10 Novembro 2016
A surpreendente vitória de Donald Trump na corrida presidencial americana, creditada por analistas à sua figura de outsider e à desilusão de grande parte da população com a classe política tradicional, marcou uma guinada à direita no país e tem seus paralelos com eventos recentes no Brasil.
A reportagem é publicada por BBC Brasil, 10-11-2016.
A partir de 2015, em um intervalo de um ano e três meses, grupos comandados por brasileiros que nunca tiveram cargos públicos organizaram sete manifestações que levaram multidões às ruas e culminaram na queda do Partido dos Trabalhadores - que ocupava a presidência do país havia 13 anos.
Tanto cá como lá, os insatisfeitos defenderam a guinada à direita após perderem dinheiro e empregos e não se viam representados por políticas sociais de seus governos - como as cotas, no Brasil, ou o direito ao aborto, nos EUA.
Mas, o que diriam os movimentos "debutantes" do novo cenário politico brasileiro sobre a renovação política que se inicia nos EUA? Que recados os americanos dão ao mundo com a derrota de Hillary Clinton? A radicalização de parte do eleitorado pode se refletir aqui, numa candidatura do simpatizante de Trump, Jair Bolsonaro, em 2018?
Kim Kataguiri, do Movimento Brasil Livre, Rogerio Chequer, do Vem pra Rua, e Marcello Reis, do Revoltados Online responderam a essas perguntas, em entrevistas por telefone à BBC Brasil nesta quarta-feira.
Marcello Reis: "Estou superfeliz que Trump ganhou. Hillary ridicularizou os homens brancos protestantes americanos e Trump vai governar para eles, que provaram que são maioria. Ele se elegeu para defender os nossos valores, que não são comunistas."
Kim Kataguiri: "Com Hillary seria pior. Ele tem defeitos, mas em termos de política econômica, pelo menos, não propõe coisas como taxar grandes fortunas. Há duas indicações a serem feitas para a Suprema Corte dos EUA. Trump deve indicar juízes que respeitam o que está na lei. A tendência dos democratas é indicar juízes com interpretação mais flexível da Constituição e que não se atêm ao que está escrito."
Rogério Chequer: "Os conceitos de Trump sobre um Estado menor e menos impostos são positivos. Mas os valores extremistas impedem que a gente sequer analise suas outras propostas. Pela forma autoritária e egóica que age, não sei como será o diálogo dele com o Congresso, outros líderes, potências, organizações sociais e militares."
Rogério Chequer: "Da mesma forma que alguns brasileiros passaram a conhecer o Congresso que têm no impeachment, muitos passaram agora a conhecer os EUA para além das grandes capitais. Foi um voto de protesto. As democracias estão encurtando a sua paciência. Numa era onde a informação anda mais rápido, a população espera que os problemas sejam endereçados mais rapidamente."
Kim Kataguiri: "A maior qualidade do Trump é não ser a Hillary."
Marcello Reis: "A Hillary é comunista, vista como alguém extremamente ambicioso e corrupto. Trump é uma cara nova e o politicamente correto não desce mais, ninguém mais engole. As pessoas de bem querem respeito aos valores tradicionais e por isso ele ganhou."
Kim Kataguiri: "A tendência é que ele tenha uma postura mais sensata, como já mostrou no discurso de posse. E governar com um Congresso majoritariamente republicano deve ajudar a regular isso. Mesmo que ele propusesse (muro na fronteira com o México, deportações de ilegais e barreiras à muçulmanos), não passaria pelo Congresso. Principalmente pelos senadores."
Rogério Chequer: "Tenho certeza que o muro ele não vai construir. Mas não sei com que afinco ele vai perseguir uma expulsão ou limitação da presença de muçulmanos nos Estados Unidos. Com aquele temperamento, não dá para prever."
Marcello Reis: "Trump representa o novo, então devem vir novidades boas para o mundo inteiro, como o muro e a blindagem dos Estados Unidos contra terroristas. Isso mostra que ele realmente está lutando contra o mal, contra os comunistas, e por isso está sitiando o país."
Rogério Chequer: "A eleição de Trump indica que a população brasileira pode, como a americana, fechar os olhos para determinados valores e seguir uma linha parecida com a de Bolsonaro. Isso aumenta a possibilidade de um bom desempenho."
Kim Kataguiri: "Acho que o Bolsonaro não tem chances para ser presidente da República. Ele deve estar atirando para este lado para conseguir outro cargo, uma cadeira no Senado, por exemplo. Isso é possível."
Marcello Reis: "Com certeza isso vai se refletir nas eleições de 2018, porque a tentativa da esquerda de ridicularizar a direita com rótulo de 'discriminadora' não cola mais. Bolsonaro vai ganhar. Estamos tentando viabilizar um encontro dele com o Trump, mas assessoria de Trump diz que ele está sem agenda agora."
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Bolsonaro 2018? Líderes da direita pró-impeachment se dividem sobre Trump - Instituto Humanitas Unisinos - IHU