09 Agosto 2017
Uma verdadeira multidão, convocada pelos movimentos sociais, em coincidência com o dia de São Caetano, o patrono dos trabalhadores, percorreu boa parte da cidade de Buenos Aires, para encerrar na Praça de Maio. Sob um só lema "Pão, Paz, Terra, Teto e Trabalho”, a Confederação de Trabalhadores da Economia Popular (CTEP), o Movimento Barrios de Pie e a Corrente Classista e Combativa (CCC) exigiram do Governo nacional a aprovação de uma lei de emergência alimentar que lhes permita atenuar a crise provocada pela política econômica do presidente Mauricio Macri: “O problema não são os trabalhadores que ficam desempregados, mas também que este governo os conduz à marginalidade e daí é muito difícil sair”, sintetizou Esteban “El Gringo” Castro, da CTEP.
A reportagem é de Felipe Yapur, publicada por Página/12, 08-08-2017. A tradução é do Cepat.
O encerramento da mobilização ocorreu com a Pirâmide de Maio como cenário de fundo. O primeiro dos dirigentes a falar foi Daniel Menéndez, do Movimento Barrios de Pie, que afirmou que “estamos, aqui, para reivindicar algo que qualquer governo com um pouco de sensibilidade aceitaria, que é a emergência alimentar, que é fortalecer os refeitórios”. O dirigente afirmou que aumentou a presença de crianças nos diferentes refeitórios que organizam e, por isso, “a necessidade de uma lei de emergência alimentar” e acrescentou que isto é urgente e que “seja revista a política conduzida pelo Governo, que deve convocar para o diálogo de maneira imediata”.
Quando os discursos foram realizados já se conhecia a declaração da ministra da Seguridade, Patricia Bullrich, que havia dito que “converter [a festa de] São Caetano em uma mobilização é uma barbaridade”. Menéndez não se esqueceu e afirmou que “se nota que (a ministra) nunca sequer apertou a mão de alguém que não tem trabalho”.
Enquanto isso, Alderete, da CCC, afirmou que “o Governo quer deixar para depois das eleições (legislativas) para tratar da Lei de Emergência Alimentar, mas lhe dizemos que a fome e o desemprego não esperam as eleições. Não deixaremos a rua, enquanto não tivermos a Lei que reivindicamos”. Por outro lado, destacou que “precisamos fortalecer esta unidade para defender os direitos do povo contra um governo que vai fundo contra os direitos dos trabalhadores e não vacila em reprimir”. Junto à reivindicação da lei, Alderete também acrescentou o necessário aumento de “salários e aposentadorias de acordo com o custo da cesta familiar, defender o trabalho, parar as demissões e frear as importações”.
Castro foi o encarregado de encerrar o ato. Falou com Juan Grabois ao seu lado. O dirigente afirmou, diante da multidão, que “caminhamos conduzidos pela fé do povo e pela reivindicação dos direitos de nosso povo”. Destacou também que, durante a longa jornada, não só se rezou, como também, além disso, “viemos lutar pelos direitos sagrados de nosso povo que são paz, pão, terra, teto e trabalho”. O dirigente social questionou a “concentração da economia” no país, exemplificando-a com “os seis hipermercados que fixam os preços. Esses seis hipermercados são nossos inimigos e são eles que o Governo beneficia. Que baixem os preços!”, exigiu.
Castro afirmou que ainda continuam lutando pela aplicação total da Lei de emergência social, que foi aprovada no final do ano passado, e que o Poder Executivo ainda não aplicou em sua totalidade. Um dado que Castro ressaltou como preocupante, pois “agora necessitamos da declaração de emergência alimentar” e advertiu que “seguirão na rua” até conseguir fazer com que a reivindicação se torne realidade.
O representante da CTEP reconheceu que o Governo não rompeu o diálogo com as organizações sociais, mas advertiu que isso não significa que é frutífero. Por exemplo, disse que “outro dia, conversamos com a ministra de Desenvolvimento Social (Carolina Stanley), é muito gauchinha, podemos conversar sobre tudo o que quiser, mas lhe asseguramos: no dia 22 de agosto, arrebentamos a praça novamente, junto à CGT e a todos aqueles que quiseram se somar”, apontou, em referência à marcha que a central operária já anunciou.
Em seu discurso, Castro não se esqueceu e reivindicou o aparecimento com vida do jovem Santiago Maldonado, que segundo várias testemunhas foi sequestrado por efetivos da Guarda, em Chubut, quando reprimiram uma manifestação mapuche.
Já muito cedo, os militantes das organizações sociais que fizeram a convocação chegaram à Paróquia São Caetano, localizada no portenho bairro de Liniers. A partir daí, começaram a percorrer os 15 km que os separava da Praça de Maio.
Os manifestantes fizeram uma primeira parada na Praça Onze, onde dispuseram alguns lanches populares para alimentar os caminhantes. Nesse lugar, somou-se o membro do triunvirato, Juan Carlos Schmid, que veio acompanhado do advogado Julio Piumato e o aeronavegante Juan Pablo Brey. Estes acompanharam a grande marcha até a Praça de Maio, mas, conforme tinham combinado, se retiraram e não participaram do ato final. Segundo confiaram integrantes da organização, o próprio membro do triunvirato havia expressado seu desejo de não subir ao palco para não retirar o protagonismo dos movimentos sociais.
A marcha fez uma breve parada no Congresso da Nação. Ali deixaram um abaixo-assinado com assinaturas coletadas para reivindicar aos legisladores a elaboração e aprovação de uma lei que declare a emergência alimentar.
Mas, não foi a única marcha, já que outras organizações sociais, sindicais e políticas se juntaram à convocação, a partir de outros setores da Capital Federal e que foram se aglomerando na praça até enchê-la. Desse modo, longas filas de manifestantes começaram a chegar à praça, a partir da Avenida de Maio e Diagonal Norte. Algumas destas provinham da zona sul da cidade, da Ponte Pueyrredón. Em pouco tempo, na praça já não havia espaço para se deslocar.
O palco foi organizado como que em dois andares. Embaixo, quase ao nível do chão, ocuparam os locutores que afirmaram que havia mais de 300.000 pessoas participando. Ali também colocaram duas imagens. Uma delas era a de São Caetano e outra da Virgem de Luján, trazida por um grupo de manifestantes que partiram da Basílica, no sábado, e que após dois dias de caminhada chegaram, na manhã de ontem, na Igreja de São Caetano, para se somar à mobilização. Na parte mais alta do palco estiveram Castro e Grabois, da CTEP, Alderete, da CCC, e Menéndez, do Barrios de Pie.
Uma das colunas mais importantes foi a que proporcionou o Movimento Evita que conta com um projeto que seus deputados apoiam na Câmara baixa. Nesse marco, Leonardo Grosso afirmou que “milhares de pessoas perdem todos os dias o trabalho e a capacidade de compra, por isso, nós, trabalhadores da economia popular, saímos para frear o ajuste”. A iniciativa conta com o apoio do bloco Frente para a Vitória e dos parlamentares de esquerda. Agora resta ver se as bancadas conseguem coordenar para que entre as PASO (Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias) e as eleições de outubro possam levar o projeto ao recinto.
“Foi uma mobilização muito heterogênea, pacífica e firme que, a poucos dias das PASO, enviou uma clara mensagem ao governo sobre o difícil momento que vive o setor do trabalho informal, mas também os trabalhadores registrados”, sintetizou Luis Cáceres, do sindicato dos Ladrilheiros e ligação entre a CGT e a CTEP.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Argentina. "Pão, Paz, Teto e Trabalho". Para que o Governo veja o que não quer ver - Instituto Humanitas Unisinos - IHU