Por: Jonas | 17 Fevereiro 2016
Francisco concluiu seu terceiro dia em terra mexicana. Sua homilia em Ecatepec e as mensagens de ontem, domingo, continuaram com a tônica de crítica social, conjugada com a visão pastoral do pontífice argentino. No entanto, continuam sendo arrastados vícios entre os organizadores locais. É inaceitável neste pontificado guardar lugares privilegiados aos poderosos, influentes e aproveitadores nos atos do Papa. Tanto no aeroporto e Palácio Nacional, como na Basílica, os imperantes estiveram mais próximos dele, em lugares preferenciais. Estes vícios colocam em contradição as mensagens de inclusão e de crítica aos privilégios que Francisco apresenta. Também é importante ressaltar o papel secundário do arcebispo Norberto Rivera, durante esta visita. Apesar de muitos atos acontecerem em sua jurisdição, o cardeal é apenas mais um entre a comitiva de Francisco e seu perfil é irrelevante. Que diferença quando vinha João Paulo II e a organização recaía nos Legionários de Cristo. Presumia seu protagonismo; por isso, agora, percebe-se uma nostalgia pelos tempos passados, aprecia-se a melancolia em suas sucintas mensagens nas quais, com entusiasmo, quase evoca o título de homenagem ao papa polonês, seu protetor ido.
A reportagem é de Bernardo Barranco V., publicada por La Jornada, 15-02-2016. A tradução é do Cepat.
Francisco conseguiu se conectar com a sociedade mexicana. Ditou lições de liderança social a partir de premissas simples: empatia, proximidade, abertura, visão crítica e sutil valentia. Não se trata somente de marketing político, nem de imagem, mas, ao contrário, da capacidade ética de vincular as expectativas, esperanças e aspirações de um povo quase emudecido.
Diante da classe política mexicana, congregada no Palácio Nacional, o Papa questionou a corrupção e a apropriação de bens por uns poucos. A elite política que se desentende do bem comum como categoria desvalorizada, que versa sobre a dignidade da pessoa. Diante dos bispos mexicanos, Francisco foi muito severo e crítico. Impugnou suas atitudes de príncipes e de ter se comprometido muito pouco frente aos males sociais que assolam o México, em especial o narcotráfico. Bergoglio convida a se comprometer profundamente com a justiça social e a não se deixar tentar pela sedução que os recursos dos narcotraficantes e políticos oferecem.
Francisco está falando claro e de maneira crítica, inclusive em suas mensagens mais pastorais. Ontem, no primeiro domingo da quaresma, fez referência à leitura das tentações de Jesus e as adaptou a nossa realidade como as tentações que buscam arruinar e nos degradar. A primeira é a riqueza, como ter o pão a base do suor do outro, assim, o Papa faz referência à exploração que provoca dor, amargura e sofrimento. A riqueza ilícita também se adquire via corrupção. O pão em uma sociedade corrupta é um pão sujo que se dá de comer aos próprios filhos. Em sua pregação, Francisco recorda que a quaresma é o tempo para ajustar os sentidos, abrir os olhos frente a tantas injustiças que atentam diretamente contra o projeto de Deus. Por isso, Bergoglio, com sutileza, convida à conversão. Reiterando o que expressou no livro sobre a misericórdia. Em entrevista editada por Andrea Tornielli, destacou: É o Deus que tem um nome: misericórdia. Seu nome é nossa riqueza, seu nome é nossa fama, seu nome é nosso poder.
Em Ecatepec, terra de contradições neourbanas como violência e feminicídios; município gigante, onde acontecem extravios selvagens como a corrupção e abusos policiais aos cidadãos. O município conurbado é, ao mesmo tempo, um espaço onde se desenvolveram grupos evangélicos neopentecostais e cultos como a Santa Morte. Ecatepec é a terra onde o questionado bispo Onésimo Cepeda construiu, em um ano, uma imponente catedral a base de ajudas de homens poderosos, amigos do bispo e do governo. É um espaço referencial na qual a pastoral urbana da Igreja católica está fracassando, apesar de ser um dos lugares emblemáticos da primeira evangelização. Aí, Francisco, em sua mensagem na explanada do Centro de Estudos deste município, após a oração do Angelus, convidou os mexicanos a “estar em primeira linha e participar de todas as iniciativas que ajudem a fazer desta terra mexicana bendita uma terra de oportunidade...”. Uma terra onde não haja necessidade de migrar para sonhar; onde não haja necessidade de ser explorado para trabalhar; onde não haja necessidade de fazer do desespero e da pobreza de muitos o oportunismo de uns poucos. Continua o papa Francisco: Uma terra que não tenha que chorar homens e mulheres, jovens e crianças que terminam destruídos nas mãos dos traficantes da morte. A mensagem foi lida diante de mais de 300.000 pessoas que compareceram à missa.
Francisco, por meio das imagens da televisão, pôde transmitir energia e ternura no encontro com as crianças do Hospital pediátrico Federico Gómez, em uma breve mensagem lhes disse: Eu aqui, e não só pela idade, sinto-me muito próximo. Por um lado, ao atravessar essa porta e ver seus olhos, seus sorrisos, algumas piscadas, seus rostos me geraram vontade de agradecer. Obrigado pelo carinho em me receber; obrigado por ver o carinho com qual são cuidados aqui e pelo carinho com qual são acompanhados. Obrigado pelo esforço de tantos que estão fazendo o melhor para que possam se recuperar rápido. O Papa esteve com as crianças e não com o sistema hospitalar do país onde reina a desordem, a escassez, os descuidos e a morte prematura e às vezes desnecessária de milhares de crianças que não são devidamente atendidas.
Estas são parte das ambivalências de uma visita que nas mensagens do Papa estão à altura de muitas expectativas, não todas e não de todos.
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Viagem ao México. Francisco está cumprindo as expectativas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU