27 Junho 2017
A crise econômica e financeira da Grécia não dá sinais de se aplacar. A nova parcela de ajudas, de 8,5 bilhões, decidida em 15 de junho pelo Eurogrupo, é apenas uma lufada de oxigênio que permitirá que Atenas honre a dívida com o FMI e com o Banco Central Europeu de um total de 6,5 bilhões. Mas nenhum corte definitivo da dívida. O escuro profundo do túnel grego é testemunhado pelos números do primeiro Relatório da Cáritas Grécia sobre a pobreza e a exclusão social, relativo ao biênio 2014-2015.
A reportagem é de Daniele Rocchi, publicada pelo Servizio Informazione Religiosa, 26-06-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O relatório é fruto da análise dos dados e das experiências cotidianas, coletados em sete das 11 dioceses gregas, em coordenação com o Escritório de Estudos da Cáritas italiana, e relatados na bases de dados online do Ospoweb, portal de estatísticas produzido pela Cáritas italiana.
Para enfrentar a crise, a Grécia está tentando o caminho da austeridade. Os planos de resgate financeiro da economia grega emanados pela Troika (FMI, União Europeia, BCE), voltados a evitar o risco de insolvência soberana (default) do país, foram subordinados à aceitação de medidas de políticas de orçamento restritivas sobre as contas públicas (austerity), baseadas em fortes reduções nos gastos públicos, aumento de impostos e, acima de tudo, redução dos salários entre 10% e 40%.
O montante dos salários médios passou de 22.729 euros em 2009 para 18.411 euros em 2014. O número de desempregados passou de 402 mil no último trimestre de 2008 para 1,241 milhão no último trimestre de 2014, para depois cair progressivamente para 1,175 milhão no último trimestre de 2015. No fim de 2015, o percentual de desempregados atingiu 24,9% (em 2008, estava em 7,8%).
Uma consequência da redução da renda dos trabalhadores foi o empobrecimento das famílias: entre 2010 e 2014, o poder de compra do nível mínimo salarial previsto por lei diminuiu em 24,9% para os trabalhadores adultos e em 34,5% para os jovens até aos 25 anos. No fim de 2014, 21,2% dos trabalhadores corriam o risco da pobreza (working poors), enquanto em 2010 era de 18,0%.
O problema-necessidade mais frequente dos usuários da Cáritas na Grécia foi justamente o da pobreza econômica (80,2% do total), seguido pelos problemas de trabalho (60,9%). Desperta muita preocupação a forte incidência dos problemas de moradia (36,7%) e das necessidades ligadas ao estado de saúde, que dizem respeito quase a um em cada quatro usuários (23,8%).
No entanto, pobreza econômica e problemas de moradia tem maior incidência entre os estrangeiros. Os problemas de emprego, por outro lado, incidem mais sobre os gregos (69%). Também preocupa a dificuldade na assistência sanitária: 39,9% dos usuários gregos manifestaram dificuldades nesse âmbito (em comparação com os 20% dos usuários estrangeiros).
A lista dos pedidos feitos aos centros da Cáritas situa no primeiro lugar bens e serviços materiais, expressado pela maioria absoluta dos usuários (86%). Todos os outros tipos de pedidos se colocam em valores muito inferiores. Em segundo lugar, figura o pedido de subsídios econômicos (16,4%), não muito significativa por causa do fato de que, nos centros de assistência gregos, não é possível obter dinheiro vivo, mas apenas o pagamento de contas ou impostos.
Maria Koutatzi, responsável pelo setor de “políticas sociais” da Cáritas Grécia, não tem dúvidas: "É uma fase muito obscura da crise. Somos um país vulnerável, ao qual nenhum investidor quer apontar. A população continua sofrendo cada vez mais por causa da recessão. A classe média praticamente não existe mais, e muitos são aqueles que vivem abaixo da linha da pobreza. Os salários estão todos reduzidos ao mínimo, e muitas vezes não há proteções para os trabalhadores, muitos dos quais são clandestinos. Nas áreas rurais, vive-se um pouco melhor, porque a população cultiva os produtos, e a solidariedade é maior”.
Koutatzi identifica nos jovens a faixa da população que mais sente a crise e, com eles, os trabalhadores acima dos 50 anos, para os quais “o Estado não tem programas especiais. Os subsídios de desemprego estão previstos apenas por alguns meses. Depois, a pessoa perde o seguro de saúde completo, que permanece apenas para urgências e internações hospitalares”.
Não menos preocupante é a condição dos idosos, “que tentam sobreviver apesar dos cortes nas pensões, que atingiram até 50-60%. Muitos estão velhos demais para voltar a trabalhar”.
No entanto, acrescenta a responsável da Cáritas, “hoje também emerge que muitos núcleos familiares se sustentam com a presença de pensionistas em casa, e, com uma pensão, vivem três gerações”. A busca de um trabalho continua sendo a principal necessidade a ser satisfeita: “As pessoas querem trabalhar, não serem mantidas. O trabalho dá dignidade e autoestima. Não temos postos para oferecer, mas, como Cáritas, tentamos pôr em contato a demanda com a oferta”.
“Não precisa estudar economia para entender que, se você tem dinheiro, você gasta; se não tem, não gasta”, concluiu Koutatzi. “As pessoas não aguentam mais. Aquilo que estamos vendo nos confirma que a austeridade não resolve. Seria necessário, por exemplo, uma distribuição equitativa dos impostos, para que todos os paguem. Certamente, nós, gregos, também temos as nossas culpas, que estamos pagando. Espero que a Europa saiba aprender com a crise grega, defendendo novos estilos de vida, mais moderados, mais solidários, marcados pela acolhida aos pobres, aos deslocados e aos refugiados, todos a serem levados ao mesmo nível de bem-estar. Chega de guerras entre os pobres.”
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Grécia, um país cada vez mais vulnerável - Instituto Humanitas Unisinos - IHU