Por: Jonas | 23 Fevereiro 2016
“Se o Papa tivesse criticado abertamente Marcial Maciel e a pedofilia, se tivesse falado a respeito de Ayotzinapa, teria ferido interesses, já que a Congregação dos Legionários de Cristo é a mais rica que existe e quem maneja as finanças é o Vaticano. Estamos falando de milhares de milhões de euros, milhares de milhões de ninguém mais que o Regnum Christi. O que aconteceria se o papa Francisco pronunciasse o nome Ayotzinapa? O governo, obviamente, sentir-se-ia muito agravado, consideraria uma traição aos acordos assumidos. Não se pode esquecer que a chanceler Claudia Ruiz Massieu esteve no Vaticano e posso imaginar que rogou a toda a Cúria Romana: ‘Suas excelências, no México todos nós, governantes, somos católicos, verão, somos crentes, católicos, e ainda que tenhamos problemas, estamos fazendo um grande esforço. O México tem sido muito desprestigiado, nosso peso está em queda, o petróleo também, o dólar nas nuvens. Digo isto para que, por favor, compreendam-nos’”.
A reportagem-entrevista é de Elena Poniatowska, publicada por La Jornada, 19-02-2016. A tradução é do Cepat.
Ninguém mais solicitado que o padre Alejandro Solalinde. É chamado pelo celular por Adela Micha, Carmen Aristegui, pelas revistas Newsweek, Proceso, Zócalo, e ele responde firme e atento todas as solicitações.
Graças ao jovem Samuel Mendoza, estudante do Colégio de Ciências e Humanidades (CCH) (que levou de seu campus e da Universidade Ibero-Americana quatro toneladas de tênis e sapatos para o albergue Irmãos no Caminho, em Ixtepec, Oaxaca), pude entrevistar o padre Alejandro Solalinde, que nos encontrou em Santa María la Rivera. O tema, claro, o papa Francisco.
“Estamos em um momento histórico de muita mudança em escala mundial, em nível histórico, mas também institucional. Não quero ofender ninguém porque o Papa é uma figura sagrada que gosto muito, admiro e respeito, mas esta visita me permitiu ver um pontífice muito maior, que não tem a liberdade que gostaria. Não se deve esquecer que é um homem de quase 80 anos, sem um pulmão, em cujos ombros pesa a responsabilidade de quase um bilhão de seres humanos. Eu não gostaria de estar em seu lugar. Para mim, é um homem santo que vem a um país que vive uma crise muito severa, de muita corrupção, muita impunidade, muita dor, muita violência. O país do desaparecimento forçado e dos feminicídios, palavra que me dá trabalho pronunciar”.
“Vi um Papa que desceu as escadas do avião quase envergado. Quando ele se senta na missa, simplesmente se desapruma. Ao invés de receber uma acolhida de Estado, recebeu uma acolhida folclórica, muito de Televisa, com gente bonita, pessoas muito vaidosas porque tinham ingressos, próximas ao poder, altos funcionários e políticos reconhecidos. Desde que desceu do avião, foi rodeado pelo casal presidencial, que não o soltou. O primeiro ato de Angélica Rivera para apresentar o coro infantil que interpretou a canção que promove há tempo, colocou-a – toda vestida de branco, como o Papa – em primeiro plano e jamais desceu de seu pedestal”.
“No dia seguinte, Angélica Rivera atraiu novamente a atenção do Papa e a de toda a comitiva em uma visita ao Hospital Federico Gómez, quando milhares de mexicanos que não possuem nada esperavam para vê-lo. Novamente, padecemos a mesma calma do Papa, com todo o tempo do mundo, cumprimentando todas as pessoas que a esposa de Peña Nieto lhe apresentava, a quem não gosto de chamar de primeira-dama, porque no México não há segundas damas, todas são iguais, nenhuma é mais que outra”.
“Também me deu tristeza pensar que todas essas cartinhas que os achegados de Angélica Rivera entregavam ao Papa e ao alto clero não tinham nada a ver com os 43 desaparecidos, as vítimas da pedofilia, os mexicanos mais esquecidos. Eu pensava: o que as famílias dos desaparecidos e todos os que sofreram injustiças devem estar sentindo? O que sentirão todos os que pediram que o Papa os recebesse e que esperaram horas em pé, no frio da rua, para vê-lo passar em seu papamóvel? Que fique claro, não é culpa do Papa, mas daqueles que o estão administrando”.
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México. Francisco evitou o caso dos 43 estudantes desaparecidos para não trair acordos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU