscoa e outras festas religiosas, em orgias sagradas, em pantagruélicas liturgias da gula. Não é por acaso que muitas vezes os doces e as iguarias típicas festivas levam os nomes de santos e nasceram em mosteiros.

O comentário é de Marino Niola, publicado por Repubblica, 04-01-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.

Esse é o caso de Santa Rosa a antepassada da ‘sfogliarella’, massa folhada napolitana, leva o nome do homônimo convento dominicano de Amalfi. Lá, as noviças seguiam uma receita particularmente elaborada, com creme pâtisserie e sete cerejas pretas colocadas por acima como "sete olhos chorando". Igualmente famosas são as frutas de marzipã, originalmente produzidas no mosteiro siciliano de Martorana, que antigamente continham santinhos. E ainda os ‘brigidini’ toscanos, as rosquinhas de anis em forma de auréola dourada, que desde o século XVI, eram assadas pelas freiras de Santa Brígida nas chapas para as hóstias. Um exemplo brilhante de gastronomia eucarística. Como o das Clarissas da Santíssima Trindade de São Miguel Arcanjo, no sul da península do Gargano, famosas por inventar as hóstias recheadas com amêndoas carameladas e mel. Um doce que alia à simplicidade franciscana ao requinte aristocrático de Santa Clara, de ascendência nobre. E, por último, mas não menos importante, a pasta de amêndoas ‘immacolatissima’ das beneditinas de São João Evangelista, no bairro barroco de Lecce que, do segredo da clausura, passam seus doces celestiais através da roda dos injetados.

Então, se gerações de freiras transformaram o ora et labora em religião do paladar, e fizeram isso de acordo com uma tradição religiosa em que a nutrição do corpo é um símbolo do alimento para a alma, da Última Ceia à multiplicação dos pães e dos peixes, do casamento em Canaã até a ceia em Emaús. Começando com o pão e o vinho, que são a própria substancia do Deus encarnado. Tanto que no Novo Testamento, Jesus é chamado de "o pão da vida" ou "o pão vivo que desceu do céu". Certamente não é um acaso que tenha nascido em Belém, que em hebraico significa justamente a cidade dos pães.

Portanto, a mesa é uma das principais linguagens da devoção. Porque comer como Deus manda faz a diferença entre crentes e indiferentes. Não consumir carne e gorduras animais nos dias de jejum, observar a abstinência, conforme prescrito pelo fundador dos Jesuítas, santo Inácio de Loyola, praticar a temperança como manda São Paulo, converter-se à frugalidade como recomenda são Francisco e agora também o Papa Bergoglio, constituem o decálogo alimentar de um bom cristão. Tanto por falta, como por excesso. Porque se a renúncia coloca à prova a fé, também é verdade que a abundância a alimenta. 

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